A promoção de Rachmat Kaimuddin a CEO da empresa de e-commerce Bukalapak no início do ano passado foi uma surpresa para muitos, inclusive para ele mesmo. O ex-financista foi escolhido para o trabalho porque os investidores da empresa o viram como a pessoa certa para estancar os prejuízos e colocar a empresa de 11 anos no caminho da lucratividade.
Mas, apenas dois meses depois de assumir o cargo, tudo mudou. A pandemia começou a se espalhar pela Indonésia, e os mais de 2 mil funcionários da empresa procuraram seu novo chefe em busca de respostas.
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“Para a maioria dos meus colegas, a pandemia da Covid-19 é provavelmente a primeira crise real que eles tiveram que enfrentar na vida adulta”, diz Kaimuddin, que aos 42 anos se sente “grisalho” entre os jovens funcionários de tecnologia da Bukalapak. Mas ter mais “experiência de vida”, como ele diz, permite que o CEO fale com maior autoridade e dê alguma esperança aos seus colegas.
A maioria dos funcionários da Bukalapak ainda não havia nascido durante a crise financeira asiática em 1997 e era jovem demais para lembrar da crise financeira global em 2008. Kaimuddin, por outro lado, lembra vividamente o colapso do Lehman Brothers, que se desenrolou logo depois que ele recebeu um MBA da Universidade de Stanford e começou a trabalhar em uma empresa de private equity. Era uma época ruim para começar um novo emprego na área de finanças.
Hoje, porém, ele cita essa experiência e diz a seus colegas: “Já vimos esses ciclos antes … Por mais ruim que seja, desde que consigamos sobreviver, isso também vai passar”, diz Kaimuddin, referindo-se à sobrevivência tanto da empresa quanto de sua força de trabalho.
A Indonésia foi duramente atingida pela pandemia. O Ministério da Saúde registrou quase 3 milhões de casos confirmados até o momento, e recentemente o país tem relatado mais infecções diárias do que a Índia ou o Brasil.
Apesar de tudo isso, Kaimuddin parece ter colocado a Bukalapak caminhando na direção certa. O mercado online continuou operando, e as transações dispararam durante os lockdowns que exigiam que todos trabalhassem de casa, exceto uma equipe mínima de funcionários de Bukalapak. Agora a empresa está em vias de se tornar o primeiro unicórnio de tecnologia da Indonésia a ser listado na bolsa de valores do país.
A Bukalapak levantou US$ 1,5 bilhão na maior oferta pública inicial da Indonésia, de acordo com a Reuters. A companhia precificou suas ações a 850 rúpias indonésias (US$ 0,059) cada, o topo de sua faixa indicativa, dando à empresa uma avaliação de cerca de US$ 6 bilhões. As negociações na Bolsa devem começar em 6 de agosto.
“Estamos positivamente surpresos com o nível de interesse de investidores nacionais e internacionais”, disse Alvin Sariaatmadja, diretor presidente da Emtek, a maior acionista da Bukalapak, acrescentando que espera que a companhia se torne um “termômetro” para futuras vendas de ações por outras empresas de tecnologia locais.
A lista de investidores de Bukalapak também inclui o fundo soberano de Singapura GIC, o Ant Group da China, a Microsoft, o banco Standard Chartered e o portal sul-coreano Naver Corporation, entre outros.
A receita da Bukalapak saltou 25,5% no ano passado para 1,35 trilhão de rúpias (US$ 93 milhões), mas os prejuízos mostram poucos sinais de diminuir no futuro próximo. A empresa registrou um prejuízo líquido de US$ 93 milhões em 2020, que atribuiu a custos expressivos de promoções para atrair usuários para seu marketplace. E embora o prejuízo tenha diminuído 51,7% em relação a 2019, seu prospecto diz que ela pode não atingir a lucratividade no futuro próximo, já que continuará a expandir suas ofertas e ações de marketing.
Alguns analistas dizem que a avaliação da empresa parece muito alta. “A participação de mercado da Bukalapak no campo de e-commerce da Indonésia não justifica sua avaliação de IPO”, disseram os analistas da Bloomberg Intelligence Nathan Naidu e Matthew Kanterman em um relatório recente. A empresa foi o terceiro maior player depois da rival local Tokopedia e da Shopee no primeiro trimestre de 2021, com base em acessos mensais aos sites, de acordo com dados do pesquisador de mercado iPrice. No entanto, o GVM (Volume Bruto de Mercadorias, em tradução livre) da Bukalapak é de 1,5, maior do que os 0.5 da Tokopedia, apontaram os analistas em seu relatório. “O enorme apetite do investidor pelo setor de tecnologia do sudeste asiático, em meio à falta de alternativas listadas publicamente, pode justificar o preço da Bukalapak”, acrescentaram.
O IPO vai reforçar as reservas da Bukalapak enquanto a empresa luta por uma parcela maior da economia online da Indonésia, que vem crescendo rapidamente. A recém-fundida gigante da tecnologia GoTo, a Shopee e a Lazada enfrentam a Bukalapak em um mercado de e-commerce que cresceu 54% em 2020, atingindo US$ 32 bilhões em GMV, de acordo com um relatório conjunto do Google, Temasek e da consultoria Bain. O mesmo relatório também projeta que o GMV da Indonésia pode aumentar para US$ 83 bilhões em 2025.
“A guerra do e-commerce é muito intensa”, diz Sariaatmadja. Nas grandes cidades da Indonésia, a competição é impulsionada principalmente por descontos e promoções que queimam capital. Mas nas cidades menores, a execução eficiente é o diferencial.
A Bukalapak diz que agora tem 104,9 milhões de usuários registrados, 70% dos quais vêm de fora das maiores cidades do arquipélago.
A Bukalapak começou como um bazar online parecido com a Amazon em 2010, depois que o cofundador da empresa, Achmad Zaky, percebeu em uma visita à sua cidade natal que ele poderia ajudar as pequenas lojas a melhorarem seus negócios vendendo seus produtos online. O então estudante de 23 anos se juntou aos colegas Nugroho Herucahyono e Fajrin Rasyid para construir o site da Bukalapak com cerca de US$ 5 de capital.
A plataforma depois expandiu suas categorias de compras de bens físicos para produtos digitais, como pacotes de móveis, tokens de eletricidade, vouchers de jogos e serviços financeiros, incluindo fundos mútuos e investimentos em ouro.
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Em 2017, Bukalapak lançou seu negócio online para offline (O2O). A plataforma, chamada Mitra Bukalapak, permite que as lojas ofereçam produtos virtuais para clientes que não estão conectados à internet. Também ajuda os proprietários de lojas a repor seus estoques, vinculando-os a distribuidores de bens de consumo.
“Não dizemos que vamos fazer apenas O2O ou apenas e-commerce”, afirma Kaimuddin. “Queremos nos tornar uma empresa de todos os tipos de comércio.”
Kaimuddin e sua equipe costumavam visitar lojas em todo o país pessoalmente para entender suas necessidades. Quando a pandemia começou, eles passaram a fazer esses encontros de forma online e rapidamente produziram vídeos em vários dialetos locais para ensinar os lojistas como conduzir os negócios com segurança.
Zaky não foi apenas um cofundador, mas também o CEO durante a primeira década de existência da Bukalapak. Ele era visto por muitos como um dos empresários de maior sucesso da Indonésia por conduzir a companhia de seu início humilde até ela se tornar uma das maiores empresas de e-commerce do país.
Mas anos priorizando um crescimento rápido resultaram em anos de prejuízos. A empresa demitiu cerca de 10% de sua força de trabalho em 2019 como parte de sua estratégia para melhorar a eficiência.
Mais cedo naquele ano, Zaky fez comentários críticos aos esforços do presidente Joko Widodo para desenvolver o setor de tecnologia do país, o que desencadeou um movimento online de boicote à Bukalapak. A polêmica só foi contornada depois que o mandatário pediu ao público que não desinstalasse o aplicativo.
Zaky contribuiu na escolha de Kaimuddin para seu substituto em 2020. Alguns meses após ele deixar o cargo de CEO, os cofundadores Herucahyono e Rasyid também saíram da gestão da empresa. Após o IPO, a participação de 4,3% de Zaky na Bukalapak valerá cerca de US$ 260 milhões. Ele continua a atuar como consultor da companhia e é cofundador da empresa de investimento Init 6.
“É difícil estar à altura”, admite Kaimuddin. Afinal, a Bukalapak foi uma das pioneiras do setor de tecnologia da Indonésia.
Kaimuddin atuou mais recentemente como diretor de finanças e planejamento do banco Bukopin. Ele começou sua carreira como associado sênior no Boston Consulting Group e ocupou vários cargos em firmas de investimento. Kaimuddin obteve seu diploma de bacharel em engenharia pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), e diz ter um interesse especial nos produtos fintech que ajudam a expandir a inclusão financeira da Indonésia.
A Bukalapak fechou uma parceria no ano passado com o Bank Mandiri, a maior instituição financeira do país, e lançou um programa para transformar quiosques de comércio familiares em agentes bancários. A colaboração permite que os clientes transfiram dinheiro nos estabelecimentos.
Por enquanto, a estratégia da companhia é continuar sua transformação para se tornar uma plataforma comercial versátil. Para isso, tem feito parcerias com empresas que podem oferecer serviços complementares, como transações financeiras ou logística. “Queremos permanecer leves e ágeis, e nos mover muito, muito rapidamente, mas utilizar nosso ecossistema para fornecer todos esses serviços”, diz o CEO.
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