Uma recente manchete do jornal espanhol ABC é fulminante: “A prisão de Lula enterra o milagre brasileiro”. E olha que a palavra milagre já está entre aspas. Não se trata da constatação de que acabou a impunidade, ou seja, o milagre de impedir que os maiores tubarões da corrupção, os lulas da silva, sejam sentenciados e passem a residir no sistema penitenciário, mas da condenação do protagonismo global do Brasil, encenada por tanto tempo com galhardia por Mr. Da Silva.
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O Brasil pós-projeto lulopetista (incluindo Dilma Dobrameta Rousseff) está submergido na sua crise interna, quase alheio ao mundo. A era Lula coincidiu com a marquetagem da sopa de letrinhas dos emergentes estilo Brics. O marqueteiro Lula, claro, mergulhou na sopa. E houve fascínio no mundo com o fenômeno. Eu me lembro do primeiro protagonismo de Lula na assembleia geral das Nações Unidas. Havia um interesse antropológico com o presidente-operário que iria debelar a fome (e, sem dúvida, ele e o PT foram com sede ao pote dourado).
Aí, tivemos a gula do ranking. O infeliz ministro da Fazenda, Guido Mantega, esbaldava-se em narrar o placar. Em 2009, ele disse que na década seguinte o Brasil poderia se converter na quinta economia global; Eike Batista foi alçado à sétima posição na lista dos bilionários da FORBES e tivemos a inesquecível e infame capa da Economist com a decolagem do Cristo Redentor como foguete. Que viagem!
Nada de se envergonhar com o Brasil submergido. Ele precisa encontrar o seu devido lugar, e a primeira providência é arrumar a casa
De volta à Terra. O tijolo dos Brics está esfarelado. Já foi rídículo reinventá-lo no plural, colocando a África do Sul ao lado de Brasil, Rússia, Índia e China. Maior azar que marqueteiros de bancos globais não tenham um promissor país com letra O (Omã?) ou H (Haiti? Honduras?) para encomendar uma nova sopa de letrinhas dos emergentes. Aí teríamos Rico ou Rich… mais atraente ainda do que Bric.
O Brasil fez sua parte para emergir na era Lula, não foi apenas a sacada do banqueiro Jim O’Neill, do Goldman Sachs. Na verdade, a aspiração lulista na primeira década do século 21 foi a terceira empreitada brasileira para atingir a meta: entrar no clube das grandes potências mundiais.
Um lance aconteceu no pós-guerra com o realinhamento da ordem mundial no âmbito das Nações Unidas (mais tarde Lula saiu por aí para amealhar voto para uma cadeira permanente brasileira no Conselho de Segurança) e na década de 80 foi a vez de os militares batalharem por um Brasil grande, com bomba e tudo.
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China e Índia seguem emergindo, mas por rotas próprias, e nunca se sabe se um dia irão colidir por razões não apenas econômicas, mas geopolíticas (e são emergentes nucleares). A Rússia é aquela coisa estranha governada pelo ex-agente da KGB, um czar do protagonismo global, em uma encenação incongruente com a realidade de um país com a economia equivalente à do Canadá, mas com a fraqueza econômica compensada pelos tentáculos geopolíticos e o arsenal nuclear.
Nada de se envergonhar com o Brasil submergido. Ele precisa encontrar o seu devido lugar, e a primeira providência é arrumar a casa. Obviamente, o nosso B não é minúsculo, apenas muito torto. Ok, vamos brincar um pouco de ranking: o Brasil é o terceiro exportador de alimentos, a quarta democracia, o quinto país mais extenso e a sexta nação manufatureira.
Peca, é fato, por ser uma economia fechada – e por ter perdido o bonde (ou o foguete). Em termos econômicos, a China já está rumo ao status de superpotência (que Bric, que nada) e a Índia alcançou o patamar da Grã-Bretanha e da França, com uma economia da ordem de US$ 2,5 trilhões.
E o Brasil? Está na casa dos US$ 2 tri, no nível da decadente Itália. No entanto, vamos celebrar. Os italianos nem estarão na Copa do Putin – nesse campo, o protagonismo do Brasil ainda merece ser global.
Coluna publicada na edição 59, lançada em junho de 2018