Marianne Hayes era uma professora da rede pública de Nova York quando deu à luz suas filhas, com apenas 17 meses de diferença. Ela optou pela licença-maternidade padrão de seis semanas adotada nos Estados Unidos para se recuperar e fortalecer o vínculo com as meninas, que agora têm cinco e sete anos.
Conseguir este período de licença, no entanto, não foi fácil. Marianne não tinha acumulado tempo suficiente de contribuições para se sustentar nem por uma semana longe do trabalho. Ambas as licenças foram financiadas por meio de “empréstimos” com a escola. Na realidade, ela recebeu seu pagamento integral durante o afastamento, mas, quando voltou a exercer suas funções, esses vencimentos extras foram descontados pouco a pouco, em um processo que durou quatro anos.
O histórico de Marianne, infelizmente, não é raro, principalmente nos Estados Unidos – único país desenvolvido a não oferecer uma alternativa de licença-maternidade paga. Apesar de os estados da Califórnia, Nova Jersey e Rhode Island oferecerem suas próprias licenças remuneradas (que, em breve, serão adotadas também por Nova York e Washington, D.C.), a única lei do país para estes casos é a FMLA – “Family and Medical Leave Act” (“ato da licença familiar e médica”, em tradução livre). Se a mulher trabalhar em uma empresa que tem, no mínimo, 50 funcionários, a FMLA protege seu emprego por 12 semanas caso ela atenda a determinados requisitos – mas sem remuneração.
Isso deixa a decisão de pagar a licença-maternidade nas mãos dos empregadores – e, obviamente, a maioria das mulheres não trabalha em empresas como Facebook, Etsy ou Netflix, que viraram manchete por suas generosas políticas neste quesito. No Brasil, apesar de o benefício ser previsto em lei, o problema atinge milhares de mulheres que trabalham de maneira informal, ou seja, sem o suporte da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
O resultado é que muitas mães precisaram recorrer a outras medidas para ajudar a financiar seu período sem trabalhar. Em território norte-americano, a solução encontrada foi o crowdfunding.
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As campanhas de arrecadação de fundos, que já são utilizadas para tudo, de catástrofes médicas inesperadas a mensalidades de faculdade e até lua-de-mel, agora estão ajudando a cobrir os custos dos novos bebês e da perda de renda no período de afastamento do trabalho. Plataformas como Kickante, Indiegogo e Catarse exibem um número cada vez maior de fundos para licença-maternidade. No norte-americano GoFundMe, por exemplo, uma busca pelo tema gera mais de 3 mil resultados. No país, há até uma plataforma paga de crowdfunding feita especialmente para este fim, batizada de Take12.
O Plumfund, por exemplo, foi criado para que Amy Gerving recebesse seu terceiro filho via adoção: um bebê de seis meses que é irmão biológico de sua outra filha adotiva. Apesar de seu trabalho oferecer pagamento de curto prazo para mulheres que têm filhos, não garante nada aos pais adotivos. “Então não há absolutamente nenhum pagamento, assim como também nenhum seguro-saúde ou qualquer outro benefício enquanto eu estiver fora”, conta.
Amy gostaria de ampliar a semana de folga para a qual economizou, mas não tem condições de arcar com a quantidade de tempo em que gostaria de ficar em casa. “Meu objetivo é ficar com o bebê por, pelo menos, um mês. Preciso deste tempo para criar laços e para que ele nos conheça”, diz. Ou seja, ela precisa de um salário adicional e mais um extra para cobrir o seguro-saúde do tempo em que estará afastada do trabalho – cerca de US$ 3.500. Caso não consiga o suficiente, terá de voltar para suas funções antes do que gostaria.
Foi uma amiga de Amy que teve a ideia de recorrer ao crowdfunding e que criou uma página para ela. “Eu estava um pouco preocupada de que nossos amigos pensassem que estávamos pedindo ajuda, mas todo mundo nos deu muito suporte. Eu nunca teria considerado este levantamento de fundos para a minha licença-maternidade”, conta.
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Lisa L., uma professora de 44 anos de Fort Lauderdale, na Flórida, levantou mais de US$ 3.200 via GoFundMe, valor que foi destinado a sua hipoteca e às contas que precisaram ser pagas durante a licença-maternidade de 12 semanas que tirou no ano passado. “Eu recebi dinheiro de amigos de infância com que eu não falava há anos, de amigos de amigos e de pessoas que eu nem conhecia”, diz ela, lembrando de um estranho que a presenteou com US$ 300. “Eu sou muito grata a todos que doaram e a todos que me desejaram boa sorte e deixaram comentários gentis.”
O que saber antes de recorrer ao crowdfunding
Se você estiver pensando em recorrer ao crowdfunding para ajudar a recompensar a política de licença-maternidade insatisfatória do seu trabalho, estas são algumas coisas que você precisa saber:
-Você, provavelmente, não vai precisar pagar impostos sobre o dinheiro recebido. Presentes reais (como dinheiro que é dado puramente como uma doação, sem nenhum bem, serviço ou recompensa em troca) normalmente não estão sujeitos a impostos. De qualquer maneira, como esta é uma área nova – e as regras variam muito entre as regiões – a dica é consultar um especialista. Em São Paulo, por exemplo, existe isenção para doações em dinheiro até R$ 58.875 (em 2016);
-Mesmo que não precise pagar impostos, não espere receber cada centavo doado. A maioria das plataformas cobra uma taxa, normalmente entre 3% e 5% por cada transação, mas ela pode ser bem maior – como os 7,9% mais US$ 0,30 sobre cada doação no caso do GoFundMe. Em alguns lugares, podem até ser cobradas taxas dos doadores. Então, assegure-se de checar tudo isso antes de se comprometer com qualquer site, mesmo os que se dizem gratuitos;
-Seja realista sobre quanto dinheiro você pode levantar. Apesar de ser fácil encarar o crowdfunding como uma maneira de sair de uma situação financeira complicada, a verdade é que não há garantias de que você, de fato, vai conseguir o que precisa. Então, quando você estiver planejando, é melhor não contar com as doações como algo consumado, mas sim como um complemento que pode ajudar.