Perfeccionismo é um defeito fácil de assumir, mas difícil de desconstruir. Parece uma vantagem competitiva gostar de fazer as coisas perfeitas. Mas a verdade é que esse traço de personalidade esconde uma sombra que ninguém gosta de admitir que tem: a prepotência.
Confesso: meu ego sempre gostou de ter o selo de perfeccionista estampado na minha testa. Eu encarava como uma habilidade de quem consegue coisas incríveis. Sim, eu tinha a audácia de acreditar que a perfeição era uma meta possível.
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Todos os meus feitos, por mais bem feitos, sempre me traziam desconforto. Meu radar interno rapidamente apontava aquele pedacinho que tornava minha obra imperfeita, e eu, tola, nem fazia ideia de que era no detalhe desenquadrado do senso comum que morava o valor das minhas entregas.
Passei muitos anos exigindo de mim a tarefa sobre-humana da perfeição. Um ofício que, além de gerar rigidez e frustração, destruía meu senso de estima por mim e me roubava o livre exercício da liberdade de ser humana – e, portanto, imperfeita.
Custei a compreender que o perfeccionismo é uma versão maquiada da prepotência. É uma tentativa secreta de nunca falhar e de ser percebido como alguém acima da média. Uma estratégia eficiente para angariar aplausos, mas que nos torna reféns da platéia.
Enquanto não havia me atentado para o real significado da palavra autoestima, ainda acreditava que receber validação externa era o que me faria sentir valorosa. Aos poucos, fui observando que, na mesma medida que as palmas abastecem o ego, as críticas destroem o autoamor. Uma péssima troca.
Se a gente tiver coragem de admitir, não é tão difícil concluir que o perfeccionismo é uma busca velada pela superioridade que, no fundo, nasce daquele complexo de inferioridade guardado dentro de nós, a sete chaves.
A estratégia mais comum aos que por alguma razão se sentem inferiores é buscar a compensação se provando superiores. E o que é o perfeccionismo, senão uma tentativa de sobrepor os “meros mortais imperfeitos”?
E eu sei que faz sentido ler isso e pensar que ninguém precisa ser perfeito. Mas, na prática, sejamos honestos: continuamos buscando não errar. Continuamos nos culpando quando desequilibramos algum papel e deixamos algum dos nossos pratinhos quebrar.
O perfeccionismo só se cura com um entendimento profundo de que é, mesmo, inevitável falhar. E só conseguimos ser tolerantes com nossos erros quando já aprendemos a convidar o desconforto para tomar um chá – esse foi o tema minha última coluna, diga-se de passagem.
Porque a falta de tolerância para os nossos próprios erros nos faz também intolerantes às falhas alheias. E isso traz uma sensação de eterno descontentamento – consigo, e com o mundo.
Foi só quando desisti de ser perfeita que comecei a olhar com leveza a imperfeição alheia. Comecei a dar mais valor para uma verdade confusa do que para uma mentira organizada. Comecei a aplaudir aqueles que têm coragem para assumir a própria vulnerabilidade. E finalmente compreendi que, se a arte imita a vida, é justamente o detalhe imperfeito que faz a obra valer mais.
Gastamos muita energia tentando negar nossas cicatrizes e nos esquecemos que é através das arestas causadas por elas que a luz consegue entrar. Quantas histórias a gente se conta para tentarmos ser percebidos como mais prontos, evoluídos e perfeitos do que é possível ser. Para que? Aliás, para quem?
Essa mania de querer impressionar as pessoas nos faz viver atendendo às expectativas delas. E, para isso, inúmeras vezes, deixamos de nos atender. Trocamos autenticidade por aprovação. Será que vale?
A desconstrução do perfeccionismo, como qualquer transformação, é um processo. É um convite para buscar o equilíbrio entre a vontade de ser a cada dia melhor e a cobrança de nunca falhar. Porque o que nos traz valor, enquanto pessoas, não é a perfeição, é o movimento constante e honesto de autorrevisão.
*Carol Rache é empresária, fundadora do grupo Namah Wellness de inteligência emocional e o bem-estar. Há 10 anos ela se dedica ao estudo do comportamento humano usando neurociência, metafísica, meditação, yoga e coaching.
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