Thomas J. Stanley, doutor em administração de empresas pela Universidade da Geórgia, passou a maior parte de sua carreira estudando como os americanos financeiramente bem-sucedidos adquiriam riqueza. Em 1996, em parceria com William Danko, Stanley lançou um dos livros mais impactantes na área de finanças pessoais: “O milionário mora ao lado”.
Ele estava trabalhando em uma revisão do livro para lançar na comemoração de 20 anos da publicação quando foi morto por um motorista alcoolizado. Sua filha Sarah Stanley Fallaw finalizou o trabalho, que foi lançado em 2019 com o título “O novo milionário mora ao lado – estratégias duradouras para ficar rico”.
Há uma enorme diferença entre parecer e ser efetivamente rico. Thomas Stanley criou o conceito de acumulação de riqueza versus renda, separando seus pesquisados entre subacumuladores de riqueza (SARs) e prodigiosos acumuladores de riqueza (PARs), comparando quanto cada pessoa consegue guardar em relação àquilo que ganha.
Recentemente o site Medscape publicou a pesquisa “Remuneração e satisfação dos médicos brasileiros em 2020”. Segundo o documento, o número de horas semanais trabalhadas subiu de 48 para 55 e a renda média anual dos médicos pesquisados subiu de R$ 222 mil para R$ 238 mil, o que coloca a categoria, merecidamente, entre as mais bem remuneradas do Brasil.
Na mesma pesquisa, foi solicitado que os participantes estimassem seu patrimônio líquido. O patrimônio médio dos generalistas foi de R$ 203 mil e dos especialistas de R$ 538 mil. O patrimônio dos homens foi de R$ 582 mil e das mulheres R$ 303 mil. A pesquisa também fez um corte por gerações: os millennials têm um patrimônio de R$ 356 mil, a geração X tem um patrimônio de R$ 567 mil e entre os baby boomers o patrimônio médio é de R$ 709 mil.
Thomas Stanley tem uma regra para estimar o patrimônio líquido esperado que é:
Patrimônio líquido esperado = idade x renda x 0,1
Os dados divulgados pela Medscape não fazem um corte da renda em função das gerações. Supostamente os mais velhos devem ter melhor remuneração. Porém, mesmo se considerarmos que a renda dos médicos da geração boomers equivale à renda média, o patrimônio é substancialmente menor que o esperado. Supondo uma idade média de 65 anos, estima-se um patrimônio de R$ 1,5 milhão. Ou seja, os médicos acumularam muito menos que o esperado, o que os coloca na categoria dos subacumuladores de riqueza.
Essa não é uma constatação nova. Em 1992, um artigo da Medical Economics intitulado “Por que você não é tão rico quanto deveria” demonstrou que, embora o médico americano típico ganhasse dinheiro suficiente para ser realmente rico, a maioria tinha um patrimônio muito abaixo do esperado.
Mas será que esse problema é exclusivo dos médicos? Certamente não é o que as pesquisas dos Stanleys demonstram e o que eu percebo nos meus mais de 30 anos de trabalho na área de finanças pessoais no Brasil.
Em algumas profissões, as pessoas são induzidas a manter determinados padrões de consumo extremamente dispendiosos, o que afeta negativamente a acumulação de riqueza. É esperado, por exemplo, que médicos, arquitetos, dentistas, analistas financeiros, executivos de grandes empresas e juízes tenham gastos elevados com roupas, casas, carros e frequentem locais igualmente dispendiosos. Assim, o estilo de vida acaba consumindo uma parte expressiva da renda e sobra pouco para aumentar o patrimônio.
Por outro lado, em profissões de menor status social, há mais facilidade para escolher estilos de vida mais espartanos, o que facilita enormemente a conquista de ótimos patrimônios e permite uma velhice com muito mais conforto financeiro. É o caso de donos de pequenos negócios, contadores, engenheiros, programadores, executivos de pequenas empresas, por exemplo.
Por isso, tenha muito cuidado. Existe uma enorme diferença entre parecer rico e ser rico. Eu aprendi a julgar a riqueza das pessoas pela resposta à pergunta “quanto tempo mais?”. Ou seja, se a pessoa parasse de trabalhar hoje, quanto tempo poderia se sustentar com seu patrimônio e com eventuais rendas como pensões públicas, planos de previdência privada ou outras rendas garantidas?
Então, para saber quão rico você é, estime quantos anos seu patrimônio e suas rendas não advindas do trabalho podem lhe sustentar. Quando seu patrimônio puder lhe manter até alguns anos após sua expectativa de vida, você será rico. E aqui outro ponto muito importante que costuma ser negligenciado: quando olho em uma tábua de mortalidade, descubro que minha expectativa de vida vai até os 81 anos, porém é preciso olhar com muito cuidado para a expectativa de vida.
Dizer que os homens nascidos em 1961 ainda têm 21 anos de expectativa de vida significa dizer que a metade vai morrer antes dos 81 e a metade vai viver muito além dessa idade. Portanto, é bom ter uma boa margem de folga antes de pensar em se aposentar.
Falando em expectativa de vida, retomo outro ponto da pesquisa da Medscape, que é importante de ser salientado: as médicas têm um patrimônio quase 50% inferior ao dos médicos. Isso é muito preocupante, pois as mulheres têm uma expectativa de vida maior que a dos homens. Elas deveriam ter um patrimônio maior, não menor.
Então tenha muito cuidado com o estilo de vida que você leva, ele pode gerar graves problemas no futuro. Reflita muito se todos os gastos com status social realmente trazem retorno em faturamento e lembre-se: uma vida rica está muito longe de ser uma vida cara.
Jurandir Sell Macedo Jr é doutor em finanças comportamentais, professor universitário e, desde 2003, ministra na Universidade Federal de Santa Catarina a primeira disciplina de finanças pessoais do Brasil. É autor de inúmeros livros sobre educação financeira e tem pós-doutorado em psicologia cognitiva pela Université Libre de Bruxelles. Escreve sobre Finanças 50+ sempre às quintas-feiras. Instagram @jurandirsell E-mail [email protected]
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