Fenômeno de audiência nos serviços de streaming, a série Succession trata do conturbado processo sucessório em um conglomerado americano de mídia. Logan Roy, o patriarca idoso, reluta em abrir mão do comando, com consequências danosas para a empresa e para a família. Para além dos tradicionais enredos elaborados pelos roteiristas, “Succession” trata de um tema que tem feito correr lágrimas, suor e – eventualmente – sangue na vida real: a sucessão familiar nas grandes empresas.
Confira quatro características que sua empresa deve ter para evitar que a sucessão se torne uma “Succession”:
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Propósito
Os familiares devem ter objetivos coincidentes em relação à empresa
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Excelência
Deve haver um programa estruturado de melhoria operacional e gerencial
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HBO Talentos
A empresa deve atrair, desenvolver e reter talentos, independente do sobrenome
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HBO Resiliência
A família deve ser capaz de tomar decisões em momentos de crise que sirvam ao negocio
Propósito
Os familiares devem ter objetivos coincidentes em relação à empresa
Para evitar que a vida imite a arte, a multi family office Oikos realizou, no início de junho, um evento exclusivo a que Forbes teve acesso voltado para cerca de 35 herdeiros dos maiores grupos empresariais brasileiros. Em pauta, as complexidades de perpetuar grupos empresariais para além da geração dos fundadores, fugindo do ditado “pai rico, filho nobre, neto pobre”.
Essa expressão sintetiza um processo comum. Uma geração constrói uma emprese e cria riqueza. A geração seguinte herda, mas não desenvolve. E à terceira geração cabe enfrentar a eventual falência. Vale lembrar que esse enredo não é uma exclusividade brasileira, e se desenvolve em várias línguas. “É comum que a família fundadora cresça e se acomode”, diz a representante e sócia do Cambridge Family Enterprise Group, Bruna Tokunaga Dias. “Isso leva a um apetite menor para o risco, o que acaba fazendo as empresas perderem competitividade.”
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Dias sabe o que diz. A consultoria em que trabalha foi fundada por John Davis, professor de Harvard que desembarcou no Brasil no começo dos anos 2000 para ajudar a sucessão em famílias como Gerdau, Diniz (Pão de Açúcar) e Ermírio de Moraes (Votorantim).
Os trabalhos foram iniciados com uma apresentação de Alessandro Zema, CEO do Morgan Stanley no Brasil. Ele apresentou um levantamento das 100 maiores empresas do Brasil. Dessas, 44 são familiares. Para comparar, na Europa apenas 12 das 100 maiores empresas são familiares. E nos Estados Unidos essa proporção é ainda menor: 10%. “O modelo de ‘corporation’, ou empresa de controle difuso, não se aplica na nossa realidade”, disse Zema.
A conclusão é que, ao contrário do que parece, a existência de um acionista de referência (mas pode chamar de dono) é um diferencial positivo para a construção de valor no Brasil. O ambiente econômico nacional é desfavorável para a perenidade dos negócios. A combinação de inflação e juros elevados, deficiências da infraestrutura e instabilidade política dificulta o crescimento da economia. Isso torna o empreendedorismo mais desafiador. Nesse cenário, as empresas familiares são mais resilientes.
Fatores de permanência
A consultoria Cambridge realizou um estudo, partindo das listas de bilionários da Forbes Brasil, para saber o as empresas centenárias brasileiras fizeram de diferente. Dezenas de empresários e executivos foram entrevistados. “Verificamos que há alguns diferenciais para a longevidade”, afirma Dias. “Os principais são a união das famílias em torno de um propósito, o cuidado com a excelência operacional, a melhoria contínua de processos e serviços e o desenvolvimento dos talentos, familiares ou não.”
No entanto, mesmo necessárias, essas condições não são suficientes. As empresas longevas têm algumas características comuns. A capacidade de as lideranças tomarem decisões difíceis em momentos adversos, uma boa capacidade de resolução de conflitos e a convicção de que a família serve ao negócio, e não o contrário”, diz a consultora.
Essas são as características das pessoas físicas. E no caso das pessoas jurídicas? Segundo Zema, as empresas familiares brasileiras que sobrevivem às mudanças de geração combinam, além do legado, posicionamento e a aceitação de mudanças. O posicionamento refere-se à atividade. Se a empresa é líder ou seguidora em seu setor, qual sua relevância – e o que é preciso fazer para tornar-se mais relevante. Por exemplo, mudar o segmento de atuação e como fazer isso. Por exemplo, definindo desinvestimentos. “O ambiente brasileiro é muito desafiador e dinâmico, é preciso ter capacidade de adaptação e de inovação, sem descuidar da governança”, diz ele.
Sustentabilidade
Entre os palestrantes estava Beatriz Johannpeter, filha de Jorge e irmã de André Gerdau, que dirige o Instituto Helda Gerdau. Arquiteta de formação, consultora de famílias empresárias e diretora do Instituto Helda Gerdau. Bea, como é conhecida, contou que o processo de sucessão é contínuo em sua família. Isso criou a necessidade de atualização no engajamento dos novos integrantes. A Gerdau começou como uma fábrica de pregos em 1901, e chegou sólida à quinta geração dos controladores. Isso demandou a atualização de estruturas e regras. “Entendemos que as pessoas de nossa família têm diferentes papéis: como acionistas, no dia a dia do instituto familiar, batizado com o nome da minha avó e que é apartado do instituto corporativo”, diz ela.
A arquiteta é defensora da governança e do impacto social corporativo. “A sociedade está amadurecendo do ponto de vista socioambiental e esses desafios se tornaram mais visíveis”, diz ela. Os investidores são cada vez mais ativos e isso pressiona as empresas a desenvolver práticas de sustentabilidade. “As empresas que não criarem formas de gerar lucro com propósito serão penalizadas, vão perder diferenciais estratégicos, uma vez que o capitalismo de stakeholders já é uma realidade.”