Minha expectativa como iniciante no SXSW era sair letrada em inteligência artificial, realidade aumentada, realidade virtual, bots, robôs, codes. Era entender um pouco mais sobre como toda essa tecnologia vai impactar o meu trabalho. Para minha surpresa, o que mais me chamou atenção no festival foi o enfoque no fator humano.
Obviamente, a tecnologia está regendo o mundo, transformando e impactando rapidamente diversas áreas, como mostrou Lining Yao, Ph.D em Ciência da Computação pelo MIT Media Lab, com seu revolucionário estudo “Morphing Matter”. Sua pesquisa utiliza temperaturas extremas, pH e pressão do ar para alterar o estado de uma matéria. E o que isso tem a ver com comunicação? Tudo. Há 1 ano, Yao desenvolve uma parceria com a marca Barilla que promete ir muito além de um design de produto. O resultado do trabalho terá um grande impacto em toda cadeia, desde embalagem até o transporte.
Enfim, depois de 45 minutos de “ciência pura”, Lining terminou a apresentação com uma foto dos 15 cientistas da MIT que estão trabalhando incansavelmente para tornar realidade algo que só era possível em “Os Jetsons”. Foi lindo vê-la dividindo a luz do palco com seu time.
E o que esperar do grande mestre do xadrez Garry Kasparov? Muita frieza, certo? Não foi o que eu vi em Austin. O ex-campeão mundial cravou: “Quando homem e máquina trabalham juntos, o mais importante não é a capacidade de um ou outro, mas a interação entre os dois. O poder da colaboração”.
Do xadrez para música. Mesmo em campos tão distintos, Ad-Rock, um do legendários músicos do Beastie Boys, compartilhou da opinião de Kasparov. Para ele, não se trata de uma banda sobre três pessoas e um som inovador para sua época. “É sobre a cidade de Nova York, amigos, músicas e filmes a que assistimos [… ] é sobre colaboração”. Michael D. encerrou dizendo: “O sucesso foi uma consequência, nós só queríamos nos divertir e falar o que sentíamos, e é assim até hoje”. “Be true to yourself and you’ll never fall”, trecho da música “Pass the Mic”.
Fora do Centro de Convenções, mais uma prova da importância do tal fator humano. Pelas ruas de Austin, um pôster do festival de música anunciava: “It’s not a competition. It’s a collaboration”. Um pouco antes, Priscilla Chan, médica, educadora e esposa de Mark Zuckerberg, falava em sua palestra: “A tecnologia só poderá resolver grandes problemas se conseguirmos reunir as pessoas. É preciso de colaboração radical”.
Na realidade virtual, me deparei com uma experiência na qual você se relacionava com sobreviventes da Segunda Guerra Mundial. “Em uma era de bots, nós acreditamos em humanos”, constatou o autor do livro “The Happiness Equation”, Neil Pasricha.
Era mais real do que virtual.
Seguimos nesse tema que me faz sorrir. A psicoterapeuta Esther Perel concluiu no seu painel: “Os relacionamentos são fundamentais para o sucesso de pessoas e empresas”. Compartilhar de um mesmo propósito impacta positivamente na vida das pessoas e no sucesso do negócio. Parece óbvio, mas sabemos que isso não é realidade nos ambientes de trabalho, onde as estratégias de curto prazo focadas apenas no resultado financeiro (e na competição) ainda dominam o ambiente corporativo.
Bruce Mau, designer e educador, foi um capítulo à parte. “Designing for the Five Senses” me transformou como pessoa, além de me dar mais razões para continuar sendo uma profissional inconformada. Ele disse: “O tempo é muito mais valioso que o dinheiro. É muito mais precioso. Planejar o nosso tempo é a coisa mais importante a se fazer. Nós vivenciamos o tempo através dos sentidos”. Daí, ele discorreu poeticamente sobre a importância de prestarmos atenção aos sentidos para termos uma vida plena.
Enfim, essa catarse me deu a convicção do porquê as interfaces de voz, gestos e reconhecimento facial ganharão força nos próximos anos. A inquietação é sobre como somar a isso o olfato e o tato como parte da estratégia de comunicação das marcas.
Ready Player One “feelings”.
A experiência que tive em Austin me trouxe uma deliciosa lembrança familiar: Em 1988, minha mãe, então funcionária pública, resolveu ajudar meu pai na sua modesta loja de móveis. A primeira medida enquanto consultora autoproclamada, foi comprar uma impressora colorida, rara na época, e pedir ajuda dos filhos para criar cartões de aniversário personalizados usando o avançado Pagemaker. Esses cartões eram assinados por todos os membros da família e, me lembro como fosse hoje, me revoltava em ter de passar metade dos sábados assinando cartões para “desconhecidos”.
Adivinhem, esses tais desconhecidos valorizaram o fato de nos importarmos com a data e, como consequência, as vendas duplicaram em menos de 6 meses. Esses clientes iam até a loja para agradecer o carinho, dizendo que nem os familiares haviam se lembrado da data, e acabavam fazendo novas compras e assumindo novas prestações que honravam religiosamente.
No final, o SXSW veio para validar a crença que minha mãe cultivava desde a década de 80: tudo gira em torno das pessoas e suas histórias.
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