A mensagem do chair do Federal Reserve, Jerome Powell, sobre inflação e taxa de juros na conferência de bancos centrais de Jackson Hole deste ano terá um tom totalmente diferente do que ele usou no mesmo evento há apenas um ano.
Naquela época, Powell usou uma série de gráficos para justificar sua expectativa de que as pressões de preços diminuíssem e acreditava que um país ainda afetado pela pandemia e com falta de empregos precisava de apoio contínuo do banco central dos Estados Unidos.
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Avançando para esta semana, e enquanto o majestoso cenário montanhoso de Jackson Hole permanece o mesmo, o panorama econômico mudou: o Fed, liderado por Powell, está lutando contra a inflação elevada com o conjunto mais acentuado de aumentos dos de juros em 40 anos.
Powell fará seu discurso na conferência às 11h (horário de Brasília) de amanhã (26).
Aqui está um passeio pelos dados que serviram de base para a tese de Powell há um ano e como as coisas evoluíram desde então.
Mercados de trabalho
O que Powell via um ano atrás: os empregadores dos EUA estavam criando 832 mil vagas por mês, mas o mercado de trabalho ainda tinha “um terreno aberto considerável” para atingir a meta do Fed de pleno emprego. A taxa de desemprego, em 5,4%, era “alta demais” e, mesmo assim, subestimava a capacidade ociosa no mercado de trabalho. “Também esperamos ver uma forte criação contínua de empregos”, disse ele na época.
Como acabou sendo: os empregadores dos EUA contratavam em um ritmo mais moderado do que os dados mostravam na época, mas a forte criação de empregos continuou, provavelmente mais do que Powell esperava.
A lacuna em relação ao nível consistente com o pleno emprego se fechou rapidamente, em parte porque o aumento dos casos de Covid-19 não diminuiu os gastos tanto quanto o previsto, e os trabalhadores marginalizados pela pandemia não voltaram com pressa ao mercado de trabalho.
A taxa de desemprego é agora de 3,5%, numa mínima de 50 anos. Mas mesmo esse número talvez subestime o aperto no mercado de trabalho. Enquanto a maioria dos membros do Fed estima o pleno emprego em ambiente de taxa de cerca de 4,5%, “meu próprio instinto é de que a taxa natural de desemprego é mais alta”, disse Powell no mês passado.
Inflação: confinada?
O que Powell via há um ano: a inflação parecia estar confinada a “um grupo relativamente estreito de bens e serviços” afetado pela pandemia e pela reabertura da economia, mas medidas amplas das pressões de preços pareciam moderadas. “Estaríamos preocupados com os sinais de que as pressões inflacionárias estão se espalhando mais amplamente pela economia”, disse ele.
Como acabou sendo: elas se espalharam. A taxa de inflação média dos gastos de consumo pessoal do Fed de Dallas, uma medida que Powell citou no discurso do ano passado, está entre vários indicadores de inflação que dispararam à medida que as pressões sobre os preços se espalharam de coisas como carros usados e equipamentos de ginástica para uma ampla gama de bens de consumo e serviços.
Inflação: preços que mais aumentam já caindo
O que Powell via um ano atrás: os preços estavam moderando em itens de alta inflação, como carros usados. “Parece improvável que a inflação de duráveis continue a contribuir de forma importante ao longo do tempo para a inflação geral”, disse ele. “Os dados recebidos devem fornecer mais evidências de que alguns dos desequilíbrios entre oferta e demanda estão melhorando.”
Como acabou sendo: a inflação na categoria de bens duráveis só recuou recentemente, tendo atingido o pico mais tarde do que o previsto, em parte devido a problemas persistentes na cadeia de suprimentos.
Enquanto isso, a inflação de serviços está contribuindo cada vez mais para as pressões gerais sobre os preços, à medida que as pessoas deixam de comprar bens para gastar mais em viagens e refeições.
Salários: Não há muito para se ver aqui
O que Powell via um ano atrás: dados sugeriam um crescimento salarial “moderado” e “pouca evidência de aumentos salariais que possam ameaçar uma inflação excessiva”, disse ele.
Como acabou sendo: os salários aumentaram acentuadamente, com as medidas amplas de crescimento salarial que Powell prometeu monitorar cuidadosamente saltando de apenas um pouco acima da meta de inflação de 2% do Fed para mais de 5%. Isso ainda está abaixo da inflação geral, mas o banco central pode estar menos otimista agora do que antes sobre a possibilidade de uma espiral de preços no estilo dos anos 1970.
Expectativas de inflação: contidas?
O que Powell via então: famílias e empresas pareciam concordar com sua própria visão de que a inflação seria transitória – não se esperava que a inflação em cinco ou dez anos fosse muito maior do que a meta de 2% do Fed. Isso significava que o banco central poderia “observar” com segurança a inflação de curto prazo sem se preocupar com a possibilidade de ela se tornar incorporada à psique norte-americana.
Como acabou sendo: as expectativas de inflação de longo prazo aumentaram, e essa foi uma das razões pelas quais o Fed ficou mais agressivo em junho com o primeiro de dois aumentos desproporcionais de 75 pontos-base na taxa de juros.
Inflação global: benigna?
O que Powell via um ano atrás: a tecnologia, a globalização, o envelhecimento da população e a determinação dos bancos centrais de não deixar a inflação sair do controle mantiveram por décadas a inflação global baixa, e havia poucas razões para pensar que essas tendências subjacentes “se inverteram ou diminuíram repentinamente”, disse ele. Powell mostrou um gráfico demonstrando inflação baixa na maioria das economias avançadas.
Como acabou sendo: o cenário mudou.
E na sala de conferências onde Powell falará na sexta-feira, os banqueiros centrais globais que foram responsáveis por manter as pressões de preços sob controle no ano passado estarão observando cada linha em seus gráficos.