Quem vê o dólar persistentemente acima dos R$ 6 nas últimas semanas até esquece que, no início de 2024, a moeda americana chegou a ser negociada na faixa dos R$ 4,8. E em um momento de forte pressão no câmbio, as dúvidas para 2025 se acumulam — até onde o dólar pode chegar?
No início do ano,a expectativa era de que 2024 seria marcado por um enfraquecimento da moeda americana em escala global — e não foi bem isso o que aconteceu.
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“O ano de 2024 começou com esperança, mas foi rápido em ‘destruir ilusões’”, aponta Diego Costa, head de câmbio para o Norte e Nordeste da B&T Câmbio. “Era um cenário que, no papel, parecia ideal, com desaceleração controlada da inflação nos Estados Unidos, recuperação econômica na China e alívio nos juros brasileiros”.
A realidade, no entanto, frustrou o mercado em todas as frentes. A inflação persistentemente alta nos Estados Unidos levou o Fed a reduzir os cortes e manter um tom duro em suas comunicações; a economia chinesa não se mostrou responsiva aos estímulos anunciados pelo governo e, no Brasil, uma forte crise de credibilidade fiscal fez o dólar saltar de R$ 5,7 para R$ 6,3 em questão de poucos dias — um cenário que nem mesmo os mais pessimistas conseguiram antecipar.
No fim de novembro, o pacote fiscal de contenção de gastos apresentado pelo governo frustrou o mercado, que considerou a iniciativa com uma comunicação confusa e impacto menor do que o esperado. O Banco Central acelerou o corte de juros e fez diversas intervenções no mercado à vista, mas a moeda americana pouco cedeu.
A eleição presidencial americana também deixou o seu impacto. O presidente eleito, Donald Trump, se elegeu com base em uma plataforma política focada no protecionismo e aumento de tarifas, fora as promessas de gastos públicos que podem pressionar a inflação, subir os juros americanos e fortalecer o dólar ainda mais.
Como fica o dólar em 2025?
Se 2024 parecia um ano “fácil” no começo, 2025 já começa muito mais complexo.
Assim como acontece na bolsa brasileira, a falta de previsibilidade é o maior desafio para os economistas. O relatório Focus, do Banco Central, aponta que o mercado vê o dólar a R$ 5,90 ao fim de 2025, mas as projeções de grandes bancos de investimentos estão dispersas — e vão desde R$ 5,7 até R$ 6,20.
O consenso é de que o início do ano deve ser marcado por volatilidade e incertezas. A primeira delas vem do exterior. Há também grande dúvida sobre qual o tipo de política econômica será adotada por Donald Trump em seu segundo mandato.
Luis Garcia, diretor de investimentos da SulAmérica Investimentos, aponta que há dois caminhos a serem seguidos. O primeiro é o do “Trump taxador”, fiel ao seu discurso eleitoral e com uma forte agenda de protecionismo. Mas há também uma segunda alternativa: um “Trump Negociador”, que late mais do que morde, em uma tentativa de melhorar sua posição na mesa de negociações.
“Se vier o Trump mais fiel ao discurso eleitoral, será um grande problema para os países desenvolvidos e emergentes. Se for o Trump negociador, o impacto pode ser menor, mas ainda assim complicado”, aponta.
Já no Brasil, o movimento do dólar parece estar no colo do governo.
“2025 pode até ser um ano de oportunidades, se o Brasil conseguir reverter a trajetória de desconfiança com avanços estruturais e uma comunicação mais clara e convincente do governo. Mas se essas ações não vierem, o estresse visto agora pode ser apenas um prólogo de um ano ainda mais turbulento”, aponta Costa, da B&T Câmbio.
Garcia, da SulAmérica Investimentos, lembra que, historicamente, a taxa de câmbio possui um papel disciplinador, forçando a classe política a tomar medidas que impeçam a sobrecarga na moeda local. “Neste final de ano, mesmo com a grande desvalorização, isso não aconteceu. A agenda fiscal foi esvaziada, e começaremos 2025 com temas complicados, como a tributação sobre o imposto de renda”, conclui.
Embora algumas projeções indiquem o dólar a R$ 6 como uma nova realidade, o head de câmbio para o Norte e Nordeste da B&T Câmbio acredita que há espaço para alívio. Com os ventos globais desfavoráveis, a lição de casa precisará ser feita em Brasília.
E agora, BC?
Manter a taxa de câmbio em níveis saudáveis é uma das preocupações do Banco Central, já que um real desvalorizado implica em efeitos inflacionários preocupantes. Nas últimas semanas, o BC fez uma série de intervenções via leilões de linha e de swap para conter a moeda — mas sem muito sucesso. Ao todo, mais de US$ 30 bilhões foram injetados no sistema.
Para os especialistas, o BC sozinho não é capaz — e nem deve — sustentar artificialmente um patamar para a moeda. “Intervenções do Banco Central são como analgésicos, aliviam os sintomas, mas não resolvem a doença”, pondera Costa, da B&T Câmbio
Tanto Costa quanto Garcia mostram preocupação com as intervenções, já que os problemas estruturais prevaleceram sobre a cotação do dólar.
Para 2025, intervenções frequentes ou mal coordenadas podem gerar dúvidas sobre a sustentabilidade das reservas internacionais ou mesmo sobre a autonomia do BC, especialmente num momento em que sua relação com o governo já é alvo de escrutínio”, conclui Costa.