O cancelamento dos shows e as restrições sociais advindas da pandemia levaram muitos cantores brasileiros a explorar alternativas para dar continuidade – e monetizar – seus trabalhos, abrindo as portas para que soluções como os fundos de investimentos e NFTs (Token Não-Fungíveis, em inglês) caíssem no gosto de artistas ao redor do mundo. No Brasil, cantores como Thiaguinho, Marília Mendonça e a família do sambista Bezerra da Silva estão entre os que já negociam direitos autorais em mercado.
João Caracas, CEO da Adaggio, gestora do fundo de investimentos especializada em royalties musicais, conta que o fundo da Casa possui participação em músicas de alguns artistas como Jorge & Mateus, Wesley Safadão, Molejo e Marília Mendonça. “Acabamos de assinar parte dos direitos de recebimentos do catálogo do Dinho (Mamonas Assassinas).”
“Os artistas podem utilizar o montante para ampliar sua carreira, financiar projetos pessoais, realizar uma reserva ou até outras necessidades”, diz Caracas. A companhia levantou R$ 60 milhões de investidores profissionais e pretende chegar a R$ 150 milhões em capital comprometido. O fundo está fechado para captações.
Segundo o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), organização privada responsável pela arrecadação e distribuição dos direitos autorais de execução pública, a arrecadação em 2020 foi de R$ 905,8 milhões, queda de 20% em relação ao registrado em 2019.
Para o compositor Wilson Prateado “ter essas novas oportunidades é ótimo, principalmente considerando o cenário difícil dos últimos anos no mercado musical”. Seus fonogramas estão incluídos em outro fundo, também voltado ao mercado de royalties musicais: o Conduite, administrado por sete empresários e que já levantou R$ 200 milhões, embora ainda esteja em processo de regularização com a CVM (Comissão de Valores Mobiliários). O fundo não é aberto a investidores do varejo.
Na carteira do fundo estão os direitos autorais dos cantores Thiaguinho, Prateado e Victor Hugo, que negocia no máximo 50% dos direitos autorais dos artistas.
Marcus Buaiz, um dos sócios do Conduíte, afirma que o montante arrecadado pelos artistas pode ser usado conforme acharem necessário. “Uma grande parte do nosso trabalho é justamente conversar com eles e ajudar a dar propósito para este valor, o dinheiro não é apenas o valor em si, mas tudo aquilo que pode ser feito com esse montante para criar um futuro melhor.”
Leandro Almeida, também sócio do Conduite, explica que o funcionamento é “semelhante a um fundo imobiliário, que paga rendimentos com base nos aluguéis de seus imóveis”. A diferença é que o ativo são os royalties dos artistas, e não imóveis ou títulos de crédito do mercado imobiliário.
A Hurst Capital é outra companhia que também atua no segmento. No portfólio da empresa já passaram 28 operações musicais, dentre artistas como Paulo Ricardo e Toquinho. Entre julho de 2020 até junho de 2021, o volume total de negócios foi de aproximadamente R$ 10 milhões. Hits de sucesso de sertanejos brasileiros também estão na carteira da empresa.
Segundo Arthur Farache, CEO da Hurst, a empresa distribui royalties de execução pública e de streaming. “Cada play de uma das músicas que compõem a carteira será contabilizado para o pagamento dos royalties”. O pagamento é feito por uma agregadora ou pelo Ecad e repassado para a Hurst, que coloca o montante na carteira dos investidores. A companhia estima rentabilidade anual de 15,04%.
A Hurst opera com ativos tokenizados no blockchain do ethereum. A empresa transformou os ativos das frações dos direitos autorais em tokens e os investidores receberam as cotas em uma carteira digital. “Dessa forma, eles [investidores] podem fazer operações no mercado secundário da Hurst.” Desde 12 de maio, a Hurst opera também como uma exchange de criptoativos.
A precificação das frações dos direitos autorais que geram royalties são feitas pelos próprios sócios da Hurst, Conduite e Arbor Adaggio. Os valores são definidos de acordo com uma projeção de quanto o ativo poderá gerar no futuro, levando em consideração variantes do mercado de música, bem como um acordo com o artista sobre o valor.
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Oportunidades e riscos
A professora do Mackenzie e sócia da Segura & Martins Sociedade de Advogados, Leni Segura, alerta que para saber a tributação que incide nessas operações é necessário avaliar caso a caso, o que gera uma incerteza jurídica por parte do investidor. “É importante ter especialistas que apontem os possíveis riscos do mercado e que consigam dizer se determinado fundo é registrado ou não”, recomenda.
Walter Ceneviva, advogado especializado em direitos autorais, explica que o artista pode vender qualquer tipo de direito, como de sincronização ou adaptação. “Uma das melhores opções é o de execução pública, pois gera um fluxo mensal e se torna muito atrativo”.
José Decoussau, sócio da Pinheiro Neto Advogados, explica que os artistas optam por fazer acordo com fundos porque recebem antecipadamente os valores que “eventualmente, demorariam muito tempo para receber fazendo shows, fechando contratos com gravadoras e recebendo royalties de acordo com o desempenho de suas músicas em uma plataformas de streaming.”
O especialista alerta ainda que “a performance vai depender diretamente de uma série de fatores, em especial das músicas que compõem o investimento. Se as músicas forem populares e muito executadas o retorno será significativo, mas o contrário também pode acontecer. É importante conhecer com detalhes os direitos autorais que serão objeto do investimento.”
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