A Binance, a maior exchange de criptomoedas do mundo, está lutando para manter seus ativos. Após o colapso da rival FTX, vários investidores resgataram suas criptomoedas nas últimas semanas. Apesar da garantia do CEO Changpeng Zhao de que a situação havia se estabilizado, os saques estão avançando. Só na última sexta-feira (6), os clientes resgataram US$ 360 milhões líquidos (R$ 1,9 bilhão), de acordo com dados da empresa de dados criptográficos Defillama.
Em 13 de dezembro, Nansen, outra empresa de dados criptográficos, divulgou a notícia de que a Binance havia perdido US$ 3 bilhões (R$ 15 bilhões) em ativos na semana anterior, representando 4% do total. Uma investigação da Forbes revelou que, de fato, a Binance perdeu 15% de seus ativos desde uma postagem no Twitter de Zhao (conhecido como CZ) no mesmo dia em que ele minimizou as retiradas do relatório Nansen.
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Quase um quarto dos ativos da Binance deixou a exchange em menos de dois meses. Procurada, a Binance não concedeu entrevista.
A falta de confiança dos investidores é melhor vista no desempenho da Binance Coin (BNB) e da Binance USD (BUSD), os dois tokens que levam o nome da exchange. O BNB perdeu 29% de seu valor nos últimos dois meses, e a Forbes estima que deixe cerca de 29 milhões de tokens na Binance, 51% a menos do que o divulgado pela exchange em 10 de novembro. Enquanto isso, o número de stablecoins BUSD na empresa caiu 40%.
Também existem maneiras mais sutis pelas quais a Binance parece estar perdendo confiança e influência. Enquanto os ativos líquidos caíram 24% desde novembro, os investidores em tokens conhecidos como matic, ape e gala reduziram seus ativos na exchange em 40-50%.
Embora continue sendo a maior exchange de criptomoedas em volume, a Binance não está ilesa pelo declínio de quase um ano nos ativos digitais. Seu token BNB caiu quase 37% em relação a 12 meses atrás, de acordo com a Nomics, e a decisão da exchange de parar de cobrar taxas para negociação spot de bitcoin, enquanto o mercado vacilava, custou cerca de US$ 3 bilhões por ano em receita perdida, segundo estimativas da Forbes.
O valor geral das criptomoedas mostrou um declínio ainda maior, caindo 56% no ano passado, para US$ 848,7 bilhões, mostram os dados do CoinMarketCap. O próprio CZ contribuiu para o fim da FTX em novembro, quando anunciou no Twitter que planejava vender seus tokens FTX da exchange rival, no valor de cerca de US$ 580 milhões, citando “revelações recentes que vieram à tona”.
Ele seguiu com uma oferta de resgate rapidamente rescindida, alegando que os “problemas da FTX estão além de nosso controle ou capacidade de ajudar”, sugerindo que uma olhada inicial nos livros da empresa mostrou uma situação mais grave do que se pensava anteriormente.
O que tem na sua carteira?
Essa história também pode ser sobre a falta de convenções para categorizar ativos mantidos em carteiras criptográficas. As empresas de dados criptográficos ainda precisam concordar sobre o que incluir em sua avaliação de ativos, evidenciado pela ampla estimativa (US$ 37 bilhões a US$ 56 bilhões) de quanto a Binance pode reivindicar no início do ano.
Classificar ativos sistematicamente é um desafio, principalmente quando não há padrões para o que incluir e se reportar líquido de tokens gerados pela exchange ou agrupar ativos pelas blockchains em que operam. O que se segue é um detalhamento de como essas empresas quantificam o conteúdo da carteira da Binance.
Observamos que, incluídos na redução líquida de ativos da Binance, estão também alguns aumentos acentuados em duas stablecoins – moeda USD (USDC) e tether (USDT) – que ocorreram nas últimas semanas.
BNB
Há uma controvérsia substancial sobre se o BNB da Binance – um token cuja emissão e fornecimento são controlados pela exchange – representa um ativo genuíno que pode cumprir obrigações externas em tempos de crise. Se puder, as empresas de dados discordam sobre quanto valor atribuir a essas participações.
Rompendo com seu hábito de não divulgar informações financeiras confidenciais, a Binance emitiu uma declaração de transparência pública há quase dois meses, listando participações criptográficas selecionadas. Naquela época, a empresa incluía US$ 17 bilhões denominados em BNB, o que representava quase um quarto de seus ativos.
O BNB está cotado em US$ 262, queda de um terço ante 4 de novembro. O mais próximo que um observador independente chega da visão oficial da exchange sobre os tokens BNB em seu balanço atualmente vem do CoinMarketCap (CMC), que é o maior site cripto do mundo e é propriedade da Binance. Mas a CMC diz que complementa os dados da Binance com os de Nansen e Defillama.
O valor do BNB CoinMarketCap de 4 de janeiro atribuído à Binance representa 57 milhões de tokens BNB e é equivalente a 31% dos ativos totais da exchange. Essa porcentagem de BNB é maior do que qualquer outra empresa de dados e a declaração de novembro da Binance. Mas esses 57 milhões de BNB são de confiabilidade questionável porque contrastam fortemente com os 22 a 40 milhões de BNB identificados por três empresas de dados e os 16 milhões de BNB identificados pela Forbes usando a ferramenta etherscan disponível publicamente.
Se a contagem de tokens CMC BNB for precisa, isso também significa que uma grande parte da riqueza da Binance vem de IOUs de sua fabricação.
Em termos de equivalente em dólares, Glassnode coloca o valor do BNB em zero, enquanto Nansen e Arkham colocam esse valor próximo a US$ 6 bilhões e Defillama e Messari o veem perto de US$ 10 bilhões. A Messari, no entanto, agrupa o valor das participações da Binance em três cadeias – BNB, ETH e Tron – o que sugere que os quase US$ 10 bilhões no grupo BNB compreendem muitos outros tokens, não apenas BNB.
Bitcoin
A Forbes também encontrou grandes discrepâncias nas participações de bitcoin (BTC) da Binance, variando de US$ 4,8 bilhões (CoinMarketCap) a US$ 9,6 bilhões (CER.LIVE). O número de tokens mantidos variou acentuadamente de 287 mil para 577 mil bitcoins. Provavelmente, isso se deve a consultas incorretas por parte de algumas empresas de dados, que não pesquisam todas as carteiras da Binance. Mesmo assim, observadores perspicazes podem se perguntar como o CER.LIVE identificou US$ 9,6 bilhões em ativos BTC nas carteiras da Binance, mais do que o dobro do valor mostrado pela Glassnode e CoinMarketCap.
BUSD
O número de tokens BUSD caiu US$ 8.724 (40%) entre 4 de novembro e 4 de janeiro. Houve um acordo geral entre quatro dos provedores de dados (Nansen, Glassnode, Defillama e Arkham) em termos de quantos tokens BUSD a Binance mantinha em suas carteiras em 4 de janeiro, aproximadamente US$ 13.468 milhões, que é uma média das quatro empresas de dados.
O CoinMarketCap mostrou um saldo de US$ 9,58 bilhões em BUSD em 4 de janeiro, mais de US$ 3,5 bilhões abaixo dos US$ 13,1 bilhões e US$ 13,2 bilhões, respectivamente, publicados por Nansen e Defillama, as duas empresas externas que contribuem para a contagem de BUSD da CMC.
Assim, o número é problemático porque, para mostrar uma média de US$ 9,39 bilhões, os dados da própria Binance teriam que estar vários bilhões de dólares abaixo das estimativas de Nansen e Defillama. Um valor menor de tokens BUSD é uma coisa ruim para a Binance.
Ether
Usando uma média de números de ether (ETH) das quatro empresas de dados mencionadas anteriormente, a Forbes estima que a Binance tenha 4,49 milhões de tokens Ether (ETH), equivalentes a US$ 5,5 bilhões. Por outro lado, a estimativa muito mais baixa do CoinMarketCap de US$ 3,3 bilhões implica que a Binance possui apenas 2,58 milhões de tokens ETH – 1,91 tokens a menos que a média da Forbes.
A estimativa da Messari ETH (equivalente a US$ 28,6 bilhões) está em uma liga própria, representando não apenas o ether mantido, mas todos os tokens mantidos na Binance que são executados na cadeia Ethereum. Essa discrepância é significativa. É aquele em que o CoinMarketCap implica que a Binance detém 2,6 milhões de tokens ether, em comparação com 4,48-4,85 milhões de tokens de todas as outras fontes de dados e da própria Binance.
Stablecoins
De acordo com dados de Defillama, o declínio nas participações da BUSD tem sido constante, com grandes quedas (pelo menos US$ 1 bilhão) em 25 de novembro e 14 de dezembro, sendo o último dia após CZ emitir sua declaração calmante no Twitter. Durante esta segunda grande queda do BUSD, o declínio líquido em apenas um dia foi de US$ 3,46 bilhões. A Binance também viu uma duplicação simultânea de tokens USDT e USDC para US$ 6,27 bilhões combinados em 4 de janeiro. Juntas, essas mudanças abruptas e simultâneas sugerem que um ou mais grandes investidores trocaram o BUSD pelas stablecoins rivais USDT e USDC.
A Arkham Research viu sinais de alerta em como Justin Sun, fundador da Tron e proprietário da exchange Huobi, transmitiu via Twitter em 13 de dezembro como havia depositado US$ 200 milhões para mostrar aos outros que investir na Binance era seguro, mas não divulgou grandes saques que se seguiram.
Em um tweet no dia seguinte, a Arkham Research concluiu: “Nas últimas 24 horas, este endereço de depósito da Paxos viu cerca de US$ 200 milhões em BUSD de entradas, todas da Binance”. Ele acrescentou: “Isso sugere que esta entidade provavelmente está transferindo fundos da Binance, em vez de para a Binance”.
Em 6 de janeiro, a Coindesk relatou um “drama” ocorrendo na exchange Huobi da Sun, depois que ele supostamente demitiu 20% dos funcionários e exigiu que os restantes aceitassem pagamentos em USDC e USDT. A Arkham Research analisou as transações incomuns de Justin Sun e concluiu que ele pode ter perdido um relacionamento bancário importante, dificultando a movimentação de grandes somas ou até mesmo a folha de pagamento de funcionários estrangeiros.
O USDD, stablecoin da Sun, caiu esta semana, mas está sendo negociado em 97,6 centavos, reconhecidamente abaixo de sua paridade com o dólar, mas ainda dentro de um nível de desvio que viu várias vezes durante o ano passado. O influxo de dinheiro da Sun levanta questões para CZ, que, como sempre, usou o Twitter para subestimar os fundos como impulsionando a atividade da Tron na Binance, mas depois excluiu o tweet, presumivelmente porque gerou mais perguntas sobre se a Binance estava precisando ou pediu dinheiro a “investidores baleias”.
Falando ao South China Morning Post na semana passada, Sun refutou a teoria de que ele era o dono da Huobi, embora tenha revelado em outubro que era membro do comitê consultivo da exchange. Separadamente, Huobi disse em um tweet em chinês que apenas 20% dos funcionários foram demitidos. Huobi e Sun não responderam aos pedidos de comentários.
Vale ressaltar que a Binance opera sem diretor financeiro desde junho de 2021, quando Wei Zhou deixou abruptamente a empresa, algo que gera temor de que a CZ esteja comprando — e tentando comprar — ativos com dinheiro que ninguém tem certeza de que é dele. Também é lógico que a falta de pessoal financeiro importante contribuiu para a decisão abrupta da empresa de auditoria Mazars de cancelar em 19 de dezembro a análise de prova de reservas que vinha realizando para a Binance.
Os registros da Blockchain vistos pela Forbes mostram que uma carteira da Binance enviou US$ 232 milhões em tokens BUSD para uma carteira da Binance US em 31 de dezembro, aumentando drasticamente os fundos disponíveis na Binance US e possivelmente para mostrar aos reguladores dos EUA não convencidos de que a Binance US é capaz de adquirir ativos da Voyager.
A Forbes entrou em contato com a Paxos, uma entidade com licenças bancárias nos EUA e do Departamento de Finanças de Nova York, com perguntas sobre a atividade do BUSD, mas ela se recusou a comentar. Em vez disso, emitiu uma breve resposta pública à Forbes indicando que havia feito uma “declaração robusta sobre o BUSD em 13 de dezembro” e nos encaminhou para seu último relatório e informações do BUSD no site da etherscan.
O Etherscan identifica endereços de carteira presumivelmente pertencentes à Binance, como “Binance 8” e “Binance: Binance Peg-Tokens”, que detêm, respectivamente, 38,1% e 32,4% de todos os BUSD emitidos. A carteira Binance 8 tinha US$ 100 milhões em ativos no início de 2021 e chegou a US$ 15 bilhões em meados de novembro de 2022, mas eliminou quase 9 bilhões de tokens BUSD nas últimas três semanas.
Mudanças em outros lugares
Pode-se argumentar que os declínios de ativos que a Binance está enfrentando são semelhantes aos da maioria das exchanges, mas os dados de Defillama mostram que, durante os últimos 30 dias, há apenas um dos 23 rivais com informações de prova de fundos disponíveis publicamente, um perfil discreto exchange chamado MaskEX – que perdeu uma porcentagem maior de ativos do que os 15% da Binance.
A situação indica que há problemas de confiança em relação à Binance, e sua posição como o maior mercado de criptomoedas aumenta a possibilidade de contágio, caso sejam bem fundamentados. Mas esse não é necessariamente um cenário apocalíptico para ativos digitais, e a atividade pode facilmente mudar para outros mercados ao redor do mundo.
Dicas para investidores
O resultado final é que um número crescente de investidores da Binance está deixando a exchange ou reduzindo drasticamente sua exposição. Essa queda acentuada está ocorrendo em um ritmo constante, sem muita atenção da mídia ou reação do mercado.
O que torna essa história significativa é que, por sua própria inércia, a Binance está chegando perto de um precipício, onde essa corrida suave pode se intensificar.
Posicionamento Binance
Em contato com a redação da Forbes Brasil, a assessoria da Binance se posicionou sobre a situação da empresa. Confira:
“Os saques não estão acelerando. Em última análise, nossos usuários querem saber que seus fundos estão seguros e que nosso negócio é financeiramente sólido. Para esse fim, a estrutura de capital da Binance está livre de dívidas e também demonstrou recentemente sua robustez financeira ao executar US$ 6 bilhões em saques líquidos entre 12 e 14 de dezembro sem perder o ritmo.
Recentemente, três grupos de pesquisa independentes publicaram separadamente relatórios que indicavam que a situação da Binance permanece forte e bem posicionada a longo prazo.
Um indicador mais útil da saúde de uma exchange está em seu volume diário de transações. Isso pode ser visto em tempo real no CoinMarketCap.
Por fim, continuamos a manter ativos 1:1 com os depósitos e podemos financiar saques a qualquer momento, mesmo em grandes volumes, embora exagerados, como citados por este artigo”.