Enquanto Elon Musk intensificava o seu apoio à campanha eleitoral de Donald Trump, o ex-presidente parecia prometer ao homem mais rico do mundo algo em troca. “Precisamos melhorar a vida de nossas pessoas inteligentes — e ele é tão inteligente quanto alguém pode ser”, disse Trump em um comício no final de julho.
Uma das coisas que Musk quer é que a Administração Federal de Aviação (FAA) acelere o processamento de licenças de lançamento espacial, o que, segundo sua empresa SpaceX, está atrasando o ritmo de testes do enorme foguete Starship. Além disso, há disputas da SpaceX com a Agência de Proteção Ambiental (EPA) sobre os impactos dos lançamentos em uma área rica em vida selvagem na Costa do Golfo, no Texas.
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Trump, que trará uma nova leva de nomeados políticos para a FAA e a EPA, poderia oferecer alívio rápido nesses pontos e, de modo mais amplo, reverter as regulamentações na indústria espacial, hoje altamente reguladas. Isso beneficiaria todas as empresas espaciais, mas nenhuma mais do que a SpaceX, disse Chris Quilty, fundador da empresa de serviços financeiros Quilty Analytics, especializada no setor espacial.
Em reuniões do setor este ano, concorrentes expressaram crescente preocupação de que a SpaceX possa receber tratamento preferencial do governo Trump. “Mesmo que você seja pró-Trump e trabalhe na indústria espacial, você pensa: ‘Droga, a SpaceX já está dominando. Eles precisam de mais vantagem?’”
Essa é parte da razão pela qual a indústria espacial encara a possibilidade de retorno de Trump à Casa Branca com uma mistura de esperança e apreensão.
Histórico de Trump
Trump construiu um forte histórico pró-espaço em seu primeiro mandato. “Foi possivelmente o esforço espacial presidencial mais impactante desde JFK”, disse Quilty. Com o vice-presidente Mike Pence, um entusiasta do setor de longa data, liderando o revitalizado Conselho Nacional do Espaço, o governo Trump estabeleceu a Força Espacial como um serviço militar independente, pressionou por mais financiamento para a NASA, lançou o programa Artemis, que redirecionou os esforços da agência para o retorno de astronautas à Lua, e orquestrou um tratado internacional sobre exploração e mineração na Lua, em Marte e em asteroides.
No próximo mandato, as empresas do setor acreditam que o interesse de Trump em competir com a China impulsionará o investimento em programas espaciais militares e civis, desde a defesa contra armas anti satélites chinesas até a necessidade de acompanhar os esforços do país na exploração lunar. E, se Musk conseguir o que quer, o governo poderá ajustar suas prioridades espaciais em direção a sua própria ambição de longo prazo: chegar a Marte.
“Elon, ponha esses foguetes para funcionar, porque queremos chegar a Marte antes do fim do meu mandato”, disse Trump em setembro.
Fácil assim?
É improvável que o Congresso concorde com isso. Muitos especialistas espaciais acreditam que é necessário estabelecer uma presença humana sustentada na Lua antes de ir para Marte. Ainda assim, a NASA poderia dar algum suporte ao esforço privado da SpaceX para chegar a Marte. Musk já afirmou que planeja enviar cinco Starships não tripulados ao planeta em 2026.
Qualquer ambição grandiosa — seja para a Lua ou outros destinos — poderia ser limitada se Trump convencer o Congresso a cumprir suas promessas de campanha de reduzir impostos e cortar gastos do governo.
Na NASA, uma das maiores medidas de economia que poderia ser adotada também beneficiaria a SpaceX: acabar com o caro Sistema de Lançamento Espacial (SLS), o gigantesco foguete estatal que é o principal veículo do programa Artemis, que tem como objetivo retornar astronautas americanos à Lua.
O inspetor-geral da NASA estimou que cada lançamento custa US$ 4 bilhões (R$ 22,8 bilhões) — cerca de um sexto do orçamento anual da agência. Muitos defensores da exploração espacial acreditam que o Starship seria capaz de cumprir a mesma função por um preço significativamente menor — Musk afirma que um único lançamento custará menos de US$ 10 milhões (R$ 57 milhões).
A SpaceX já está envolvida no programa Artemis — está desenvolvendo uma versão do Starship que funcionaria como um módulo lunar, encontrando-se com a nave Orion, construída pela Lockheed Martin, acima da Lua para levar astronautas até a superfície. Mas outro contrato governamental para substituir o SLS pelo Starship seria lucrativo.
Isso é improvável, mesmo com a nova posição de influência de Musk. Eliminar o SLS, apelidado de “Senate Launch System” pelo benefício político que o programa traz, apoia empregos em todos os 50 estados (seu principal contratante é a Boeing) — e, como em todos os elementos do orçamento, o Congresso é o principal tomador de decisões.
Mais viável seria iniciar um processo de transição para um veículo de desenvolvimento comercial após as três primeiras das seis missões planejadas do Artemis, disse Todd Harrison, analista de políticas de defesa e espaço do American Enterprise Institute.
Outra maneira pela qual Musk e a SpaceX podem se beneficiar de uma administração Trump é com uma transição para uma maioria do Partido Republicano na Comissão Federal de Comunicações (FCC). A empresa tem atualmente uma “enxurrada” de pedidos pendentes junto à FCC para aumentar a participação do espectro usado por seus satélites de comunicação Starlink e a potência de suas transmissões, bem como aumentar o tamanho de sua constelação e posicionar satélites em altitudes mais baixas, observa Quilty.
Além de manter ou aumentar o financiamento da NASA, Trump pode também favorecer a expansão da Força Espacial, atualmente o menor dos serviços militares, com um orçamento de US$ 29 bilhões (R$ 165,3 bilhões). Ele disse no final de agosto que queria estabelecer uma Guarda Nacional Espacial, uma ideia rejeitada pelo Pentágono por ser muito cara.
“Se os mesmos fatores orçamentários que vimos nos últimos anos se repetirem, com o Freedom Caucus insistindo em cortes que acabam recaindo sobre a defesa, então acredito que o financiamento da Força Espacial continuará limitado e talvez até vejamos cortes adicionais do Congresso”, disse Harrison. “Não acho que haja muito que o governo Trump possa fazer para contrariar isso.”
Independentemente do orçamento geral, a administração provavelmente se inclinará mais para a privatização no espaço como parte de seus esforços para conter a China, disse Jeffrey Manber, veterano da indústria que lidera um esforço para construir uma estação espacial comercial na startup Voyager Space. “Acredito que veremos isso na NASA e no Departamento de Defesa”, afirmou.
Isso poderia dar nova vida a uma série de empresas espaciais dos EUA.
Avanço recente
Fornecedores comerciais de observação da Terra via satélite têm avançado muito, como evidenciado pelas imagens impressionantes fornecidas pela Maxar e Planet Labs nos primeiros dias da invasão da Ucrânia pela Rússia. Mas a lucratividade tem sido evasiva.
Parte do problema, dizem os analistas, é a hesitação das agências de segurança nacional dos EUA em reduzir sua dependência de sistemas governamentais para comunicação, observação da Terra e rastreamento de satélites e objetos em órbita.
Um relatório de maio do Conselho de Ciência da Defesa do Pentágono afirmou que “o governo desconfia da confiabilidade dos serviços comerciais a longo prazo, especialmente em momentos de crise aguda.” Exemplo disso foi a decisão de Musk de impedir o exército ucraniano de usar o Starlink em 2022 para lançar um ataque contra a Crimeia ocupada. O bilionário disse temer que isso provocasse uma resposta nuclear da Rússia.
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A preocupação com a imprevisibilidade dos EUA sob o governo Trump, bem como esse tipo de imprevisibilidade de Musk, provavelmente fará com que outros países acelerem seus esforços para desenvolver capacidades independentes de lançamento e satélites, disse Manber. “Todos estão preocupados em depender dos EUA para acesso ao espaço.”
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