Dependendo da pessoa a quem você perguntar, Charles Koch é um titã da indústria, um bicho-papão político do dinheiro não declarado ou o Marco Aurélio do movimento libertário. No entanto, Koch poderá ser conhecido em breve como o bilionário que persuadiu os republicanos e democratas resistentes a legalizar a cannabis no nível federal.
E não porque ele seja maconheiro.
Segundo o CEO da Koch Industries, de 85 anos, a única vez que ele consumiu maconha foi por acidente, na década de 1980. Ele estava praticando esqui de helicóptero na Colúmbia Britânica e, depois do esporte, tomou umas gim-tônicas no jantar com os amigos. De sobremesa, o chef trouxe um prato de brownies. Koch comeu um e depois de um tempo se sentiu meio “doidão”. Ele não sabe quem colocou maconha nos doces, mas diz que conhece muitos amigos bem-sucedidos – médicos, advogados e outros profissionais – que já usaram a erva.
Embora Koch não goste de consumi-la, ele agora está indo a público com uma antiga convicção: a cannabis deve ser legalizada no país todo. Assim, ele está colocando seu nome e quase US$ 25 milhões de sua fortuna de US$ 45 bilhões em iniciativas de reforma da justiça criminal e de legalização.
“Deveria ser uma escolha da pessoa”, diz Koch em seu escritório no amplo complexo da Koch Industries, todo revestido de granito, em Wichita, Kansas. “[A proibição] é contraproducente. Arruína a vida das pessoas, cria conflito na sociedade e vai contra o progresso. A coisa toda nunca fez sentido para mim.”
Em abril, o Americans For Prosperity, grupo de ativismo político de Koch, juntou-se a outras organizações para formar a Cannabis Freedom Alliance, cujos membros já começaram a fazer lobby no Congresso para ajudar a revogar a proibição federal da maconha nos Estados Unidos. Sentado à sua mesa em frente a uma pintura a óleo de seu falecido pai, Fred, que fundou a Koch Industries como uma empresa de petróleo e refinaria em 1940, Koch está finalmente pronto para explicar por que está lutando pela legalização.
Libertário convicto, ele vê a proibição da maconha como uma violação básica da liberdade individual e também como uma política pública destrutiva que aumenta o problema norte-americano do encarceramento em massa. Os EUA deveriam ter aprendido com o “pesadelo” da Lei Seca um século atrás, diz ele.
Koch não está sozinho em sua opinião. Quase 70% dos norte-americanos acreditam hoje que a cannabis deveria ser legal em nível federal. Atualmente, 18 estados permitem o uso adulto e 37 legalizaram a maconha medicinal, criando um setor que gerou mais de US$ 17,5 bilhões em vendas legais no ano passado – número que deve subir para US$ 100 bilhões até 2030.
Porém, não está claro se o tão aguardado projeto de legalização federal, que os senadores Chuck Schumer, Cory Booker e Ron Wyden apresentaram em julho, terá os 10 senadores republicanos e todos os 50 senadores democratas necessários para ser aprovado. Schumer admite de imediato que ainda não tem os números e que o presidente Biden não apoia a legalização. Para os políticos de ambos os lados que ainda se opõem à cannabis, Koch tem duas perguntas: “Se você não gosta de maconha ou não gosta que as pessoas a usem e existem todas essas leis, acha que isso está funcionando?”, ele pergunta, antes de apresentar seu segundo argumento. “Pelo que sei, a maconha vicia menos do que o álcool. Então, por que o álcool é legal e a maconha não?”
Koch admite que não está na linha de frente da luta pela legalização: Brian Hooks, Mark Holden – CEO da Stand Together de Koch e ex-consultor jurídico da Koch Industries – e outras pessoas estão fazendo o trabalho prático.
“Eu trabalho no departamento de filosofia”, diz Koch. E sua filosofia é simples: a proibição cria mais problemas para um país com uma população carcerária que saltou para mais de 2 milhões.
“A criminalização [da cannabis] tem enormes consequências negativas, não só para quem fica enredado nesse sistema, mas também para a sociedade”, diz ele. “Queremos uma sociedade que permita que as pessoas a realizem seu potencial e deem sua contribuição, mas, com essas leis, você exclui milhões de pessoas.”
Koch e a rede Koch arrecadaram e gastaram bilhões de dólares nas últimas décadas, sendo que um terço foi para políticas públicas de centro-direita. Em seu livro mais recente, “Believe in People: Bottom-Up Solutions for a Top-Down World” (“Acredite nas Pessoas: Soluções de Baixo para Cima para um Mundo de Cima para Baixo”, em tradução livre), Koch admite que lamenta ter atiçado o partidarismo. “Nós pisamos muito na bola. Que bagunça!”, ele escreveu. Agora, quando se trata de acabar com a guerra contra as drogas, ele diz estar pronto para trabalhar em parceria com qualquer pessoa.
Em 2015, por exemplo, Koch lançou mão de sua força política para ajudar Weldon Angelos, um homem de Utah que estava cumprindo uma sentença de 55 anos por ter vendido cerca de US$ 1 mil de maconha a um informante no começo da década de 2000. (Em seu parecer sobre o caso, o juiz de Angelos qualificou a sentença mínima obrigatória de “injusta, cruel e até irracional”.) Koch disse a Holden para lançar uma campanha em prol da reforma da justiça criminal e trabalhar com o presidente Barack Obama para batalhar pela libertação antecipada de Angelos.
Foi na prisão em Mendota, Califórnia, que Angelos se lembra de ter ouvido pela primeira vez que Koch o estava apoiando em seu processo. “Eu não sabia quem eram os Koch”, ele conta. “Estava andando com alguém, e a pessoa disse: ‘Os Koch? Você sabe quem é Charles Koch? Se ele está te ajudando, você está fora daqui… Você vai ver, ele tem influência’.”
Em 2016, Angelos recebeu inesperadamente uma redução da pena após cumprir 13 anos. (E, em 2020, o presidente Trump concedeu a ele um indulto pleno.) No verão passado, Angelos procurou Koch para ver se ele queria trabalhar em conjunto no apoio à legalização da maconha, e a Cannabis Freedom Alliance nasceu.
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Em um país onde o hiperpartidarismo define o panorama político, um influenciador ideológico como Koch pode ser a solução para que a legalização seja aprovada.
Agora que Koch se revelou pró-cannabis, isso deu abertura para outras pessoas que vinham mantendo suas opiniões sobre a legalização como assunto de foro íntimo, diz Randal Meyer, um lobista e membro da Cannabis Freedom Alliance. Saber que Koch está envolvido deixa as pessoas “bastante à vontade”, diz ele.
Brian Hooks, da Stand Together, explica que a estratégia deles depende de apoio dentro e fora dos corredores da política. Ela inclui uma forte ênfase no ativismo de base, no lobby e na criação de coalizões amplas, sem mencionar mídia e publicidade.
Em junho, a Amazon anunciou que fará lobby em apoio à legalização da maconha e, considerando-se que outras empresas, entre as quais a Altria, a Brink’s e a Molson Coors, criaram um think tank para propor uma política federal, de repente parece que a legalização da maconha não é mais uma causa neo-hippie defendida por entidades como a NORML (Organização Nacional pela Reforma das Leis da Maconha).
“Durante muito tempo, as políticas referentes às drogas foram caracterizadas erroneamente como algo periférico”, comenta Hooks. “Na verdade, a maioria dos norte-americanos reconhece há muito tempo que o sistema está errado.”
Valerie Jarrett, que foi conselheira sênior do presidente Obama, trabalhou com Holden em uma legislação destinada a reduzir a sentença mínima obrigatória para infratores não violentos de leis antidrogas. A legislação conquistou o apoio de 80 senadores, mas Mitch McConnell, que na época era o líder da maioria no Senado, impediu que ela fosse a plenário em 2016. Dois anos depois, no governo Trump, a Lei do Primeiro Passo (First Step Act) foi aprovada. Jarrett diz que a reforma da justiça criminal não teria sido aprovada sem o apoio de Koch. “…É assim que as coisas são feitas em Washington – isso pode significar que você faz parcerias estranhas”, diz ela.
Mais do que qualquer coisa, Koch vê a legalização da maconha como o começo do fim da guerra federal contra as drogas. Aqui, o rei-filósofo moderno recorre a um economista francês do século 19 em busca de sabedoria. “Para que uma lei seja respeitada”, diz Koch, parafraseando Frédéric Bastiat, “ela deve ser respeitável”.
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