Quase um ano atrás, a pessoa mais rica da Ucrânia, Rinat Akhmetov, prometeu fazer tudo o que pudesse para ajudar seu país a lutar contra a invasão pela Rússia em 24 de fevereiro de 2022, prometendo não poupar gastos.
Desde então, os ataques de soldados russos resultaram em cerca de 100 mil ucranianos mortos ou feridos e também devastaram algumas das propriedades de Akhmetov no país.
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As forças russas destruíram as principais usinas da Metinvest, sua companhia siderúrgica e de mineração. Também derrubaram subestações da DTEK, sua empresa de eletricidade. Além disso, 517 de seus funcionários foram mortos e outros mil estão feridos.
No entanto, Akhmetov, continua empenhado em reparar os danos, vencer a guerra e forçar a Rússia a fazer reparações.
A Metinvest segue operando, mas com capacidade reduzida. O empresário diz que continua pagando seus 150 mil funcionários e que seu grupo, SCM, pagou US$ 2 bilhões (R$ 10,3 bilhões) em impostos em 2022. (Ele também encomendou um superiate, por cerca de US$ 500 milhões, ou R$ 2,58 bilhões).
Além disso, por meio de sua fundação, de suas empresas e do time de futebol profissional de Donetsk que ele possui, Akhmetov diz que doou US$ 150 milhões (R$ 775 milhões) em bens e serviços, incluindo reparos de infraestrutura e fornecimento de energia. Suas empresas também produziram quase 200 mil coletes à prova de balas e abrigos blindados para o exército ucraniano.
O bilionário de 56 anos, cuja fortuna caiu de estimados US$ 14 bilhões (R$ 72 bilhões) antes da guerra para US$ 4,3 bilhões atuais (R$ 22,2 bilhões), falou com a Forbes Ukraine, uma edição licenciada da Forbes, no início desta semana de um local não revelado na Ucrânia. Leia a entrevista:
Como vai a guerra? Você vê sinais de que está chegando ao fim? O que seria uma “vitória” para a Ucrânia neste momento?
A guerra está indo da maneira que Putin nunca esperou. Ele não esperava que a Ucrânia pudesse resistir. Mas a Ucrânia resistiu, libertou metade do território ocupado por suas tropas criminosas e caminha para a vitória.
Ele não esperava que o mundo ocidental permanecesse unido: ainda assim, o grupo está forte como nunca antes em apoio à Ucrânia. Eles têm fornecido assistência econômica e militar e impuseram sanções sem precedentes aos criminosos.
Putin também não esperava que a Ucrânia pudesse sobreviver ao inverno sem eletricidade e aquecimento. Nosso povo não apenas restaurou a rede de energia e sobreviveu, mas também mostrou que nunca pararemos de lutar por nossa liberdade. Ele pensou que os ucranianos iriam enchê-lo de flores, mas encontramos soldados com armas defendendo cada centímetro de nossa pátria.
Uma vitória para mim significa restaurar a integridade territorial da Ucrânia dentro das fronteiras de 1991, que inclui Donbass e a Crimeia. Significa punirmos o Estado agressor por seus crimes contra a humanidade, obtermos reparações da Rússia e implementarmos um novo Plano Marshall para a Ucrânia como membro da União Europeia e da OTAN [Organização do Tratado do Atlântico Norte].
Como você está operando seus negócios durante esse período?
A maneira como os negócios são operados não mudou, mas as circunstâncias mudaram significativamente. Os conselhos de administração e supervisão de nossos negócios trabalham 24 horas por dia, 7 dias por semana, abordando os problemas mais desafiadores dos tempos de guerra: desde reparos e suprimentos de energia até a produção de centenas de milhares de coletes à prova de balas e abrigos blindados para o exército ucraniano.
Nossas empresas operam em condições severas, fornecendo empregos e pagando salários, garantindo estabilidade financeira, pagando impostos e cumprindo seus compromissos com investidores. Em 2022, as empresas de SCM pagaram mais de US$ 2 bilhões em impostos.
Como você descreveria o estado de suas empresas?
O estado das empresas SCM é o mesmo que o estado da economia da Ucrânia. É terrível. Parte dos ativos da Metinvest (Azovstal, Ilyich Steel e várias outras plantas) foram severamente danificados ou ocupados temporariamente. Nossas usinas de energia da DTEK estão expostas a bombardeios constantes e ataques de drones russos.
No momento, a Metinvest opera com 30% a 50% de sua capacidade por conta dos bombardeios constantes e como resultado da ocupação da área do Mar Negro, incluindo os portos.
Continuamos extraindo gás, carvão e minério de ferro, gerando eletricidade, produzindo aço e investindo no futuro. Um dos últimos acontecimentos foi a compra de licenças para o desenvolvimento de um campo de gás na região de Poltava por um valor recorde de US$ 26 milhões que foram pagos ao orçamento nacional. As licenças foram adquiridas em leilão transparente pela DTEK, que pretende investir mais de US$ 20 milhões neste campo específico.
Você é capaz de pagar seus funcionários? Quantos você tem? Você pode estimar quantos deixaram a Ucrânia? E quantos morreram?
O SCM Group emprega cerca de 150 mil pessoas agora. Todos recebem salário integral. Mais de 13 mil foram recrutados para o exército, forças de defesa territorial e Guarda Nacional da Ucrânia.
O mais trágico é que a guerra ceifou a vida de 517 de nossos funcionários e feriu outros mil. Trabalhamos sem parar para fornecer ajuda financeira e qualquer outra assistência aos nossos funcionários feridos e às famílias enlutadas.
Você decidiu encerrar suas operações de mídia e canais de TV. Você pode falar sobre por que você fez isso?
A Ucrânia promulgou uma lei sobre ‘oligarcas’ da qual discordo. Afirmei repetidamente: nunca fui e não serei um oligarca.
Para não ser enquadrado como “oligarca”, cumpri integralmente a legislação e assim fui obrigado a fechar a holding de mídia, líder setorial com vinte anos de história, equipe talentosa de 4 mil funcionários e US$ 1,5 bilhões em investimentos. Teria sido impossível vendê-la nesta situação.
Você direcionou recursos de sua fundação para ajudar o povo da Ucrânia. Quanto foi a ajuda e onde ela foi mais necessária e eficaz?
Estamos fazendo tudo o que podemos para ajudar nossos militares a manter a linha e os civis a sobreviver. Um ano após o início da guerra, as empresas SCM, minha fundação e o FC Shakhtar (o time de futebol profissional de Donetsk) doaram US$ 150 milhões em ajuda para ajudar a Ucrânia e os ucranianos.
Nossa assistência inclui coletes à prova de balas, veículos, equipamentos e fortificações para as Forças de Defesa Ucranianas, remédios e outras ajudas humanitárias para civis e esforços para manter a infraestrutura crítica funcionando. Hoje, cada um de nossos negócios tem sua própria frente mantida por nossos corajosos funcionários.
Por exemplo, a Metinvest usou recursos internos para desenvolver e produzir mais de 100 abrigos blindados para combatentes ucranianos nas linhas de frente. Eles podem resistir a golpes de projéteis de artilharia. Hoje, um em cada dez coletes à prova de balas na Ucrânia é feito de aço Metinvest. No geral, produzimos e entregamos gratuitamente aos militares ucranianos cerca de 170 mil coletes à prova de balas.
Além disso, tomei a decisão de alocar mais US$ 25 milhões para ajudar os militares que defenderam Mariupol. Este projeto é chamado de Coração de Azovstal e já foi lançado. Ajudaremos os defensores de Mariupol e as famílias dos soldados desaparecidos e mortos, bem como as famílias dos prisioneiros de guerra.
Você já foi capaz de começar a reconstruir seus negócios?
Continuamos a restaurar nossas instalações após ataques de mísseis russos todos os dias, colocando nossas instalações de energia em primeiro lugar. Todas as empresas de energia ucranianas restauram instalações danificadas e destruídas, ajudando o país a enfrentar o inverno.
Estamos nos preparando para a reconstrução em larga escala de nossos ativos em Mariupol e estamos envolvidos no projeto Mariupol Reborn, um conceito para reconstruir a cidade.
Para fazer isso, precisamos restaurar o controle total sobre todo o território ucraniano e receber indenizações da Federação Russa, com o que nossa equipe jurídica está ocupada agora.
Além do requerimento que apresentei ao TEDH (Tribunal Europeu de Direitos Humanos), os ativos da SCM afetados pela agressão da Rússia contra a Ucrânia apresentaram mais de 60 ações junto ao TEDH. Nossas exigências são claras: reconhecer que as ações da Rússia violam a Convenção Européia de Direitos Humanos e fazer a Rússia pagar uma compensação justa. Estamos confiantes de que estamos certos e esperamos que o Tribunal faça julgamentos justos em favor dos requerentes ucranianos.
Apenas começamos a registrar reclamações contra a Federação Russa. O TEDH é a primeira instituição onde buscamos justiça, e vamos entrar com ações junto a outras organizações.
A Rússia deve ser responsabilizada por tudo o que fez desde 2014 nas regiões separatistas de Luhansk e Donetsk, bem como pelas ações dos terroristas controlados pela Rússia.
Faremos atualizações sobre nossas ações legais adicionais contra a Federação Russa em breve. A Rússia deve pagar integralmente pela guerra que desencadeou, pelas fábricas que destruiu e pela infraestrutura que danificou.
Pedimos a todos os aliados ucranianos, incluindo os países do G7, que se envolvam conosco para desenvolver um sistema internacional eficaz que nos permita buscar reparações da Rússia, inclusive às custas de seus ativos estatais, bem como de empresas controladas integralmente ou em parte pelo governo russo.
Este sistema deve operar em benefício da Ucrânia e de todos os afetados pela guerra na Ucrânia, tanto civis quanto empresariais. Faremos tudo o que pudermos para garantir que a Rússia seja totalmente responsável perante todos os ucranianos, inclusive financeiramente.
O que você gostaria que a população mundial soubesse sobre o estado atual da guerra e o que isso significou para os negócios na Ucrânia?
A população está bem ciente desta terrível e injusta guerra desencadeada por Putin contra a Ucrânia. O povo está ajudando a Ucrânia a vencer essa guerra. Afinal, esta guerra é muito mais do que a tentativa de Putin de dominar a Ucrânia. Esta é uma guerra contra a liberdade e a dignidade humana, contra a democracia e o mundo livre, contra a ordem e a segurança mundiais. Defendemos a nós mesmos e a vocês.
Como você está passando seus dias agora?
Vou ficar na Ucrânia, assim como muitos outros ucranianos. Não saio da Ucrânia um dia sequer. Tenho os mesmos sentimentos de todos os ucranianos. Acordo e vou para a cama pensando apenas na vitória da Ucrânia, e faço tudo o que posso para aproximá-la: desde minhas teleconferências matinais até minhas reuniões diárias.
(Traduzido por Vitória Fernandes)