Não é de hoje que eu acreditava na viabilidade da candidatura de João Doria à prefeitura de São Paulo. Na verdade, fui um dos primeiros. Alguns amigos dizem que um encontro na minha casa foi o marco zero. Porém, prever uma vitória tão acachapante era impossível, ainda que a ideologia do PT estivesse fazendo água em todo o país.
A vitória veio no primeiro turno. Muito bem. Mas é agora que o jogo começa. A forma de convencimento dos eleitores foi muito bem-sucedida. No jogo do poder, no entanto, a estratégia ganha muitos outros players. Entram em campo o Legislativo, os sindicatos, as organizações não governamentais e demais formadores de opinião.
Costumo dizer que o mundo corporativo nos deixa mal acostumados. Por mais que as empresas tenham normas de governança e conselhos de administração, muitas vezes é a vontade do líder que prevalece. Na política, é necessário empreender muita energia de convencimento. O meu período na política me ensinou muito isso. Não bastavam minhas convicções, era necessário fazer o outro entender. Muitas vezes, o interlocutor era um adversário político. E isso não poderia ser um impedimento para um diálogo.
A vitória de Doria veio no primeiro turno. Mas é agora que o jogo começa. O convencimento dos eleitores foi bem-sucedido. No jogo do poder, no entanto, a estratégia ganha outros players. Entram em campo o Legislativo, os sindicatos, as ONGs e demais formadores de opiniãoJoão Doria irá pisar em campo minado. Porém, sua base política é muito mais homogênea que a da ex-presidente Dilma Rousseff. O governo anterior conseguia abrigar desde um Miguel Rossetto a um Guilherme Afif Domingos. O primeiro era um sindicalista de extrema esquerda. O outro, um dos maiores nomes do liberalismo brasileiro e representante da pequena e média empresa. Não tinha como dar certo.
A eleição de Doria deve simbolizar para a cidade um novo modo de gestão, com muito rigor no trato do dinheiro público. Para se ter uma ideia, a Transparência Brasil nos apresenta o nível de absurdo de alguns salários da Câmara Municipal. Havia engraxate que ganhava R$ 10 mil de salário, lavador de carro que tirava por mês R$ 11 mil. Detalhe: não se lavam mais carros por lá. Achou que eles ganham muito? Então veja os salários de dois procuradores legislativos: R$ 62 mil cada um. São supersalários que pesam no bolso do contribuinte e fazem falta nos postos de saúde e nas creches.
Esse é o ponto de inflexão dos nossos tempos. Aqueles que estão na carruagem estatal – e se servindo dela – não querem desembarcar. Porém, quem puxa essa mesma carruagem – o contribuinte – resolveu se perguntar: “Mas não sou eu quem paga por tudo isso?”
Este é o momento de sairmos do Estado dos privilégios para o Estado prestador de serviços – e ótimos serviços. É o velho conflito do propósito contra o interesse. O Seu João e a Dona Maria precisam do posto de saúde funcionando, com remédios, exames marcados rapidamente e médicos de plantão. Os filhos e netos deles necessitam de vaga em creche. E não é só a vaga. É fundamental dar condições para as crianças brincarem e aprenderem, como em qualquer instituição particular.
Por isso, Doria terá de ser um general da mais importante das guerras, especialmente no início da gestão. A guerra da comunicação. É preciso sair da cilada de falar apenas de ciclovias, radares e problemas nas viradas culturais. É necessário elevar a discussão a partir de uma palavra-chave: eficiência.
Os moradores desta cidade, que muitos partidos e sindicatos juram defender, têm de conviver com ruas engolidas por buracos, mal iluminadas e com muitas dificuldades de transporte. Longe do Centro, as pessoas encaram ônibus lotados e que demoram muito para chegar aos terminais e estações de metrô. São esses cidadãos que sustentam a cidade. E eles são o propósito real de Doria na prefeitura. Se ele conseguir melhorar vidas, já terá cumprido uma grande missão.
*Flávio Rocha é presidente da Riachuelo