O imperador romano Júlio César escreveu, em sua autobiografia, que “quando os deuses imortais querem castigar um homem culpável, concedem-lhe a maior prosperidade, a maior impunidade, para que logo depois sofra mais quando a sorte muda de direção”.
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Os gregos, ainda mais remotos na história, diziam o mesmo com palavras diferentes, em um conhecido provérbio segundo o qual os deuses, quando querem destruir um homem, primeiro o enlouquecem, embriagando-o com a soberba.
Soberba é a mentira. É a visão equivocada de si mesmo, podendo ser essa visão de si mesmo além ou aquém da realidade. A humildade é a verdade. Como se vê, a lição é antiga. Mas não importa o quanto pensemos que estamos avançados como sociedade, a história sempre encontra uma maneira de se repetir.
Joesley Batista havia feito seu melhor negócio na vida, mesmo comparado à avassaladora – e polêmica – trajetória como empresário. Usando a delação premiada de trampolim, derrubaria um presidente, salvaria a empresa e ainda escaparia de qualquer pena severa mesmo diante de tantos e tantos crimes. Tudo com a chancela do Ministério Público Federal e as bênçãos do Supremo ante a perplexidade da nação. Ali, a embriaguez pela soberba já estava em seu ápice.
Era o triunfo da esperteza e da malandragem em favor da autopreservação. Infelizmente para Joesley, se a sagacidade nem sempre se pune, o mesmo não se pode dizer da soberba. A história da humanidade, na paz ou na guerra, jamais premiou essa forma de excesso, esse pensar-se inabalável. Era hora do início da punição pelos “deuses”.
Logo nos primeiros dias após a divulgação da delação de Joesley, soube-se que os irmãos usaram a informação privilegiada (do que o país ainda estava por conhecer por sua própria boca) para realizar uma operação de câmbio bilionária. Já era um sinal de que haviam passado dos limites.
Mas nada se comparou ao dia em que o Brasil ouviu a secular versão, sem filtro ou censura, de Joesley por ele mesmo. Todos pudemos conhecer a mente de um homem que se viu acima da lei e bem distante das regras dos homens. Soberba.
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Depois de se atribuir e cumprir a missão execrável de provocar a autoincriminação de outros por gravações, selou seu destino gravando a si mesmo.
As discussões de Joesley e Saud, nos áudios tornados públicos mais recentemente, mostram que a condescendência do Ministério Público, somada à soberba do delator, fez nascer neste a crença de que o futuro dos Três Poderes estava em suas mãos: para Joesley, os pilares da democracia eram suas peças de dominó.
O interessante é que a vida imitou a arte: em todo grande enredo hollywoodiano, a graça, para o bom vilão, é poder contar seu plano infalível a alguém. Uma espécie de maldade a serviço da vaidade.
Ao cair, Joesley levou consigo ao chão a credibilidade do próprio instituto da delação premiada, sobretudo quando utilizado à la Sergio Machado, numa verdadeira pescaria de frases soltas que possam funcionar bem na história que cada delator escolheu contar. Joesley não “colocou a tampa no caixão”, conforme planejara, e sim pulou para dentro dele.
Não pulou sozinho. Tem sido tão drástica a transição do Brasil de acordos impublicáveis ao Brasil da transparência e da publicidade, que os mais altos órgãos da República parecem não ter se dado conta de que também os seus atos agora se sujeitam ao mais rigoroso escrutínio. Não poderia jamais o Ministério Público Federal ter-se deixado usar por um delator, com um desfecho que enfraquece a imagem da Operação Lava Jato e sua relevância como marco da transição entre os Brasis.
A saga investigativa tupiniquim ainda trará à tona, entre denúncias, delações e prisões, mais episódios inéditos do que os vícios e virtudes humanos são capazes de produzir sob pressão. A soberba, pelo menos, todos já viram onde termina.
*Nelson Wilians é CEO do Nelson Wilians & Advogados Associados
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