A pandemia – e o consequente isolamento social imposto por ela – mudou a relação dos brasileiros com suas casas. A maioria, ou 73%, passou a enxergar suas residências de forma diferente e 16,5% das pessoas decidiram se mudar em plena crise sanitária. Os dados foram revelados por uma pesquisa feita pelo QuintoAndar, plataforma digital de compra e venda de imóveis, em parceria com o instituto Offerwise, obtido com exclusividade pela Forbes.
Os principais fatores apontados para essa mudança estão relacionados à necessidade de ter um escritório em casa (31,8%), ao desejo de mais áreas verdes no entorno do imóvel (28,4%) e ao aumento da importância de um espaço de lazer em casa ou no condomínio (24,8%). Também foram citados motivos como a necessidade de um imóvel mais espaçoso (22,4%), maior independência (22,4%), adequação à nova realidade financeira (22,2%), maior importância às varandas e sacadas (21,7%), possibilidade de viver afastado dos grandes centros (21,1%) e necessidade de morar em um local com ampla cobertura de aplicativos de entrega (12%).
Do total de entrevistados – 1.500 em todas as regiões do país –, pouco mais de 83% continuaram morando no mesmo local. Dessa amostra, 11% declararam ter feito reformas durante a pandemia. Entre aqueles que se mudaram – 16,5% –, as principais razões foram a necessidade de economizar (18,5%), começar uma nova fase com o parceiro (16%) e ter mais espaço e conforto (14,5%). Morar mais perto do trabalho, por outro lado, foi motivo para apenas 3,6% das pessoas que se mudaram, enquanto os divórcios foram responsáveis por 5,6%.
Os efeitos econômicos da pandemia são claramente refletidos nas intenções dos brasileiros em relação à moradia. Segundo o levantamento, caso precisassem se mudar agora, 28,7% das pessoas buscariam um imóvel mais barato. Por outro lado, 19,5% delas escolheriam uma casa maior, 11,4% buscariam algo mais próximo do local de trabalho, 10,2% procurariam casas e bairros mais silenciosos e 9,7% optariam por espaços próximos à natureza.
“A pesquisa mostra que os efeitos da pandemia na relação das pessoas com suas casas são os mesmos em todas as regiões do país, o que sugere que não são mudanças passageiras e, de uma forma ou de outra, vão continuar influenciando a demanda e, portanto, o mercado imobiliário ainda por um bom tempo”, diz Julio Calil, diretor de contas da Offerwise.
MORADIAS DO FUTURO
Para o Projeto Moradia no Mundo Pós Pandemia, lançado no início de setembro como um think tank da habitação, a crise sanitária definitivamente contribuiu para acelerar mudanças de hábitos de consumo e de comportamento no mercado imobiliário. As empresas precisarão reinventar produtos e serviços para atender um novo consumidor que nasceu junto com a pandemia.
A iniciativa elegeu três tendências de habitação impulsionadas pela Covid-19, que talvez acontecessem daqui a cinco ou 10 anos, mas que já vem se tornando realidade. Uma delas é a moradia como serviço. “Assim como os aplicativos de carros deram uma maior autonomia de escolha para as pessoas se locomoverem pela cidade, pagando um preço acessível, a moradia como serviço é uma tendência que já existe, mas que certamente será impulsionada devido à crise imposta pela pandemia”, concluíram os participantes do encontro.
A economia do compartilhamento aplicada à moradia é uma realidade crescente entre os jovens. Segundo com uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas Sociais Políticas e Econômicas (IPESPE) em agosto deste ano, 80% dos jovens entre 16 e 24 anos já admitem não se importarem com a compra de um imóvel. Mais de 50% das pessoas acima de 60 anos também dizem querer ter mais liberdade para morar. “Diferente de gerações anteriores, lares não são mais os mesmos investimentos sentimentais que costumavam ser”, disse Shawn Amsler, professor e especialista em mercado imobiliário da Faculdade de Columbia que participou da iniciativa.
A Housi é uma das empresas que oferece o serviço por assinatura por meio de uma plataforma digital. Em meados de dezembro, a empresa – que até então atuava em São Paulo, onde um terço da população vive de aluguel, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Fortaleza, Goiânia e João Pessoa – expandiu sua atuação para o Rio de Janeiro. Na época, o valor de mercado dos imóveis geridos pela empresa chegava a R$ 10 bilhões.
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A segunda tendência apontada pelos especialistas é o de multifamily properties, uma forma de investimento muito comum no mercado norte-americano. Em vez do que ocorre hoje, quando cada apartamento tem um pequeno investidor como dono (o locador), cria-se um complexo de apartamentos ou casas cujas unidades pertencem todas a uma espécie de holding. Com um único dono, a gestão das unidades é centralizada. Ou seja, todos os moradores do complexo são inquilinos. A operação de locação é tocada como um negócio profissional, com um modelo de operação que visa reduzir custos e simplificar as decisões de investimento na propriedade. “Modelos de investimento como o multifamily properties são rentáveis e significam um menor custo de transação em comparação ao aluguel tradicional”, explica o professor da FGV, Gesner de Oliveira.
Por fim, o projeto aposta no coliving, uma vez que a falta de espaços físicos nas grandes cidades já é uma realidade. Como alternativa, surge uma tendência que pretende derrubar, além de paredes, os ideais de individualização e desperdício. O movimento estimula a integração, a sustentabilidade e a colaboração entre os indivíduos. Apesar de ser bastante comum na Europa e nos Estados Unidos, os colivings desembarcaram no Brasil há menos de cinco anos e ainda não decolaram. Por conta da pandemia, estima-se que existirá uma aceleração neste tipo de empreendimento.
Uma exceção é a Yuca, fundada em 2019 por três sócios, que conta com 300 quartos (operacionais e em fase de operacionalização) para locação em diferentes áreas de São Paulo como Pinheiros, Jardins, Bela Vista e Consolação. Os quartos individuais em apartamentos compartilhados são 100% mobiliados e decorados e contam com líderes de comunidade, pessoas que garantem a gestão dos espaços alocados, fornecendo conteúdo e apoio para garantir uma boa convivência entre os locatários e habitantes dos edifícios em que vivem. Segundo a propetch, o modelo de moradia chega a ser 50% mais barato do que morar sozinho nesses bairros.
EMPREGO X MORADIA
A pesquisa do QuintoAndar revelou, ainda, a situação de empregabilidade dos entrevistados. Do total de pessoas ouvidas, 30,3% seguem no mesmo trabalho, com o mesmo salário, de antes da pandemia, enquanto cerca de 8% mantiveram suas posições, mas com remunerações menores. Quase 16% perderam o emprego e continuam desempregados e 11% não trabalhavam – e continuam assim. Outros 9,5% se declararam autônomos ou freelancers e reportaram queda no volume de serviços. Dos que perderam o emprego, apenas 5,1% conseguiram recolocação e 1,3% revelou ter partido para o empreendedorismo.
O grau de interferência da pandemia na vida das pessoas também foi revelado pelo estudo: 27,2% dos entrevistados alegaram mudanças drásticas na renda, 26% nos horários e atividades e 21,3% na dinâmica familiar. Apenas 12,9% não reportaram alterações econômicas.
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