A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) está movendo um processo contra Sérgio Rial, então CEO das lojas Americanas quando veio a público o rombo nas contas da empresa, em janeiro deste ano. A acusação é de ter tornado a notícia do rombo contábil de R$ 20 bilhões (que, depois, se tornou da ordem de R$ 40 bilhões) inacessível a todo o mercado, porque parte da coletiva on-line no dia seguinte à nota ao mercado – publicada em 11 de janeiro –, teria sido parcialmente exclusiva aos investidores do BTG.
Segundo a acusação, Rial teria violado o dever de lealdade do administrador à empresa previsto no artigo 155 da Lei das Sociedades Anônimas. Nesses casos, se não tiverem intencionalmente gerado prejuízo para a empresa, é normal que altos executivos tenham um seguro especial, contratado pela própria companhia, para proteger seu patrimônio. “Diante de uma responsabilidade gigantesca, ninguém iria querer ocupar uma cadeira de gestão de uma empresa sem esse seguro”, diz Marcelo Zenkner, sócio de compliance do Tozzini Freire Advogados.
O seguro D&O (Director and Officers’ liability insurance), também conhecido no Brasil como seguro de responsabilidade civil de administradores, diretores e conselheiros, tem o objetivo de proteger o patrimônio de executivos, como CEOs, diretores e conselheiros como pessoas físicas dos riscos de responsabilidade existentes na atividade empresarial.
Por isso, esse seguro pode ser acionado pela empresa que o contratou ou pelo executivo que é processado para cobrir prejuízos causados pela gestão, desde que isso não seja intencional – mais precisamente, que não tenha ocorrido fraude ou que o executivo segurado não esteja envolvido nela.
O acionamento do seguro pode ocorrer nos casos em que, por exemplo, um órgão regulador ou a própria empresa processe um de seus altos executivos por uma decisão tomada durante sua gestão.
Em 2022, o seguro de responsabilidade civil pagou cerca de R$ 558 milhões, um crescimento de 200% sobre 2021. Já a contratação de apólices de D&O arrecadou R$ 1,2 bilhão de acordo com a FenSeg (Federação Nacional de Seguros Gerais).
O que o seguro D&O geralmente cobre
Na maioria dos casos em que é contratado, o seguro D&O cobre os custos da defesa dos processos e o pagamento de acordos, desde que aprovados pela seguradora. Há também a cobertura de indenizações caso o segurado seja condenado, desde que não fique provada nenhuma fraude.
Se for comprovado que o executivo agiu de má-fé, será dele a responsabilidade de pagar os gastos da seguradora.
Thomaz Kastrup, sócio de seguros do Machado Meyer Advogados, explica que os valores dessa garantia variam de acordo com o porte da companhia e a indústria na qual ela atua. “Apólices contratadas por tomadores de indústrias reguladas – como o setor financeiro, mercado de capitais e energia elétrica, por exemplo – tendem a ter um limite máximo de garantia maior do que apólices contratadas por empresas não reguladas porque os administradores das primeiras estão expostos a custosas multas aplicadas pelos órgãos reguladores dos setores em que atuam”, afirma Kastrup.
Na proteção de responsabilidade em processos e indenizações contra investidores e acionistas da empresa, especialmente naquelas de capital aberto e do setor financeiro, o seguro D&O também pode agir caso essa cobertura esteja incluída no acordo da empresa com a seguradora. “Essas são coberturas adicionais que levam a um aumento do valor da indenização da apólice”, completa Kastrup.
Uma mera denúncia de fraude interna na companhia, por exemplo, não é suficiente para levar a divulgação ao mercado antes de uma apuração do fato. Ainda nesse cenário, decisões de estratégia de negócio, como a divulgação de fraude, devem passar por órgãos colegiados da empresa antes de serem tomadas. “É necessário ter evidências robustas confirmando a ocorrência de fraude para que seja avaliado o dever da comunicação ao mercado, no caso de empresas de capital aberto”, diz Juliana Sá de Miranda, sócia de compliance e penal empresarial do Machado Meyer Advogados.