A instabilidade político-econômica brasileira já levou 13 empresas a cancelarem os planos para uma Oferta Pública Inicial (IPO, na sigla em inglês) na B3 apenas em 2021. Destas, sete companhias atuam no setor imobiliário, que ressurgiu em 2020 durante a pandemia e deve crescer entre 5% e 10% neste ano, segundo projeções da Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (CBIC).
As razões para a desistência, segundo as próprias empresas e especialistas do setor, passam pelos últimos acontecimentos políticos do país, tais como o recente retorno dos direitos políticos do ex-presidente Lula e as intervenções nas empresas estatais, além das dificuldades na implementação da agenda de reformas do governo.
Embora o contexto de mercado não colabore com as aspirantes à Bolsa, outros fatores também foram determinantes para as recentes desistências. De acordo com Roberto Sampaio, sócio-diretor da Empírica Real Estate, braço imobiliário da Empírica Investimentos, a precificação de ações abaixo do esperado pelas companhias – como nos casos das incorporadoras Cury, Plano & Plano e Lavvi – também impacta no apetite de outras empresas pelas ofertas.
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A possibilidade de captação de recursos na renda fixa é outro fator que colabora com a debandada das incorporadoras, segundo o especialista. “Quando você começa o processo na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a companhia precisa se transformar em uma Sociedade Anônima (S.A.), o que já possibilita a emissão de debêntures”, explica.
No caso das empresas do setor imobiliário, há ainda a possibilidade de levantar recursos via emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), que não requerem abertura de capital por parte das empresas e também podem ser negociados diretamente aos investidores.
Segundo a Anbima, o volume de negociação dos CRIs foi de R$ 14,5 bilhões em 2020. De acordo com a Associação Brasileira de Securitizadoras Imobiliárias e do Agronegócio (ABsia), houve 220 emissões de CRIs no ano passado, um aumento de 22% em relação a 2019.
Entre as desistentes, a Emccamp Residencial foi a primeira a abortar os planos de um IPO em janeiro. No mês seguinte, foi a vez da Nortis Incorporadora, EZ Incorporações e da MPR Participações. Em março, a Yuni Incorporadora, a Kallas Incorporações e a Urba Desenvolvimentos também suspenderam suas listagens em Bolsa.
Entre as principais justificativas das companhias estão as “alterações na conjuntura financeira do país e do mundo, havendo um aumento na volatilidade e na instabilidade”, explica a CEO da Urba ao mercado, Erika Matsumoto.
Na onda das desistências
Empresas em outros setores da economia também desistiram de suas ofertas neste ano. No último dia 9, por exemplo, uma das maiores plataformas de varejo de insumos agrícolas e serviços do agronegócio, a Agrogalaxy, desistiu de realizar seu IPO. A companhia justificou a suspensão devido à deterioração das condições do mercado.
A Tok&Stok foi outra empresa que cancelou sua oferta alegando não ter encontrado condições ideais no mercado, embora ainda pretenda dar continuidade aos planos de expansão e desenvolvimento de 2021, de forma independente ao processo de IPO que estava conduzindo.
“Nosso objetivo é ser uma empresa de capital aberto no médio prazo, assim que identificarmos um cenário com mais sinergia ao nosso perfil de empresa. Os recentes movimentos do mercado são muito positivos e só confirmam a atratividade e a perspectiva de crescimento do setor de móveis e decoração no Brasil” informou Octavio Pereira Lopes, CEO da Tok&Stok.
Já Eric Garmes, fundador da Paschoalotto, empresa especializada em recuperação de crédito, justifica que desistiu de abrir capital devido à pandemia do coronavírus. A companhia, segundo ele, “ainda não tem comparáveis diretos na Bolsa, então um investor education é fundamental aos acionistas, para isso eles devem conhecer fisicamente a empresa e a Covid impossibilitou essa logística.” A desistência da Paschoalotto também ocorreu em fevereiro, mas o fundador planeja retomar a oferta em 2022.
Ainda segundo Garmes, o processo não é rápido, prático ou mesmo barato. Sem informar detalhes, o empresário comenta que pagou milhões de reais para protocolar o pedido de IPO junto à autarquia.
Outras empresas que também desistiram da abertura de capital foram a Farmácia e Drogaria Nissei, abandonando a oferta em janeiro deste ano, junto da Açu Petróleo, maior terminal privado de petróleo do Brasil. A primeira desistência em fevereiro foi da Oceana Offshore, que atua na construção de embarcações para exploração de petróleo.
Simplificação das ofertas da CVM
Acompanhando o amadurecimento do mercado, a Comissão de Valores Mobiliários propôs na última semana a simplificação de algumas regras de abertura de capital.
Até o momento, para se realizar uma oferta de ações existem duas modalidades: a Instrução 400, que regula as ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários no mercado primário e secundário, exigindo uma análise da Anbima ou de um regulador; e a a Instrução 476, que também é responsável pela distribuição, mas autoriza que a empresa não passe por um órgão regulador ou à CVM.
A proposta da Comissão é unificar ambas as modalidades em um único caminho, modernizando o sistema de IPO e deixando as ofertas mais rápidas e flexíveis.
Alterações propostas pela CVM na abertura de capital
- Quiet Period – As empresas passarão de 60 para 30 dias de período de silêncio antes do protocolo da CVM
- Prospecto – Facilitará o acesso e a leitura do prospecto para os investidores, permitindo a busca facilitada de informações essenciais, além de oferecer informações sobre o risco do investimento de uma companhia
- Oferta – Os intermediários da oferta precisarão nomear os cargos dos responsáveis pela negociação. Os registros serão automáticos na CVM, porém sempre analisados pela Comissão de Valores Mobiliários ou pela Anbima
- Número de investidores – Não haverá limites no número de investidores que podem participar da oferta e não haverá restrição para nenhuma categoria de investidor
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