Muito se comenta sobre os números e desempenho do Agro e pouco se fala sobre os desafios enfrentados pelos produtores rurais, que são empreendedores dinâmicos e sobretudo otimistas, por desenvolverem uma atividade onde uma das variáveis da equação não se controla: a natureza.
O Brasil é o maior produtor mundial de soja e um dos maiores produtores mundiais de milho, a safra de grãos 20/21 deve ser recorde de 272,3 milhões de toneladas, 15,4 milhões de toneladas superior à safra 19/20 de acordo com dados da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento).
Olhando de fora para os preços e a produtividade parece ser um ano excelente, porém, devido ao excesso de chuva, o Brasil está vivendo atrasos na colheita da safra de soja e consequentemente no plantio da safrinha, a segunda safra, em geral de milho. Isto implica em os produtores plantarem a segunda safra fora da janela ideal de plantio, o ZARC (Zoneamento Agrícola de Risco Climático), e desta maneira, ficarem descobertos pelo seguro rural e sujeitos a produtividade abaixo do esperado.
Os estoques de milho do Brasil estão baixos e existe a previsão do aumento de demanda para produção de carne de frango e suína. O país baixou o imposto de importação e independente disto, precisa de uma boa safra de milho.
A CNA (Confederação Nacional da Agricultura) entrou com um pedido de prorrogação da janela de plantio do milho junto ao Ministério da Agricultura. Dividir o risco com os produtores, esticando a vigência do seguro, seria um estímulo para os produtores plantarem com direito ao seguro agrícola, mesmo correndo o risco de baixa produtividade. O pedido foi rejeitado, com a alegação de que o zoneamento veio para trazer mais segurança para as seguradoras que entraram no mercado de seguro rural.
Outro ponto é a enorme quantidade de produtores que firmaram contrato futuro de venda de soja no começo de 2020 e devido ao câmbio, viram o preço da soja praticamente dobrar. Produtor rural não é de “dar para trás em negócio”, a maioria esmagadora vai cumprir os contratos, mesmo recebendo 60% do valor de sua produção e sendo obrigados a comprar insumos e todo material para plantio da safra 21/22 a valores mais elevados, tendo como base os valores atuais da soja R$150,00.
Mas vamos por partes, você pode estar se perguntando, safrinha, segunda safra? É isto mesmo, somente os produtores rurais brasileiros plantam na mesma área duas ou até três safras por ano, resultando assim em enorme ganho ambiental, pois se aumenta a produtividade, sem a necessidade de aumento de área. A segunda safra é mérito de pesquisa, desenvolvimento técnico, científico e dos produtores brasileiros, que a partir do final da década de 1980, começaram de maneira experimental, se arriscando sozinhos, sem seguro, a plantar uma segunda cultura. Isto trouxe ganho de eficiência para a agricultura brasileira, nos levando a um novo patamar de competitividade, visto que outros países não conseguem produzir duas ou três safras por ano na mesma área. Dados da CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) mostram que a segunda safra ultrapassou a primeira safra no total de milho produzido a partir de 2011.
Este ano está muito atípico, o ciclo está atrasado em 12 dias, em muitas regiões produtoras faltou chuva na época de florescimento da soja e houve excesso de chuva na colheita. A chuva tem atrapalhado a colheita pois no solo encharcado o maquinário não pode entrar para colher, os grãos tem que ter a umidade correta e mesmo que não chova, tem que haver sol para que se atinja a umidade de colheita, 13%. Alguns produtores já relatam a presença de grãos ardidos devido a umidade por excesso de chuvas. Produtores que adotam técnicas como plantio direto e terraços, correm menos risco de que enxurradas arrastem as camadas superficiais do solo, ricas em fertilizantes e matéria orgânica, erodindo e empobrecendo o solo. Soja e milho, são cultivados na mesma área e o atraso na colheita da soja consequentemente impede o plantio do milho. Este atraso no plantio do milho pode aumentar o preço de outros produtos no mercado, pois o cereal é um componente importante de rações animais.
De acordo com Ricardo Arioli, engenheiro agrônomo e presidente da Comissão de Cereais da CNA, “Com os preços do milho, o número de sacas necessárias para pagar o custo de produção caiu bastante, então mesmo plantando fora de época e colhendo menos, provavelmente os pedidos de seguro não seriam tão expressivos”.
O MAPA (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento) visa estimular o plantio de milho, devido a demanda elevada prevista, e pediu para a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) a adição de mais um nível de risco para o seguro rural de 50% (hoje o zoneamento vai de 20 a 40%) que deverá ser apresentado ao Banco Central e às seguradoras como proposta para a próxima safra.
Apesar das adversidades, a previsão da CONAB para a produção de soja continua mantendo a tendência de crescimento, com uma área de 38,5 milhões de hectares e produção de 135,1 milhões de toneladas. Já para o milho, a previsão é de uma safra recorde de 108 milhões de toneladas.
Mesmo em anos atípicos, a trajetória de sucesso da agricultura brasileira é devido a um esforço conjunto de políticas públicas, avanços científicos, tecnológicos, competência e resiliência dos agricultores, que elevou o Brasil a um dos maiores produtores de alimentos do mundo.
Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio. E-mail: [email protected].
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.
Tenha também a Forbes no Google Notícias.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.