A alta de juros promovida pelo Banco Central na noite de ontem (03) provavelmente encerrou um dos mais agressivos e longos ciclos de aperto da autoridade monetária, segundo departamentos econômicos de alguns bancos, enquanto o mercado espera alívio nas próximas leituras de inflação.
De forma geral, analistas viram alguns sinais no comunicado do Copom indicando intenção de pausar o ciclo: a nova referência para o horizonte relevante para a política monetária –inflação projetada em 12 meses até o primeiro trimestre de 2024– e a indicação de, em caso de nova alta, uma magnitude de 0,25 ponto como opção. A própria extensão do ciclo e seus potenciais efeitos sobre atividade também pesam em favor da tese da pausa.
“Sempre podemos ter informações diferentes na ata, mas a mensagem para nós é muito clara. O Banco Central do Brasil foi o primeiro a subir (entre importantes BCs) e provavelmente será o primeiro a parar esse processo de alta”, disseram em relatório economistas do UBS BB, chefiados por Alexandre de Ázara.
O BC elevou a meta Selic em 0,50 ponto percentual na quarta-feira, para 13,75% ao ano, conforme esperado. A alta foi a décima segunda consecutiva e levou o juro ao maior patamar desde janeiro de 2017.
No comunicado, o colegiado do BC afirmou que “avaliará a necessidade de um ajuste residual, de menor magnitude”, em setembro e explicou a ênfase à inflação acumulada em 12 meses no primeiro trimestre de 2024 por suavizar efeitos diretos das mudanças tributárias recentes —que preveem cortes temporários de alguns impostos neste ano, mas nova alta em 2023.
“A informação mais importante foi a mudança inesperada no horizonte relevante da política monetária”, disse em relatório o economista-chefe do Citi, Leonardo Porto, que vê a medida como “dovish” –inclinado a parar o ciclo de alta de juros.
“Essa nova estratégia, aliada às prováveis leituras de deflação em julho e agosto (com potencial repercussão favorável nas expectativas de inflação) nos levam a manter nossa visão de que o Copom deverá interromper o atual ciclo de aperto na reunião de setembro, mantendo a taxa Selic em 13,75%”, completou.
Em relatório intitulado “O(s) Último(s) Capítulo(s)”, o superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander Brasil, Mauricio Oreng, avaliou que o BCB “aparentemente” decidiu não reagir tão intensamente a riscos inflacionários adicionais vindos de uma nova rodada de estímulo fiscal, sinais de um mercado de trabalho em provável superaquecimento e maiores expectativas de inflação.
“Isso pode refletir a crença do BCB de que o que acabou sendo um dos ciclos de aperto mais intensos e rápidos nas últimas décadas poderia sugerir que uma dose suficiente de medicamento foi administrada, sem a necessidade de prescrever uma dosagem mais forte nesta fase”, afirmou.
Até antes da decisão do Copom na véspera o Santander projetava novo acréscimo de 0,50 ponto no juro em setembro, que, agora, Oreng vê como “carta fora do baralho”. Para manter “coerência” com o próprio cenário, o banco segue estimando uma alta adicional, mas agora menor, de 0,25 ponto, o que levaria a Selic a 14,00%.
“Mas os sinais recentes de uma tentativa de acomodação nas expectativas de inflação, provavelmente refletindo altos e baixos nos números de inflação de curto prazo (temporariamente sob a influência de cortes de impostos em preços voláteis), são possíveis indicadores de uma pausa que provavelmente acontecerá na reunião de política monetária do próximo mês”, ponderou.
Em relatório divulgado nesta manhã, o Bradesco também disse prever que a 13,75% a Selic já está em seu nível terminal, mesmo cenário do Bank of America.
“A desaceleração do crescimento global e os efeitos defasados da intensa política monetária sustentam a visão de que há espaço para encerrar o ciclo de aperto agora, disse David Beker, chefe de economia e estratégia do BofA para Brasil.
Corte de juros?
Beker estima corte da Selic ao longo de 2023, para 10,50%. Ázara, do UBS BB, manteve após a decisão do Copom cenário em que o BC engata quatro cortes de 1 ponto percentual cada e um de 0,50 ponto durante o próximo ano, conduzindo a Selic para 9,25%.
A taxa seguiria em queda em 2024, com três cortes seguidos de 0,50 ponto cada derrubando o juro básico para 7,75%, em que finalizaria aquele ano.
Ázara calcula que a interpolação trimestral das metas de inflação do fim de 2023 (3,25%) e fim de 2024 (3,0%) resulta em uma meta de 3,19% para o primeiro trimestre de 2024.
“Mas como eles (Copom) mencionaram uma estratégia ‘em torno da meta’, nos parece claro que eles têm como meta 3,4%-3,5% para esse trimestre. Este desvio corrobora a flexibilização a partir de meados de 2023”, disse o economista do UBS BB.
Segundo dados mais recentes do relatório Focus do BC, que compila projeções do mercado, a mediana das expectativas de analistas é que o BC comece a cortar os juros em junho do ano que vem, quando a Selic iria de 13,75% para 13,50%. O movimento seria seguido por mais quatro reduções, levando a taxa a 11% até o fim do ano. Os dados abarcam projeções feitas até a sexta-feira anterior ao Copom.
A curva de juros na B3 embutia chances de alívio monetário já em fevereiro de 2023, com probabilidade maior de corte de juro em março.