Tokenização de tudo é a nova tendência do mercado financeiro ligado a ativos digitais. A possibilidade de digitalizar um ativo real de modo a poder negociá-lo vem sendo explorada nas mais variadas áreas.
Atualmente é possível encontrar tokens de obras de arte, de imóveis, de participações financeiras, de ações de empresas. Os especialistas consultados pela Forbes acreditam na literalidade da “tokenização de tudo”. Alguns números ajudam a reforçar essa ideia.
Um estudo da consultoria Boston Consulting Group (BCG) em parceria com a ADDX indica que o mercado de tokenização de ativos poderá chegar a US$ 16 trilhões até 2030, ou 10% do PIB global de hoje. Neste ano, o valor de mercado dos security tokens (ativos mobiliários que geram renda por meio da distribuição de lucros ou dividendos) deve chegar a US$ 310 bilhões. “A tokenização de ativos permite reimaginar o processo de encontrar e combinar investidores com oportunidades”, diz o relatório.
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As possibilidades são inúmeras. Por meio da tokenização é possível investir em setores e negócios até agora inacessíveis às pessoas físicas. Por exemplo, o clube de futebol do coração, uma startup alinhada com suas ideias ou até mesmo no show daquela banda que nunca chega na sua cidade.
Isso é possível porque os tokens são contratos inteligentes. A melhor maneira de descrever é pensar em uma moeda cujo funcionamento pode ser regulado. Se um clube de futebol cria tokens para captação financeira, os torcedores podem investir no seu time do coração e receber parte dos lucros da temporada, desde que a distribuição esteja presente no contrato inteligente. Outra vantagem é que é possível negociar parcelas muito pequenas dos ativos, democratizando seu acesso.
“Acredito muito nessa forma de arrecadação financeira, principalmente se você tem uma contrapartida para oferecer de volta. Os tokens permitem uma participação maior da sociedade, facilitando o acesso a empreendimentos e projetos que não seria possível de outra forma”, diz Sylmara Multini, CEO da IDG, empresa que cria NFTs colecionáveis.
Benefícios
Em seu relatório, a Boston Consulting Group (BCG) e a ADDX citam cinco benefícios da tokenização. São eles:
1. Criação de ecossistemas próprios: os provedores de tokens garantem que a integração da tecnologia seja feita sem problemas, com um grande ecossistema para que os emissores possam criar uma solução sob medida de ponta a ponta.
2. Flexibilidade, com registro do ativo e configuração do token: Os provedores de serviços permitem que os emissores configurem seus tokens de forma simples e intuitiva, independentemente do tipo de ativo.
3. Regras do contrato inteligente: as regras de conformidade dos tokens são codificadas no contrato inteligente, permitindo um processamento mais rápido e taxas mais baixas. Há flexibilidade para os emissores definirem regras como quem pode deter o token, quantos ativos serão disponibilizados e outras formas de negociações posteriores, como transferências.
4. Armazenagem, gestão e distribuição fácil dos tokens: Os provedores de serviços de tokenização oferecem aos emissores uma maneira automatizada e transparente de gerenciar a distribuição de tokens, bem como futuros eventos de distribuição.
5. Baratear transações, contratos e atos societários: a tokenização permite ao emissor criar ações corporativas onde já estão determinados os direitos e agendadas as comunicações e a distribuição de proventos, tudo isso com um custo muito menor.
Um dos problemas é que o setor só agora passou a contar com alguma segurança jurídica, com a aprovação de um marco legal para os criptoativos no dia 29 de novembro, mas que ainda não entrou em vigor.
No entanto, isso vale apenas para os tokens que serão considerados ativos financeiros. Os demais ainda não possuem regulamentação nem segurança jurídica. “Um pouco de regulamentação é sempre bom para ter segurança e credibilidade, mas não ter essa regulamentação hoje não tira o mérito dessa forma de investimento. É importante pensar em soluções, mas sem engessar as operações”, diz Multini, da IDG.
Diversificação dos tokens
A insegurança jurídica da falta de regulamentação e volatilidade do mercado de criptomoedas (ao qual os tokens são muito associados) fez com que o empreendedor Ricardo Wendel adotasse um caminho alternativo para ingressar no mundo dos tokens.
Para poder operar seguindo um marco legal, ele se apoiou na Instrução 88 da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que trata das operações de crowdfunding (financiamento coletivo), e criou o DIVI-Hub, uma plataforma de tokenização regulamentada.
Na prática, o DIVI-Hub cria security tokens dentro de uma plataforma da AWS (Amazon Web Services) e não no ambiente blockchain das criptomoedas. Os “divis”, como são chamados os tokens da plataforma, são frações de participações nos projetos que fazem captação com o Divi-Hub. Eles dão direitos aos investidores, seja de acesso aos lucros do projeto ou da empresa, ou a benefícios específicos, sempre acertados nos contratos inteligentes.
“Tokens não são necessariamente criptomoedas ou produtos de blockchain. Nossos divis são tokens, também possuem número único de rastreio, são automatizados, mas não estão no ambiente descentralizado. Melhor do que isso, é uma tecnologia que obedece ao que determina o regulador”, diz Wendel.
Lançado em outubro do ano passado, o Divi-Hub tem 16 mil investidores cadastrados. Neste ano, a plataforma lançou dois projetos que captaram R$ 1 milhão: o Love Cabaret e a Favela Brasil Xpress. O primeiro foi para viabilizar a volta de uma famosa casa noturna paulistana. O segundo foi para a expansão da startup que atua nas comunidades de São Paulo.
“Os projetos de tokens na maioria das vezes são de startups e empresas novatas precisam muito de investimentos. Venture Capital é a primeira tentativa de captação, mas são restritos e o crowdfunding é mais democrático, permite que o pequeno investidor participe e ajude um projeto que ele acredita”, diz Wendel.
Enquanto o DIVI-Hub trabalha com security tokens fora do blockchain, o IDG cria NFTs dentro da Web3. A empresa fica sediada nos Estados Unidos e também opera com crowdfunding para viabilizar seus projetos.
Multini diz que as pessoas ainda estão céticas em relação aos ativos digitais, mas que isso deve melhorar nos próximos anos. “Barreiras e dúvidas sempre existem no início. O e-mail já foi questionado. No início ninguém acreditava no WhatsApp. E o Docusign? Averbação de documento online? Isso já foi uma exceção, agora é padrão”, diz a CEO do IDG. “Tudo passou por uma evolução e assimilação na cabeça das pessoas. É uma desconfiança que faz parte, mas não muda o fato de a Web3, os ativos digitais e o blockchain serem o futuro.”
O IDG cria tokens colecionáveis divididos em quatro categorias: originais, especiais, raros e lendários. As duas últimas categorias agregam experiências à compra pelo colecionador. No Carnaval deste ano, a IDG criou NFTs para a escola Grande Rio. O token lendário concedeu ao comprador conhecer participantes do desfile e receber uma das bandeiras do carro alegórico.