Há quem diga que o momento em que Patrick Demarchelier mais se mostrava francês era quando falava em inglês. Nunca foi um problema – falecido na quinta-feira (31), aos 78 anos, foi ainda jovem que o fotógrafo tomou a acertada decisão de se comunicar através das imagens, seguindo por uma carreira de mais de 40 anos que o definiu como verdadeiro patrimônio da fotografia de moda internacional.
Mesmo assim, era uma pessoa com a qual todos desejavam falar. Todos, mesmo. “Nos anos 70, quando eu era uma editora júnior em Londres, eu só queria ser cool o suficiente para falar com Patrick Demarchelier” escreveu certa vez Anna Wintour, ex-editora chefe da Vogue americana e atual diretora de conteúdo global da Condé Nast.
Para além do sotaque carregado, dos cabelos grisalhos e das sobrancelhas fartas, a memória visual que Demarchelier deixa está na habilidade para a criação de imagens dotadas de elegância e despretensão próprias – o que pode até parecer abstrato hoje, em tempos de fotos carregadas de artifícios, filtradas, ultraproduzidas.
Foi com uma modelo brasileira que criou um dos laços mais bem amarrados da indústria fashion: a top model Carol Trentini, com quem trabalhou por quase duas décadas. “Ouvi falar de Patrick pela primeira vez logo que cheguei em Nova York – ele já um gênio – e nos conhecemos pessoalmente quando fui convidada para posar para a campanha da Perry Ellis, em 2004. Eu tinha 15 anos, praticamente uma criança, e não falava nada em inglês. Desse dia em diante, nunca mais paramos de trabalhar juntos”, conta a gaúcha, em depoimento exclusivo para a Forbes. “Frequentei muito seu estúdio próximo à Quinta Avenida, onde fazíamos fotos e também onde ele as revelava – lembrando que quando começamos a trabalhar juntos, ainda se usava filme”.
A leveza de suas imagens, ao que tudo indica, vinha de seu espírito. “No set, Patrick era cuidadoso, educado, divertido. Não tive uma única experiência de trabalho tensa com ele”, define Carol, que conviveu com o fotógrafo também no modo off-duty durante os anos em que manteve um relacionamento com um de seus três filhos, Victor Demarchelier. “Apesar de ser um grande ícone da moda, Patrick era um homem acessível. O que mais gostava de fazer era sair para comer em ótimos restaurantes”, lembra. “Tive o privilégio de viver com ele. E isso eu vou guardar para sempre no meu coração”, completa.
A partir da complexidade técnica e criativa onde reside a aparente simplicidade, Patrick foi além das capas e editoriais, se tornando o go-to photographer também para celebridades. Como retratista oficial de Lady Di, ajudou a eternizar em imagens a informalidade de personalidade da Princesa de Gales (como na imagem em que ela surge sentada no chão, sorrindo, com um vestido branco sem alças e uma tiara de diamantes, biên sur).
Em 2016, durante uma de suas poucas entrevistas, Demarchelier afirmou: “gosto de fotografar o lado positivo da vida”. Sua ausência será sentida, pois parece que é exatamente isso que estamos todos precisando agora. Na moda e na vida.
Com Antonia Petta
Donata Meirelles é consultora de estilo e atua há 30 anos no mundo da moda e do lifestyle.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.