A máxima vale para dentro e fora do campo. No mundo-cão do negócio do futebol não há inocentes. A mais recente prova é a disputa pelos direitos de transmissão de dois amistosos da Seleção Brasileira de Futebol na Austrália em junho.
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De um lado, a Confederação Brasileira de Futebol; do outro a Rede Globo. Difícil saber quem tem a razão.
A CBF detém os direitos da Seleção Brasileira e, como qualquer organização com fins lucrativos, precisa maximizar as receitas através da venda de direitos de transmissão de TV e patrocínios. Além disso, dado o histórico de escândalos no mundo do futebol, sem contar na condenação de seus últimos presidentes, precisa trabalhar com a maior transparência possível.
Aparentemente foi isso que a CBF fez neste caso.
Por se tratar de eventos que ainda não haviam sido comercializados, a CBF foi ao mercado buscando um comprador. Não se entendeu com a Rede Globo e acabou partindo para uma solução solo: comprou o horário na TV Brasil, contratou Pelé como comentarista e montou uma estrutura capaz de cuidar da transmissão dos jogos em Melbourne, na Austrália.
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Não é novidade ligas e clubes tentarem controlar os direitos de transmissão de seus eventos. Sem os intermediários (as redes de televisão), ganham uma fatia muito maior do investimento publicitário.
Algumas vezes o fazem sozinhas; outras em parcerias com canais tradicionais de TV. Dois casos interessantes são os da NFL, a liga de futebol americano, com a “NFL Network” e o Comitê Olímpico Internacional, com o “Olympic Channel”.
O caminho escolhido pela CBF é o mesmo da NFL e do COI: uma combinação de TV aberta e distribuição online.
Os direitos de TV, geralmente negociados com grande antecedência, por longos períodos e a altíssimos preços são a principal fonte de receita de qualquer liga esportiva no mundo. Representam mais que a metade de tudo que fatura a FIFA e o COI. O mesmo se repete em todas as grandes ligas de futebol da Europa. Se nada mudasse, a tendência seria da dependência ficar cada vez maior.
Mas as mudanças são inevitáveis. O que acontece com a CBF é apenas o começo.
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Pagando caro e bloqueando direitos por longos períodos, as redes de TV conseguiram até agora se proteger contra ataques do Facebook, Google, Youtube e Twitter. Mas assim que eles começarem a participar dos leilões dos direitos de transmissão a festa das TVs vai acabar. Com recursos quase ilimitados, fatalmente sairão vencedores. Nosso futuro é mesmo assistir os jogos na nossa página do Facebook ou no Youtube.
Para o bem do futebol e das receitas da CBF, o caminho escolhido está certo.
E a Rede Globo, como fica nessa história?
O problema é que sem a Globo, o futebol perde muito em qualidade. Sua transmissão e a cobertura jornalística dos jogos são uma referência internacional. Graças ao espaço que dá aos campeonatos nacionais e estaduais através de todas as suas filiais, temos acesso ao melhor e o pior do esporte. O futebol gera muitas receitas para a Globo mas a sua contribuição é incontestável.
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Quando a CBF precisou da Rede Globo, lá estava ela transmitindo jogos horríveis das nossas Seleções lideradas por Lazaronis, Vanderleis e Dungas. Agora que tudo parece bem e a tecnologia oferece alternativas para substituí-la, todo o esforço feito parece não ter mais valor.
A visão da CBF, apesar de fazer sentido no curto prazo, peca em ignorar a qualidade que a Rede Globo confere ao produto futebol. Sem a Globo, o futebol do Brasil não é um produto tão atrativo e certamente perderá em interesse de patrocinadores. Se tem dúvidas, vejas os dados de audiência da Olimpíada de Londres em 2012 transmitidos pela Rede Record.
CBF e Rede Globo não são bobos. Um quer extrair o maior valor possível destes amistosos. O outro garante a qualidade do produto futebol mas quer pagar menos do que valem os direitos. Nesse braço-de-ferro, quem deve perder somos nós os torcedores que seremos forçados a acompanhar transmissões de baixa qualidade para garantir o caixa da CBF.
A novela ainda não acabou mas uma coisa é certa, não tem mais bobo no futebol.
Ricardo Fort (@SportByFort) é executivo de marketing internacional baseado em Atlanta, Geórgia
Ricardo Fort é um colaborador de FORBES Brasil. Sua opinião é pessoal e não reflete a visão editorial de FORBES Brasil.