O milho é utilizado para alimentação humana, animal e também para produção de etanol. A alta recorde do preço do milho impacta portanto toda cadeia de produção, chegando até o consumidor final. Para ele, fica a impressão de que o produtor rural é o responsável pela alta dos alimentos. Por outro lado, o produtor que precisa comprar milho para alimentar seus animais ou produzir combustível, sente duramente no bolso.
Se a culpa não é do produtor de milho, a que se deve o aumento no preço da saca do cereal? Dados do CEPEA/ESALQ mostram um aumento de 53% na saca de milho, cujo preço médio foi de R$ 57,92 em abril de 2020 e disparou, atingindo a média de R$ 97,15 em abril de 2021.
As razões do preço tão alto do milho em 2021 são internas e externas. Com relação ao mercado externo, sendo o milho uma commodity, seu preço é regulado internacionalmente. O seu valor na bolsa de Chicago bateu o recorde nesta semana, chegando ao maior valor em oito anos, fechando acima de US$ 7 por bushel. Esta tendência se intensificou no início de abril, quando o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), de longe o maior produtor mundial, publicou um relatório mostrando a área plantada e os estoques com números abaixo do esperado; também nos EUA, o inverno rigoroso não está permitindo que a safra americana seja plantada, além das baixas temperaturas atrapalharem a germinação do pouco que já foi plantado.
Junte a isto a alta do dólar frente ao real, que faz com que as commodities, que são cotadas em dólar, fiquem valorizadas para exportação e devido a taxa de câmbio, o grão se torna caro na nossa moeda. Para se ter uma ideia, segundo a Scot Consultoria, “Em São Paulo, a relação de troca entre boi gordo e milho encontra-se no pior patamar dos últimos doze meses, com recuo de 13,1% no poder de compra do pecuarista ou 0,5 sacas de milho a menos por arroba de boi gordo vendida”
Temos ainda o aumento da demanda externa, que segue aquecida ano após ano, sobretudo da China. A título de ilustração, as importações de milho pela China, somente no mês de março, foram seis vezes mais do que no ano passado durante o mesmo período, chegando a 1,93 milhão de toneladas.
Já em relação ao mercado interno, o baixo estoque é a razão principal; mesmo batendo recorde atrás de recorde de produção, os estoques de milho estão baixos e devido ao mecanismo de oferta e procura, o preço automaticamente subiu. No mercado interno, não se compra milho abaixo da cotação do produto como commodity para exportação. Existe redução expressiva na estimativa de produção para a segunda safra, que foi plantada atrasada, fora da janela ideal de plantio e terá que contar com chuvas fora de época para conseguir atingir a produtividade esperada. Além deste fator, houve aumento da demanda de milho internamente para alimentação de aves, porcos e bovinos, tanto para consumo interno, como para exportação.
Como visto acima, devido a globalização, a alta dos preços dos alimentos na gôndola do supermercado no Brasil pode ser devido instabilidades climáticas nos EUA, taxa de câmbio ou aumento da demanda externa por produtos agrícolas brasileiros.
E agora José? Qual seria então a solução?
O governo suspendeu a alíquota da taxa sobre importação de milho até o fim do ano, no intuito de tornar mais barata a entrada de grãos vindos de fora. Mas se o Brasil é um dos maiores produtores de milho do mundo, então não faz sentido importar milho, correto? Exato, primeiro porque compraríamos milho caro e muitas vezes altamente subsidiado; segundo porque somando o preço no mercado mundial ao frete, o milho chegaria aqui mais caro do que o milho brasileiro e terceiro, deixaríamos de prestigiar a nossa agricultura. É inteligível que se tome essa medida emergencial, mas isso, provavelmente, não fará o preço baixar. Toda esta situação deveria ter sido prevista pelos órgãos competentes, que poderiam criar um sistema de informação sobre as exportações de milho, mantendo a previsibilidade dos estoques.
O granjeiro, o confinador e o produtor de leite não podem absorver este prejuízo, o milho é o principal item no custo de produção da alimentação dos animais e todo o setor está sentindo no bolso o peso da compra do cereal nestes patamares tão elevados.
Esta alta de preço internacional do milho influencia em cascata os preços dos produtos que usam o grão na sua produção principalmente aves, ovos, carne e leite e em algum momento essa alta será repassada para o consumidor. Pode haver influência na oferta de proteínas aos consumidores, impactando o dia a dia do brasileiro.
Este aumento preocupa o Ministério da Agricultura, mas não a ponto de que ele faça mudanças, como estabelecer um estoque regulador ou impor limites às exportações.
O governo acredita em incentivar a produção e aumentar assim a oferta, com possíveis soluções como melhorar o seguro rural, corrigir o preço mínimo e eventuais importações. Acredita-se que os preços devem entrar mais na normalidade no segundo semestre com a entrada da 2ª safra brasileira e da safra americana no mercado.
Os elos fracos desta corrente são o produtor numa ponta e o consumidor na outra; como se vê, são elos que não podem influenciar nos preços, cabe às autoridades medidas que antecipem e evitem estes problemas que periodicamente acontecem.
A colheita da safra é sempre um momento de celebração no campo, é o final de um ciclo, o pagamento de horas árduas de trabalho e dedicação do produtor e neste ano, será ainda mais, pois tudo indica que significará o início de um ciclo de acomodação de preços internacionais, proporcionando para o brasileiro, já tão impactado pela crise, uma luz no horizonte.
Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio. E-mail: [email protected].
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