Em ano marcado por explosão das despesas governamentais e encolhimento da arrecadação tributária diante do baque da pandemia da Covid-19, o rombo fiscal do setor público atingiu patamares sem precedentes em 2020 e a dívida pública bateu recorde, a 89,3% do PIB, mostraram dados divulgados pelo Banco Central hoje (29).
Ainda que superlativos, inclusive na comparação internacional, os resultados vieram um pouco melhores do que o esperado por analistas e pelo próprio governo há algumas semanas, refletindo uma reação da arrecadação federal em dezembro, um represamento de despesas e também o impacto de efeito estatístico.
No ano, o setor público registrou déficit primário de R$ 702,950 bilhões, o equivalente a 9,5% do PIB e mais de quatro vezes superior ao que era até então o maior rombo da história, de R$ 155,8 bilhões, ocorrido em 2016.
Em dezembro, o Ministério da Economia previu que as contas públicas teriam déficit primário de R$ 844,2 bilhões no ano, com a dívida bruta chegando a 93,3% do PIB. A projeção mais recente do mercado era de uma dívida bruta de 92,50%, segundo levantamento da pasta.
De acordo com Rachel de Sá, analista de macroeconomia da XP, o resultado melhor do que o esperado reflete recuperação “relativamente forte e rápida” da arrecadação e despesa abaixo do projetado com gastos previdenciários e relacionados à Covid-19.
“Olhando para o futuro, entendemos que os resultados fiscais melhores do que o esperado para 2020, principalmente o nível de endividamento, trazem um alívio temporário para 2021”, disse a economista em nota. “No entanto, o Orçamento extremamente apertado ainda representa um desafio extremamente relevante para a gestão fiscal neste ano.”
O próprio presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta semana que o resultado da dívida bruta havia surpreendido positivamente, mas que o movimento refletia principalmente um efeito estatístico, já que o PIB caiu menos do que o esperado.
“Achava importante dizer porque eu tenho visto algumas pessoas escrevendo, dado que foi melhor, então a gente tem mais espaço (para gastar)”, disse Campos Neto. “Na verdade, grande parte do efeito foi estatístico. A gente tem uma melhora de fato no primário, que é no que não foi gasto, mas é muito menor do que o efeito estatístico.”
A dívida bruta subiu o equivalente a 15 pontos percentuais sobre 2019, e o patamar atual está entre os mais elevados dos países emergentes, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI). A dívida líquida aumentou para 63% do PIB em 2020, ante 54,6% do PIB no final de 2019.
O aumento do endividamento se deu em meio à redução dos gastos com juros, que atingiram no ano passado o equivalente a 4,22% do PIB, menor patamar da série do BC, iniciada em 2002, e frente a 4,96% do PIB em 2019.
A redução das despesas com juros acompanhou a queda da taxa Selic. O chefe do Departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha, destacou que a redução teria sido ainda maior se não fossem as despesas da autoridade monetária com os contratos de swap tradicional, em que o BC perde quando há desvalorização do real.
Estados
Enquanto o governo federal fechou 2020 com rombo histórico, Estados e municípios conseguiram registrar superávit no ano da pandemia, de R$ 38,7 bilhões, ou 0,52% do PIB, melhor resultado desde 2011 (+0,75% do PIB). As contas dos entes regionais foram engordadas no ano por um repasse de 78 bilhões da União em auxílio por causa do coronavírus.
Questionado se os resultados fiscais indicariam que os pagamentos a Estados e municípios teriam sido excessivos, Rocha disse que o BC não tem condições de avaliar por não ter acesso às informações orçamentárias dos entes.
Em dezembro, o setor público registrou déficit primário de R$ 51,8 bilhões. Considerando também despesas com juros, o país teve déficit nominal de 75,8 bilhões de reais no mês.
No acumulado em 12 meses, o rombo primário equivale a 9,5% do PIB. (Com Reuters)
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