Filha de mãe indiana e pai americano, Priya Parker cresceu em um ambiente bicultural. Quando seus pais se separaram e casaram de novo, ela teve que mediar conflitos e se adaptar aos diferentes espaços em que transitava. Hoje, ela leva essa questão pessoal em tudo o que faz profissionalmente. Há 15 anos atua como consultora e facilitadora, ajudando empresas, líderes e comunidades a terem conversas difíceis e criarem conexões. “O futuro do trabalho está sendo negociado. E a habilidade mais importante hoje é saber criar significado e coordenar um grupo sem que todos tenham que estar no mesmo lugar ao mesmo tempo.”
Ela também é membro do comitê de novos modelos de liderança do Fórum Econômico Mundial, autora do livro “The Art of Gathering” (“A Arte da Reunião”) e apresentadora do podcast Together Apart, do New York Times. “As empresas me chamam para fazer seus líderes aprenderem a criar conexões e reunir melhor a equipe. E quando elas percebem que precisam de alguém de fora, que não tem um papel ou interesse lá dentro, para ter uma conversa complexa.”
Parker virá ao Brasil em novembro para o HSM+, evento de gestão e liderança da HSM, que acontece em São Paulo. Ela estudou design organizacional no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e publicou seu livro, cujo subtítulo é “como nos reunimos e por que isso importa”, em 2018, antes da pandemia e do boom das reuniões virtuais, que se mantiveram.
Em entrevista à Forbes, ela explica a importância das reuniões para as conexões no trabalho, como manter esses vínculos no ambiente virtual, o que fazer para mediar conflitos e qual o papel e as habilidades que os líderes devem ter no futuro do trabalho.
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Forbes: O que é importante para ser um bom gestor de conflitos? Como um líder pode desenvolver empatia, por exemplo?
Priya Parker: Antes mesmo de chegar à empatia, acho que uma maneira de começar a ser um melhor gestor de conflitos é primeiro saber como você se sente com o conflito. Você pode ser uma pessoa que busca o conflito, pode ser contra, pode estar em algum lugar no meio e muito disso tem a ver com a nossa própria família e cultura. E, portanto, a principal coisa que você pode começar a fazer em termos de se tornar um melhor gestor de conflitos é começar a se conscientizar do seu próprio conforto ou desconforto com o que acontece quando surge o conflito. E começar a trabalhar a sua relação com isso, sua prática e as habilidades para lidar com essas conversas porque o que quer que você esteja fazendo, especialmente se você tiver poder institucional, vai impactar a sua equipe.
F: Você escreveu um livro sobre encontros e, desde o início da pandemia, as reuniões têm sido principalmente em ambientes virtuais. Quais as desvantagens disso? Nós estamos perdendo algo?
PP: Um dos principais pontos sobre reuniões virtuais é que a gente não tem a arquitetura do espaço físico. Apesar de a gente não pensar muito sobre isso, esses espaços ajudam grupos e indivíduos a se conectarem. O trajeto e o trânsito até um lugar são momentos de transição. Em uma sala física, você se mexe, escolhe em que cadeira vai sentar, sai para pegar um café, leva uma xícara para um colega. Há muito mais escolha individual. E o espaço vem com um contexto que as reuniões virtuais não têm. É muito difícil esconder uma reunião ruim ou sem sentido no Zoom porque não tem distração. Então a maior mudança é que hoje o host da reunião precisa criar esse contexto.
F: É possível manter as conexões do presencial no ambiente virtual?
PP: Reuniões virtuais são muito mais transacionais que as presenciais. Nós perdemos muito da dinâmica das relações no online porque vamos direto ao assunto. Isso pode ser bom em termos de eficiência e produtividade, mas há uma perda imensa em relação a como as pessoas se sentem umas sobre as outras e ao pertencimento. Um dos meus principais conselhos é criar essas conexões informais no Zoom.
F: E como criar essas conexões no ambiente virtual?
PP: Você precisa projetar isso. Comece pelo chat. Em qualquer tipo de reunião virtual eu começo perguntando alguma coisa bem simples tipo ‘qual foi o primeiro show que você foi?’ e de repente tem 100 respostas no chat. Nós temos que criar a conexão que queremos e que acontecia de forma inconsciente nas reuniões presenciais. Novas habilidades de liderança incluem criar contexto e conexões no ambiente virtual.
F: As empresas vêm criando cargos, como head de experiências remotas, para trabalhar nesse ambiente. Como você enxerga o futuro do trabalho e como podemos nos preparar para ele?
PP: A nossa ideia de onde e como o trabalho acontece está sendo desafiada. E em relação aos encontros, o onde, por que, quando e com quem nos encontramos ainda está em aberto. ‘Fazemos isso pessoalmente ou virtualmente?’ ‘Quando deve ser a reunião?’ Quanto tempo precisa durar?’. Então o futuro do trabalho está sendo negociado. Todas essas questões estão sendo feitas agora. E a habilidade mais importante hoje é saber criar significado e coordenar um grupo sem que todos tenham que estar no mesmo lugar ao mesmo tempo. Essa é a habilidade do século 21. Realizar uma grande reunião virtualmente ou de forma híbrida será muito importante para os líderes da próxima geração.
F: Qual o novo modelo de liderança?
PP: Os líderes devem sempre questionar qual é a real necessidade hoje para não ficarem presos em modelos antigos. Qual é o propósito do nosso trabalho? As pessoas entendem esse propósito? Como elas se sentem sobre isso e sobre umas às outras? E ajudar as pessoas a usar o seu tempo para atingir seus objetivos, sempre respeitando as liberdades do indivíduo. Um dos elementos centrais da vida pós-pandemia é que as pessoas estão começando a ter mais poder de escolha sobre onde e como elas querem trabalhar. Os líderes precisam ajustar isso e aprimorar suas habilidades para gerenciar o time e realizar reuniões que reflitam essas escolhas individuais.
F: O que você aprendeu tendo contato com diferentes equipes pelo mundo que os líderes podem usar com seus times?
PP: Acho que a primeira coisa é perceber que as reuniões e conexões são algo que nós criamos. O que nós julgamos importante em mostrar para as pessoas, como começamos uma reunião, o que decidimos falar e quem está lá, isso é tudo pensado. A principal coisa que a pandemia nos fez ver é que a forma como nos reunimos é algo que realmente molda nosso dia a dia no trabalho, em casa, e na nossa vida social. Então acho que o maior conselho que eu tenho é perceber como isso afeta nossa vida e nosso trabalho e a maneira como vemos o mundo. Essa é uma habilidade que qualquer um pode melhorar e uma prática mais relevante do que nunca.
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