A medida em que o Brasil começa a produzir suas próprias big techs, empresas tradicionais se verão cada vez mais pressionadas a se reinventarem por meio de inovação tecnológica e cultural.
Esta é a análise de Fabrício Bloisi, fundador da Movile, um titã do ecossistema de inovação nacional que engloba empresas como Sympla, PlayKids e iFood, detentoras de valuations bilionários ou chegando a esse patamar.
O empreendedor de 41 anos se diz “incorrigivelmente otimista” em relação à evolução da inovação nacional e prevê que as maiores empresas no Brasil serão substituídas por empresas de tecnologia, a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos, onde a Amazon e a Apple estão entre as dez maiores do país.
“Cabe aos brasileiros serem menos pessimistas e saírem do discurso de que a economia não cresce e nada vai para a frente, bem como reconhecer que a última década foi incrivelmente positiva para o cenário de tecnologia brasileiro”, ressalta.
“[As empresas tradicionais] não morrerão, mas crescerão bem mais lentamente. Enquanto essas organizações crescem em uma média de 5% ao ano, empresas de tecnologia como a nossa crescem 130% em um segmento que vale bilhões de dólares”, aponta. “Além disso, criamos muita transformação e valor para a sociedade.”
O atual boom de startups de tecnologia e a disponibilidade de capital para este segmento não se trata de um excesso no Brasil, diz Bloisi, que descreve o desenvolvimento recente do setor como parte de um movimento de progresso.
“Uma eventual bolha de tecnologia mundial não pegaria o Brasil de jeito nenhum. Estamos ainda muito abaixo do potencial: temos de ter centenas de empresas de tecnologia brasileiras que valem R$ 100 bilhões.”
O rápido crescimento de companhias como a Movile faz com que organizações com mais tempo de janela sintam a urgência de evoluir suas agendas de reinvenção digital, segundo Bloisi.
“Estas empresas precisam enfatizar alguns valores como criar condições para que pessoas transformem tudo e assumam mais riscos – só assim elas conseguirão voltar a crescer.”
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A criação e manutenção de uma cultura com menos hierarquia e mais senso de dono é, segundo Bloisi, uma qualidade fundamental de empresas que buscam responder às imperativas do mundo digital.
“Aqui temos menos gente fazendo o que o Fabricio manda e mais pessoas questionando a liderança o tempo todo, assumindo riscos e aceitando que errar é normal”, diz o fundador. “Não se trata de sair querendo errar, mas de ter abertura e principalmente aprender com estes erros.”
“As empresas tradicionais líderes de mercado tipicamente repensam a direção a cada ano, ao passo que nós estamos mensalmente revisando e trocando tudo, se necessário”, acrescenta. “A inovação precisa ser indissociável da cultura da empresa e de qualquer meta de crescimento exponencial.”
Falando com a FORBES na sede do iFood, em Osasco (SP), um escritório que está chegando a sua capacidade máxima com 2.500 colaboradores, Bloisi aceita que o rápido crescimento também tem seus reveses, principalmente no que diz respeito a capacidades que o mercado ainda busca aprimorar.
“Precisamos de profissionais ambidestros, empreendedores que consigam organizar e executar metas e que ao mesmo tempo consigam ser criativas e mudar, mas principalmente, precisamos de pessoas que consigam aceitar a ambiguidade”, aponta.
Usando o exemplo de extensos manuais de regras criados por empresas estabelecidas, Bloisi descreve o caráter ambíguo do negócio, onde funções, estruturas e tecnologias mudam constantemente.
“Nós nem queremos escrever manuais de 200 páginas para dizer como pessoas devem agir, por que não dá tempo de escrever e nem de ler: o que é feito hoje daqui duas semanas tem de ser diferente e provavelmente melhor”, detalha. “Nem todo mundo ama isso.”
Além disso, o fundador admite que, com a contratação de mais de 1.500 pessoas nos últimos oito meses, a comunicação tem sofrido. Bloisi assume a responsabilidade por essa piora e diz que tem sido “incrivelmente difícil” manter o padrão que gostaria, mas que investe grande parte de seu tempo no tratamento dessa dor do crescimento, que também envolve certa vulnerabilidade.
“Me sinto extremamente empoderado por estar mudando o mundo, quando erro fico chateado, mas aceito que minha vida envolve frustrações e expor as falhas do líder é fundamental”, diz o empreendedor baiano, que também tem o aumento em representatividade de negros e mulheres na liderança como uma de suas metas críticas.
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Sobre o abismo entre os quase 13 milhões de desempregados no Brasil e as centenas de vagas especializadas que a Movile busca recrutar, Bloisi diz que uma de suas motivações é reverter o quadro de escassez de mão de obra qualificada no Brasil.
Para endereçar o problema, a empresa criou a Fundação 1Bi, cujo objetivo é capacitar um bilhão de jovens profissionais entre 16 e 24 anos com treinamentos próprios e em parceria com instituições de ensino e ONGs. A iniciativa, lançada em agosto deste ano, inclui projetos como o Aprendizap, canal desenvolvido em parceria com a Wavy, empresa de mensageria do grupo, com conteúdo voltado a áreas como o Enem e competências socioemocionais.
“Estamos treinando centenas de milhares de pessoas, mas quero treinar milhões. A educação de hoje é igualzinha a 100 anos atrás, mas temos de melhorar a empregabilidade com educação e tecnologia e precisamos ter uma agenda com o governo que trate disso”, ressalta Bloisi.
Sobre o avanço da inteligência artificial –uma das principais áreas de foco para a Movile, que só pelo iFood investe mais de R$1,5 bilhão em pesquisa e desenvolvimento para tecnologias neste segmento – e o consequente desaparecimento de empregos, o fundador defende um debate mais sofisticado.
“Dizem que a IA é ruim porque mata o emprego: mata mesmo, mas cria outros milhões de vagas. Se você gastar toda a energia do Congresso com esse argumento, não educa as pessoas para os empregos do futuro,” indica.
Sobre a suposta precarização do trabalho promovida por plataformas como o iFood, Bloisi acredita que é preciso investir mais em capacitação para que estas pessoas possam acessar segmentos mais qualificados do mercado de trabalho.
“Para que empregos tenham maior valor agregado, há um processo, que passa por educação e maior produtividade. Queremos aumentar o impacto do nosso trabalho nesta área, investindo em iniciativas, propondo leis que fomentem isso, pois nossa responsabilidade nessa área é enorme”, ressalta.
Em um ano, Bloisi quer posicionar a empresa que fundou como um case global de referência em termos de impacto positivo na sociedade, em áreas que incluem educação, diversidade e segurança alimentar, bem como continuar a promover o ecossistema de tecnologia nacional.
“Espero que no final de 2020, esteja mais claro para a sociedade brasileira que podemos acelerar crescimento econômico investindo em tecnologia, e o grupo Movile pode contribuir mais nesse sentido. Temos muitos objetivos grandes para o próximo ano e tenho convicção total que vamos chegar lá.”
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InovAtiva conclui ciclo com evento em São Paulo
O InovAtiva Brasil, iniciativa de aceleração de startups do Ministério da Economia e Sebrae, celebra o marco de 1.000 startups participantes do programa com um evento em São Paulo. Entre 30 de novembro e 2 de dezembro, o InovAtiva Experience marca o final do ciclo de aceleração do programa e busca promover conexão os players do ecossistema de inovação. O evento inclui mentoria, simulação de pitches e um demoday no último dia e acontece na na Escola de Negócios Sebrae, em São Paulo.
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Techstars promove diversidade em inovação
Fomentar startups no âmbito da diversidade e facilitar o contato entre profissionais e empresas é o objetivo do primeiro Startup Weekend Service LGBTI+, que será promovido pela Techstars entre 29 de novembro a 1º de dezembro, na sede do grupo Zap, em São Paulo. Uma banca de jurados julgará as três melhores ideias voltadas ao público LGBTI+, que serão premiados. O valor dos ingressos chega a R$ 220.
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Inovabra reúne empreendedoras da periferia
Para comemorar e divulgar o dia mundial do Empreendedorismo Feminino, o Inovabra, espaço de inovação do Bradesco, organizará um evento gratuito amanhã (21) às 19h, com a participação de mulheres que empreendem na periferia. Palestrantes que compartilharão seus desafios e aprendizados incluem Viviane Duarte, CEO da consultoria de diversidade, gênero e raça Plano Feminino.
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Angelica Mari é jornalista especializada em inovação há 18 anos, com uma década de experiência em redações no Reino Unido e Estados Unidos. Colabora em inglês e português para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC, The Guardian e outros.
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