Falar do desempenho do agronegócio é, em boa parte, falar sobre como vai o Brasil. Afinal de contas, em 2020, o setor foi responsável por uma participação de 26,6% do PIB (Produto Interno Bruto) e tem relação direta e indireta com mais de 40% da mão-de-obra empregada do país.
De acordo com o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), o PIB do agronegócio cresceu 5,35% apenas considerando o primeiro trimestre de 2021, se comparado ao mesmo período do ano passado. Em 2020, o indicador alcançou crescimento recorde acumulado de 24,3%.
O resultado chama a atenção não somente pelo valor em si, mas por ter sido alcançado em um ano especialmente desafiador, em que isolamento, paralisações, lockdowns e medidas restritivas desmancharam as chances de recuperação após a derrocada da crise econômica iniciada no biênio 15/16.
O novo ciclo de alta das commodities voltou a influenciar positivamente as cotações, elevando o valor da produção brasileira e, consequentemente, seu resultado. Certamente a alta de custos e as dificuldades climáticas vieram para mostrar que, mesmo em tempos de alta recorde, produzir não é fácil e que ao setor rural é invariavelmente necessário matar um leão por dia. Mas isso é assunto para uma próxima oportunidade.
Voltando ao cerne da questão, longe de chamar a atenção apenas durante a crise de Covid-19, o setor vem colecionando um desempenho que se destaca dos demais setores produtivos ao longo dos anos e que, diante do cenário ao melhor estilo “Mad Max” que vivemos entre 2020/21, recebeu uma grande chance de evidenciar o óbvio: o mundo pode parar de girar, menos para o agronegócio, já que as pessoas podem parar de consumir, mas não podem parar de se alimentar.
A China, gigante em diversos sentidos, já percebeu isso. Como comentei em minha coluna anterior, há um investimento robusto daquele país em cadeias produtivas desde sua base até o consumidor final com a finalidade de interromper o ciclo migratório populacional das zonas rurais para as urbanas. Desta forma, o investimento no desenvolvimento agropecuário faz todo sentido para estimular o ganho de renda per capita nessas regiões, gerar empregos e sustentar a permanência dos residentes, para abocanhar todo o ganho em PIB que contorna as cadeias produtivas agropecuárias (insumos, produção, processamento, distribuição e consumo).
Assim, ao contrário do que grandes economias promoviam no século passado, o processo de aceleração da industrialização em detrimento da produção de commodities não pode ser levado às últimas consequências e o conceito básico de diversificação se mostra mais uma vez importante para reduzir o risco de mercado.
Assim, foi o setor que apresentou a maior variação no acumulado do ano relativo ao saldo de empregos gerados no Brasil: 7,12% contra 3,84% para a indústria, 2,75% para serviços e 3,13% no agregado econômico brasileiro. De janeiro a maio, o saldo de empregos formais na agropecuária foi o maior dos últimos dez anos.
Não é de graça que o setor vem atraindo os olhares atentos do investidor. Novos produtos de renda fixa lastreados na produção e em terras agrícolas têm ganhado atenção no mercado de capitais. Operações alternativas que têm a produção como alvo também permeiam oportunidades de negócios, bem como produtos mais complexos que estão e deverão estar cada vez mais na prateleira do investidor, do arrojado ao conservador. Por isso, informação de qualidade acerca do setor nunca teve tanto valor.
Esse resultado positivo, combinado aos investimentos e avanços tecnológicos na produção em si, deverão abrir ainda mais a boca de jacaré ilustrada no gráfico acima, aumentando a capacidade do Brasil de alimentar o mundo, já que hoje somos responsáveis por aplacar a fome de mais de 1 bilhão de pessoas mundo afora.
Importância, competitividade, ganhos em eficiência e crescimento já estão provados. O grande desafio está agora em conseguir demonstrar a qualidade e sustentabilidade da produção para o consumidor final, que sofre com setores da sociedade que lucram com o “quanto pior, melhor” e com exceções que andam à margem da legalidade.
Enfim, ninguém vive sem o agronegócio e certamente ele continuará crescendo e evoluindo.
Lygia Pimentel, CEO da AgriFatto, é médica veterinária, economista e consultora para o mercado de commodities. Desde 2007 atua no setor do agronegócio ocupando cargos como analista de mercado na Scot Consultoria, gerente de operação de commodities na XP Investimentos e chefe de análise de mercado de gado de corte na INTL FCStone.
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