Quem olha Marcelo Ferreira com cabelos longos, fala descontraída e boné aba reta não imagina que o grafista é um dos milionários do mercado financeiro. “Eu não preciso me enquadrar na sociedade. A sociedade que, se quiser, me aceite, senão, tudo bem, eu fico rico do mesmo jeito“, ironiza o trader que fez fortuna operando no mercado Forex.
Longe de nascer em berço de ouro, Marcelo Ferreira deixou aos 12 anos Cataguases (MG) para viver no Rio de Janeiro, onde trabalhava fazendo delivery de remédios da região na Barra da Tijuca. “Eu visitava vários apartamentos e muitos deles eram de famosos”, lembra.
Uma dessas entregas, no entanto, mudaria sua vida. Ao entrar em um apartamento de frente para o mar, com uma vista única, pensou em voz alta: “Quero comprar uma casa assim um dia.” O dono do imóvel deu ao jovem Marcelo um conselho que levaria para toda a vida: “Se você quiser conquistar o que eu tenho, você precisa trabalhar para si, não para algum chefe.”
Na saída do prédio, o garoto ficou surpreso com o nome no recibo da entrega que acabara de fazer. “Na época, eu não sabia quem era, mas hoje se eu soubesse, não acreditaria que aquele homem era o Oscar Niemeyer”, conta. O conselho do arquiteto criou em Marcelo o desejo de empreender. Daquele dia em diante, não quis trabalhar para mais ninguém.
Animado com a ideia de empreender, Marcelo investiu no primeiro negócio: uma empresa de telemensagens, o Amor Eterno. Comprou um aparelho de som e alguns CDs com mensagens gravadas por R$ 100 e colou cartazes pelos muros do Rio de Janeiro. “Esse foi o meu e-mail marketing na época”, lembra. Depois, acreditando que o negócio poderia dar certo, passou a anunciar algumas mensagens gravadas na Rádio Melodia, que tinha o público evangélico como ouvinte principal. “A minha veia empreendedora começou ali”, comenta.
Apesar do sucesso do negócio, em 1997, o empreendedor antecipou uma profunda mudança no hábito do seu público ao perceber que o acesso à internet pelo brasileiro seria fatal para o Amor Eterno. “Peguei tudo e vendi”, comenta. O novo negócio seria no Barra Shopping. Uma loja de roupas em que peças compradas por R$ 6 eram vendidas por R$ 120.
Dois anos após a compra da loja, Ferreira decidiu se desfazer do negócio para entrar no mercado financeiro ao descobrir que um amigo operava na Bolsa de Valores. Na época, ele usava papel milimetrado para traçar as curvas das velas, técnica utilizada por quem queria treinar gráficos num período em que o acesso a computadores ainda era limitado.
O mercado e às três personalidades de Marcelo
“Eu me defino como três Marcelos, o primeiro é o empreendedor que ouviu o Niemeyer e começou a ser autônomo, o segundo é o que investe em renda fixa, deixa o dinheiro rendendo, compra ações na Bolsa e tudo mais. Já o terceiro é o trader, que trabalha no mercado cambial.”
Quando começou a entender sobre o mercado, Marcelo percebeu que deveria estudar muito e passou a pesquisar sobre algumas técnicas de operação, como a teoria de Elliott, a sequência de Fibonacci, entre outras técnicas difundidas entre os traders. “Quando eu comecei a operar, encontrei algumas falhas ao fazer uma venda em uma linha de tendência ou compra de resistência. Por isso, eu precisei criar a minha própria técnica inspirada em teorias já existentes”, ressalta Marcelo. “Tenho medo de dizer que essas teorias não funcionam, não é isso, é que para mim elas só não eram suficientes”, acrescenta.
A Fimathe é uma abreviação para Fibonacci e matemática, técnica criada por Marcelo Ferreira. O grafista comenta que a estratégia funciona encontrando um padrão na repetição dos gráficos e que serve para analisar funções de consolidação de uma linha, ou seja, “se um preço oscilou em R$ 10 a R$ 15, eu sei que quando ele chegou em R$ 10, pode voltar em cerca de R$ 15, mas não é só isso, tem toda uma técnica comportamental desenvolvida”, explica o trader. Em seus vídeos do YouTube, com mais de 264 mil inscritos, Marcelo comenta que fazer day trade é 10% técnica e 90% psicológico.
Segundo Marcelo, a Fimathe é a técnica mais utilizada na língua portuguesa e seus vídeos nas redes sociais ensinam como aplicá-la. No entanto, ele alerta que, para usá-la, é preciso conhecimento ao menos básico de economia e que não se pode iniciar com a ganância de querer ficar rico.
“A gente tem um enorme problema nas redes sociais, porque temos youtubers que vendem um curso dizendo que as pessoas terão lucros altíssimos operando no mercado Forex, isso é mentira, esse é o grande problema, a ilusão passada pelos canais do YouTube”. Em suas operações, o trader conta que opera cerca de R$ 12 milhões, então é possível fazer operações de três minutos com um lucro de R$ 100 mil. “O que ninguém vê é que esse meu lucro é 0,1% do que eu estou investindo, então quando menos aplicar, menor vai ser a liquidez. Ser rico não é da noite para o dia.”
Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), ocorreram 143 mil operações de day trade, em 2017, e em 2020, e nos três anos seguintes, o número aumentou cerca de 797%, chegando a 1 milhão de operações. Apesar do crescimento, entre 2013 e 2018, de 98 mil traders, apenas 554 persistiram com a profissão e menos de 1% conseguiu algum lucro a longo prazo. A média do lucro bruto diário entre os traders é de R$ 49 negativos e a mediana é de R$ 62 negativos, segundo o levantamento.
Os sonhos antigos e os canais do YouTube
O trader gosta de frisar que o marketing digital feito no YouTube está banalizando o mercado Forex, criticando youtubers que exibem carros de luxo, prometem uma vida de sucesso e ganhos rápidos no trade. “O mais engraçado é que eu não vejo nenhum desses (operadores) aparecerem com uma boleta ou operando e chegando a um lucro equivalente ao preço de um carro. É por isso que eu trabalho com a realidade no meu canal”. No YouTube, Marcelo mostra vídeos ganhando R$ 53 mil em 13 minutos e perdendo R$ 334 mil em 25 minutos.
“Não tem porquê ficar me gabando de tudo o que eu tenho, eu sou desse estilo e é a minha essência, quem não gosta, só sair, eu vou continuar sendo rico da mesma forma”. Ele acredita não ser um herói do mercado financeiro, por isso seus cursos deixam claro que o operador precisa estudar e trabalhar muito mais que oito horas por dia para ter sucesso como trader. “Se você quer ganhar dinheiro fácil, não quer estudar e trabalhar muito, nem seja um trader, você vai perder seu tempo e dinheiro”, alerta.
Quando começou a ganhar dinheiro, sua primeira compra foi uma casa em frente à praia, como a do Oscar Niemeyer, onde vive até hoje com a esposa. “Eu vivo bem, a única coisa que eu quero é trazer mais solução para o mercado cambial e espero que daqui 100 anos, quando eu estiver morto, os futuros operadores estudem teorias e digam: essa aqui é a Fimathe do Marcelo Ferreira.”