As corretoras de investimento estão começando a oferecer aos clientes com maior frequência os fundos cetipados, então é provável que você tenha ouvido essa expressão recentemente.
Esse nome é atribuído aos fundos cuja negociação ocorre fora do home broker, no mercado de balcão, um ambiente de negociação fora do pregão da bolsa, porém regulado por ela através da Cetip (Central de Custódia e Liquidação Financeira de Títulos), que é o ambiente em que as operações do mercado de balcão acontecem.
Hoje vou explicar pra você como funcionam os tais fundos cetipados, mas, para contextualizar, é importante que você compreenda previamente alguns conceitos.
O que é Cetip
A Cetip faz parte do sistema B3 (Bolsa, Brasil, Balcão) e é responsável pela operação do mercado de títulos de renda fixa privada, pelo registro das operações realizadas no mercado financeiro e pelo controle e guarda de todos os títulos emitidos no mercado. É a Cetip quem garante a existência e a legitimidade dos títulos. É como se fosse um cartório que garante que o documento que você adquiriu realmente existe e é autêntico.
Isso é importante por inúmeras razões, entre elas a sua segurança como investidor. Suponhamos que a corretora em que você tem conta venha a falir. Isso não faz você perder os produtos financeiros em que investiu. Tudo o que você adquire fica registrado no seu CPF no sistema Cetip. Dessa forma, mesmo que a corretora deixe de existir, o que pertence a você continua em seu nome.
Como funciona o mercado de balcão
A expressão “mercado de balcão” vem da época em que as negociações de ações e títulos ocorriam em um balcão, localizado fisicamente nas corretoras. Com o avanço da tecnologia, esse mercado funciona eletronicamente, através do sistema digital B3. Porém, suas operações não utilizam o home broker e a regulação desse mercado ocorre de forma autônoma, numa relação direta entre corretoras e distribuidoras de valores.
Essas instituições fazem a intermediação entre compradores e vendedores, negociando empresas que ainda não são listadas na bolsa. O mercado de balcão é importante pois permite que empresas que ainda não têm tamanho suficiente para fazer parte da bolsa, possam captar investimentos no mercado financeiro, sem precisar realizar um IPO.
O que são fundos cetipados
São fundos cujas operações são feitas no mercado de balcão. Isso significa que suas cotas não são negociadas no pregão da bolsa de valores. Em vez disso, esses fundos são negociados diretamente entre as partes interessadas, através da intermediação de alguma corretora ou agente autorizado.
Existem diversos tipos de fundos “cetipados”, ou negociados no mercado de balcão da B3. Alguns exemplos são:
- Fundos de Investimento em Participações (FIP): investem em participações acionárias de empresas não listadas em bolsa de valores;
- Fundos de Crédito Privado: investem em títulos de dívida privada, como debêntures de empresas;
- Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC): investem em uma carteira de direitos creditórios, como recebíveis de empresas;
- Fundos de Investimento em Empresas Emergentes (FIEE): investem em startups e empresas em estágio inicial;
- Fundos de Investimento Imobiliários (FII): investem em empreendimentos imobiliários, como prédios comerciais, shoppings, galpões logísticos, entre outros.
Recentemente, as corretoras passaram a oferecer a investidores os FIIs cetipados, pois, com a popularização dos Fundos Imobiliários negociados em bolsa, o investidor começou a ter maior familiaridade com este produto, o que, de certa forma, torna a venda dos cetipados um pouco mais fácil.
Entretanto, se quiser investir, você tem de estar muito ciente de que um FII cetipado tem características que o diferenciam dos FIIs negociados em bolsa e sua performance pode ter uma ampla variação. Siga comigo até o fim deste artigo para saber mais sobre os fatores de risco desse tipo de produto.
Pesquise bem antes de investir
Para pesquisar o desempenho desses fundos, você pode utilizar plataformas e sites especializados em investimentos, como as próprias corretoras, o site da B3, bem como os relatórios e informações disponibilizadas pelos gestores dos fundos.
Antes de investir, sempre verifique se o fundo possui registro na CV (Comissão de Valores Mobiliários), que é o órgão regulador responsável por fiscalizar o cumprimento das normas que estabelecem as regras de constituição, funcionamento, prestação de contas e demais aspectos relativos a quaisquer fundos de investimento em operação no país.
Ainda assim, mesmo que o fundo seja registrado, é imprescindível que você entenda bem o produto antes de comprometer seu capital. Esse tipo de fundo geralmente não está sujeito às mesmas regulamentações e exigências de divulgação que os fundos listados em bolsa são obrigados a atender, e isso pode comprometer o nível de transparência da gestão frente aos investidores.
Fundos negociados no mercado de balcão podem apresentar maior complexidade e mais riscos em comparação àqueles listados em bolsas de valores e, exatamente por isso, são produtos que oferecem rentabilidades mais elevadas e que podem ser muito atrativas quando comparados a produtos convencionais listados em bolsa.
Recomendo, porém, que você sempre busque orientação especializada para entender em detalhes as características e os riscos envolvidos.
Pontos de atenção ao investir em fundos cetipados
Uma característica dos fundos negociados no mercado de balcão, que pode ser, ao mesmo tempo, uma vantagem ou um risco, é a flexibilidade em relação aos investimentos que podem ser realizados. Eles podem incluir ativos que não são listados em bolsa ou que possuem menor liquidez, como títulos de dívida privada, participações em empresas não listadas, investimentos em derivativos, entre outros.
Essa particularidade será uma vantagem se o gestor tiver um grau de excelência e acerto fora da curva, mas, por outro lado, considerando a instabilidade que caracteriza nosso mercado, e que dificulta as análises de longo prazo até mesmo de grandes gestores, isso pode ser um relevante fator risco a avaliar nesse tipo de produto.
Os riscos associados aos fundos de mercado de balcão podem variar dependendo das características específicas de cada fundo e dos ativos em que investem. Por isso, é essencial que você leia os prospectos e regulamento do fundo para entender se o produto se encaixa em sua estratégia de investimento e tolerância ao risco.
Principais riscos envolvidos:
- Risco de crédito: Os fundos de mercado de balcão podem investir em títulos de dívida privada, que possuem risco de inadimplência por parte do emissor, com potencial risco de perdas financeiras para o fundo e, consequentemente, para o investidor;
- Risco de liquidez: a liquidez normalmente é bem menor do que a de ativos listados em bolsa. Isso significa que pode ser mais difícil encontrar compradores para as cotas do fundo, e isso pode tornar a venda mais demorada e difícil;
- Risco de mercado: os riscos do mercado financeiro, como variações nos preços de títulos, taxas de juros, flutuações cambiais e volatilidade dos mercados de ações, podem impactar o desempenho dos fundos, tal qual acontece com os fundos listados;
- Risco de contraparte: No mercado de balcão, as transações são realizadas diretamente entre as partes envolvidas, o que pode expor os fundos a riscos de contraparte. Isso significa que, se uma das partes não cumprir com suas obrigações, o fundo pode sofrer prejuízos financeiros;
- Risco de regulação: Os fundos de mercado de balcão podem estar sujeitos a menos regulamentações e exigências de divulgação em comparação com os fundos listados em bolsa. Isso pode resultar em menor transparência para os investidores e aumentar o risco de práticas inadequadas ou fraudes;
Além desses riscos que mencionei, há mais um aspecto a considerar: não há transparência quanto ao preço de mercado das cotas do fundo. Em um fundo listado, você tem a vantagem de poder acompanhar as cotações o tempo todo no home broker, utilizar a análise gráfica para acompanhar tendências e, eventualmente, definir pontos de entrada ou saída, de acordo com seus objetivos. Além disso, é possível definir stop gain e stop loss, caso faça sentido em sua estratégia. Isso tudo não é factível em um fundo cetipado.
Como eu disse acima, a liquidez é baixa e, para se desfazer do produto, você irá depender de a corretora conseguir encontrar um comprador interessado em suas cotas. O baixo interesse pode, inclusive, depreciar seu patrimônio investido no fundo.
Fundos cetipados são vantajosos para as corretoras
O atual foco das corretoras no mercado de balcão, tem muito mais a ver com o momento de mercado, do que propriamente com a oferta de oportunidades reais aos investidores. O fato de não ter negociação em bolsa e, por isso, não sofrer oscilação nas cotas é, a meu ver, uma pseudo vantagem, pois na verdade aumenta o risco do produto, uma vez que ele não tem liquidez.
Em virtude do atual cenário econômico, vender novas emissões dos fundos listados em bolsa tem sido inviável, já que estes estão sendo negociados muito abaixo do seu valor patrimonial. Portanto, as corretoras têm buscado novas alternativas de faturamento e o mercado de balcão é uma delas.
Vale a pena investir em fundos cetipados?
A única condição que tornaria um FII cetipado interessante, seria se o mercado estivesse extremamente aquecido, com os fundos listados negociando cotas muito acima do valor patrimonial, como aconteceu em 2019. Neste caso, conseguir comprar no valor patrimonial um fundo cetipado, talvez fosse uma oportunidade a considerar.
Entretanto, quando o mercado de renda variável reaquecer e os fundos estiverem acima do valor patrimonial, voltaremos a ter muitas emissões, exatamente como vimos em 2019. Com isso, as corretoras voltarão a ganhar dinheiro com as emissões e, muito provavelmente, não focarão esforços em oferecer fundos cetipados.
A meu ver, os fundos listados em bolsa representam atualmente oportunidades muito melhores. São fundos com melhores portfólios, mais antigos e consolidados, contam com excelentes gestoras, estão muito mais baratos do que os cetipados, pagam bons dividendos e possuem liquidez. Por tudo isso, não vejo neste momento nenhuma vantagem em investir em fundos do mercado de balcão.
Eduardo Mira é formado em telecomunicações, com pós-graduação em pedagogia empresarial e MBA em gestão de investimento. É analista CNPI, certificado CPA10 e CPA20, ex-gerente do Banco do Brasil e da corretora Modal.
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