“O apartamento é maravilhoso, mas vai ser complicado para vender”. Lembro bem de ouvir essa frase algumas vezes durante a adolescência, na década de 90, acompanhando o trabalho de Gisela, minha mãe, corretora de imóveis de alto padrão em São Paulo. Ela se referia às coberturas, sobretudo nos Jardins.
No Rio de Janeiro, morar no último andar de um prédio nas avenidas Vieira Solto, Delfim Moreira ou Epitácio Pessoa sempre foi garantia de vista privilegiada do mar ou da Lagoa Rodrigo de Freitas e de ter uma piscina privativa em uma cidade com sol e calor em praticamente o ano inteiro. Diferentemente da capital fluminense, em São Paulo as coberturas eram vistas como certeza de infiltrações de água e custos mais elevados com manutenção e condomínio.
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Essa realidade agora é outra com a modernização dos serviços de condomínios e a evolução dos processos construtivos que resolveram questões que davam dor de cabeça para os proprietários de coberturas.
Mas parece que o jogo virou. Na realidade, vem virando nos últimos anos. Hoje as coberturas de alto padrão da cidade de São Paulo, dependendo do bairro, da planta e do edifício, têm um valor de metro quadrado maior que os apartamentos-tipo do mesmo condomínio. Uma cobertura na Vila Nova Conceição, com vista para o parque do Ibirapuera, por exemplo, tem uma demanda maior por compradores do que unidades à venda. E isso ocorre por mudanças na forma de morar das pessoas e em como é pensado este tipo de imóvel e até mesmo como reflexo da pandemia.
Do final da década de 90 até meados de 2012, aproximadamente, o mercado imobiliário de São Paulo viu o maior número de lançamentos de apartamentos desde a época do milagre econômico dos anos 60 e início dos 70. Bairros onde predominavam casas – Perdizes, Moema, Vila Nova Conceição, Alto de Pinheiros, Vila Olímpia e mesmo Vila Mariana e Paraíso – foram tomados por prédios.
O adensamento cada vez maior trouxe mais pessoas para essas regiões, tornando os bairros mais vivos, com maior oferta de serviços e opções para trabalho e lazer. E provocou um novo olhar para as coberturas, que passaram a ser vistas como uma boa opção por quem estava trocando uma casa grande e confortável por um apartamento. Além disso, as inaugurações do Parque Villa Lobos, em 1994, e do Parque do Povo, em 2008, ampliaram as opções de landscape antes concentradas no Ibirapuera.
As coberturas haviam caído no gosto de quem mora em São Paulo. Mas faltava o mercado acompanhar esta mudança de comportamento.
No final dos anos 2000 começaram a chegar a São Paulo, em volume maior, as penthouses. Comuns em Nova York desde os anos 20 do século passado, havia uma ou outra por aqui, com uma planta especialmente pensada para o prédio, considerando a vista, a posição do sol e as características do bairro e dos potenciais moradores.
Área grande a céu aberto, piscina, elevador privativo para acessar o topo saindo do andar de baixo, privacidade, design de luxo e amplo espaço para circulação são características deste modelo de imóvel. Ou seja: quem busca uma penthouse quer um imóvel único, e não uma planta em dobro. Hoje há boa oferta de coberturas deste tipo em São Paulo, com valores que vão de R$ 2 milhões até lançamentos que chegam a R$ 45 milhões ou imóveis prontos de até R$ 65 milhões.
O ticket médio desses imóveis aumentou de R$ 3,5 milhões em 2019 para R$ 7 milhões em 2022. Resumindo: área útil maior, privacidade, luminosidade e vista livre cujo firmamento pode ser apreciado sem barreiras para os olhos. Um local mais perto do céu, exclusivo, só seu.
Marcelo Alcântara é formado em administração de empresas. Sócio-diretor da Esquema Imóveis, marca da imobiliária de alto padrão de São Paulo, e sócio fundador da Innova Gestão de Propriedades.
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