O valor pago pelo governo em transferência direta de renda em 2022 será de R$ 400, afirmou uma fonte com conhecimento direto do assunto, sendo parte composta pelo orçamento do Bolsa Família e parte por um auxílio temporário que, por não ser estruturado como despesa continuada, não precisará de definição de fonte de receita.
Segundo a mesma fonte, o “Bolsa Família” será rebatizado de “Auxílio Brasil”, como planejava o governo, e manterá seu orçamento de R$ 34,7 bilhões previsto para o ano que vem. A ideia é que o programa alcance 17 milhões de famílias, ante 14 milhões atualmente.
Mas, para robustecer o valor pago aos beneficiários, um auxílio temporário será criado, ao custo de cerca de R$ 50 bilhões. Parte do auxílio será pago dentro do teto de gastos e parte fora. Por ter duração delimitada, esse gasto não precisa, pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de compensação.
Com esse desenho, o governo não precisará mais da tributação dos dividendos, proposta na reforma do Imposto de Renda, para viabilizar um benefício social maior no ano que vem.
A nova formatação do auxílio representa uma vitória da ala política frente aos esforços do time do ministro da Economia, Paulo Guedes, de limitar o benefício a R$ 300 em 2022 e colocá-lo inteiramente sob o teto.
Na tarde da véspera, uma fonte do Ministério da Economia já havia sinalizado à Reuters que as discussões caminhavam para adoção da fórmula do Bolsa Família com um auxílio para 2022, mas com a indicação de R$ 300 como valor total.
Também na noite de ontem (18), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), indicou, em entrevista ao site da revista Veja, um programa social fora do teto de gastos públicos, ao defender que não se podia priorizar a responsabilidade fiscal e o respeito ao mecanismo em detrimento das necessidades da população mais vulnerável.
Como o Bolsa Família consiste em uma despesa de caráter permanente, para torná-lo maior pela ideia originalmente aventada pela equipe econômica o governo precisaria indicar essa compensação para seu financiamento –o que seria feito pela tributação de dividendos na reforma do IR–, além de encontrar espaço, sob a regra do teto, para acomodá-lo, o que viria com a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos Precatórios.
A avaliação é que a reforma do IR não deverá, contudo, ser apreciada pelo Senado como desejava Guedes.
Ao fim, o valor de R$ 400, ainda que temporário, também vai ao encontro de indicação feita por Bolsonaro no início de agosto de que o governo estudava uma forma de promover um aumento de até 100% no Bolsa Família, que atualmente paga um benefício médio de cerca de R$ 190.
Para além de atender os mais vulneráveis que ficaram ainda mais expostos à pobreza diante da pandemia de Covid-19 e da forte aceleração da inflação no país, o aumento do programa é visto como crucial, do ponto de vista político, para fortalecer Bolsonaro na corrida presidencial de 2022.
Embora represente uma saída para não haver burla à LRF, a implementação de um auxílio temporário deixa para 2023 –e para o vencedor das eleições– o real equacionamento da questão, já que, afora o benefício extra, o Bolsa Família não terá tido seu orçamento estruturalmente modificado a despeito da realidade deixada pela crise, com 14 milhões de brasileiros desempregados.
TETO DE GASTOS
Tanto no ano passado quanto neste ano os quase R$ 360 bilhões direcionados, no total, para auxílio emergencial ficaram fora do teto de gastos, sob a justificativa que estavam diretamente ligados à necessidade de enfrentamento da crise de coronavírus –um evento reconhecidamente extraordinário.
Técnicos da equipe econômica vinham martelando que o auxílio fora do teto fora concebido num quadro de restrição de mobilidade e em meio a indicadores alarmantes da pandemia. Tudo isso já teria mudado, especialmente com o avanço recente na vacinação no país.
O secretário do Tesouro, Jeferson Bittencourt, chegou a dizer que as condições para edição de crédito extraordinário –alternativa que deixava os gastos com o auxílio fora do teto– eram urgência, relevância e imprevisibilidade, e que as três precisavam ser atendidas.
“Em síntese, desemprego e pobreza é urgente e é relevante que enfrentemos? Sim, é urgente, é relevante”, disse ele. “É imprevisível? Não”, completou o secretário, numa sinalização de que não haveria respaldo técnico para a renovação do expediente.
Procurado, o Ministério da Economia não comentou o assunto imediatamente. (Com Reuters)