![Sergey Brin](https://forbes.com.br/wp-content/uploads/2024/11/Pessoas-mais-ricas-do-mundo_Sergey-Brim-768x512.jpg)
Em 26 de março de 2024, Nicole Shanahan entrou no cenário nacional como candidata a vice-presidente na chapa de Robert F. Kennedy Jr. Naquele dia e em muitas declarações públicas posteriores, Shanahan compartilhou detalhes sobre o diagnóstico de autismo de sua filha pequena, atribuindo-o a uma vacina que ela recebeu quando bebê.
Não há evidências de que vacinas causem autismo, mas Shanahan — que se descreve como uma “mãe do autismo” — propagou essa teoria já desmentida ao longo de sua campanha de cinco meses para a vice-presidência. “O meu apoio a Bobby Kennedy é motivado por isso”, afirmou em um podcast, um dia após aceitar a nomeação. Kennedy é secretário da Saúde no governo de Donald Trump e conhecido por ser um ativista antivacina.
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Longe da campanha eleitoral, o seu ex-marido e pai da criança, o cofundador do Google Sergey Brin, nunca falou publicamente sobre sua filha ou sobre as crenças de Shanahan. No entanto, no início de 2022, membros de sua equipe filantrópica começaram a buscar maneiras de ajudar. Após mais de dois anos de planejamento e quase US$ 50 milhões (R$ 287,5 milhões) investidos em pesquisas sobre autismo, Brin está lançando uma nova iniciativa chamada Aligning Research to Impact Autism (ARIA), que financiará pesquisas sobre as causas do transtorno e possíveis terapias.
O orçamento de longo prazo do projeto ainda não foi definido, mas, segundo uma pessoa familiarizada com a estratégia filantrópica do empresário, ele superará em muito o valor já investido. Seu primeiro programa, chamado IMPACT Network, pretende conectar um grupo de centros de atendimento ao autismo a pesquisadores associados, que irão colaborar e coordenar ensaios clínicos. As inscrições para participar da rede devem ser abertas nos próximos meses.
Causas São Pessoais
O foco de Brin no autismo é seu mais recente esforço para direcionar a maior parte de suas doações filantrópicas substanciais para condições que afetam o sistema nervoso central (SNC), todas organizadas sob um projeto chamado “CNS Quest”, de acordo com Ekemini Riley, doutora em medicina molecular e uma das líderes das iniciativas do CNS Quest. As primeiras doações do cofundador do Google foram direcionadas, em sua maioria, para a pesquisa científica básica sobre o Parkinson e para o transtorno bipolar.
Embora Brin raramente fale com a imprensa e mantenha sua vida privada, as três condições — Parkinson, transtorno bipolar e autismo — afetaram membros de sua família. Sua mãe, diagnosticada com Parkinson há mais de 20 anos, faleceu em dezembro de 2024, aos 76 anos. Em 2010, em uma rara entrevista, Brin também revelou que tem um risco aumentado de desenvolver Parkinson devido a uma mutação genética que sua mãe também possuía.
“Esse trabalho levou à descoberta de uma nova variante do gene GBA1, que aumenta o risco de Parkinson em pessoas de ascendência africana. Estou otimista quanto a descobertas semelhantes que melhorem os cuidados para pessoas com transtorno bipolar e autismo”, escreveu o bilionário em um e-mail para a Forbes. O Parkinson é uma doença neurológica degenerativa e devastadora, que afeta 10 milhões de pessoas no mundo todo.
Dos quase US$ 900 milhões (R$ 5,17 bilhões) em doações filantrópicas de Brin no ano passado — quase o dobro do que ele doou em 2023 e um quarto do total de US$ 3,9 bilhões (R$ 22,42 bilhões) que já destinou a causas sociais ao longo da vida — cerca de metade foi para iniciativas relacionadas ao CNS Quest. Além disso, ele começou recentemente a apoiar startups e fundos de capital de risco que desenvolvam soluções e tratamentos com fins lucrativos, investindo mais de US$ 600 milhões (R$ 3,45 bilhões) até agora, sendo cerca de US$ 400 milhões (R$ 2,3 bilhões) apenas em 2024. Embora qualquer lucro obtido seja reinvestido ou doado a organizações sem fins lucrativos, essa é mais uma forma de impulsionar avanços na área.
Pesquisas Deram Retorno
Brin já investiu US$ 1,75 bilhão (R$ 10,06 bilhões) em pesquisas sobre a doença de Parkinson, mais do que qualquer outra pessoa individualmente. Ele está entre os poucos no mundo que doaram tanto para uma única doença. (Outros incluem Bill Gates, Melinda French Gates e Warren Buffett na erradicação da pólio, além do falecido bilionário do setor imobiliário Harry Helmsley e sua esposa Leona para a pesquisa sobre diabetes tipo 1).
A dedicação e colaboração que o cofundador do Google aplica à sua filantropia já começaram a dar frutos. Em novembro de 2023, pesquisadores financiados pelo programa Aligning Science Across Parkinson’s (ASAP), de Brin, e seu parceiro, a Michael J. Fox Foundation, descobriram a variante genética mencionada pelo bilionário em seu e-mail para a Forbes — uma mutação que quase quadruplica o risco de Parkinson em pessoas de ascendência africana. Além disso, em agosto de 2023, a FDA (agência sanitária dos EUA) emitiu uma carta de apoio incentivando cientistas e desenvolvedores de medicamentos a utilizarem um teste de fluido espinhal para diagnóstico precoce de Parkinson, um exame que foi parcialmente financiado pelo programa ASAP.
Transtorno Bipolar e Autismo
Brin também tem financiado amplamente pesquisas sobre transtorno bipolar, uma condição séria de saúde mental que afeta cerca de 40 milhões de pessoas no mundo. Em 2022, ele e dois casais bilionários — todos com familiares diagnosticados com transtorno bipolar — se comprometeram a doar US$ 50 milhões (R$ 287,5 milhões) cada um, ao longo de cinco anos, para uma entidade chamada Breakthrough Discoveries for Thriving with Bipolar Disorder (BD2). Brin já destinou US$ 75 milhões (R$ 431,2 milhões) para pesquisas sobre o transtorno.
No início de 2022, a equipe de Brin já planejava focar no autismo. Em outubro do ano passado, lançou discretamente a ARIA, concentrando-se desde o início não apenas na pesquisa científica básica — que historicamente recebe a maior parte do financiamento para o autismo — mas também no desenvolvimento de terapias e tratamentos potenciais. “O que aprendemos e vimos em nossas outras iniciativas é que é realmente importante financiar ambas as frentes em paralelo e criar um ciclo de feedback entre a ciência e a parte clínica, como o desenho de testes, o desenvolvimento de medicamentos e terapias”, diz Ekemini Riley, que co-lidera a ARIA. Isso é especialmente relevante no caso do autismo, já que se trata de uma diferença neurológica e não de uma doença a ser curada.
De acordo com Riley, nos próximos cinco anos, a ARIA tem objetivos ambiciosos, incluindo o desenvolvimento de avaliações quantitativas para linguagem, comunicação social e disfunções sensoriais, com o objetivo de melhorar os tratamentos para pessoas autistas que buscam esse suporte.
“Eu gostaria de garantir que todas as pessoas com uma condição neurodesenvolvimental complexa, como o autismo, tenham a oportunidade ter na vida adulta condições que lhes permita alcançar seu potencial e estar em um ambiente onde se sintam seguras, respeitadas e valorizadas pelo que são”, afirma Katarzyna Chawarska, professora de psiquiatria da Escola de Medicina de Yale, que pesquisa marcadores precoces do autismo e conversou com a Forbes sobre os esforços de Brin.
Investimento em Biotecnologia
Para alcançar seu objetivo de desenvolver melhores tratamentos, a equipe de Brin começou a apoiar empresas de biotecnologia. No final de 2021, ele criou a Catalyst4, um tipo de organização sem fins lucrativos chamada 501(c)(4), que tem a capacidade de fazer lobby e também deter a propriedade total de empresas com fins lucrativos. Brin financiou a Catalyst4 com mais de US$ 450 milhões (R$ 2,58 bilhões) em ações do Alphabet e da Tesla. Em 2023, ele doou mais US$ 615 milhões (R$ 3,53 bilhões) para a Catalyst4.
O portfólio da organização inclui uma participação majoritária na MapLight, uma empresa biofarmacêutica que desenvolve tratamentos para doenças cerebrais e autismo. Atualmente, a empresa tem um candidato a medicamento na Fase 2 de testes clínicos, voltado para ajudar em “déficits de comunicação social” em determinadas pessoas autistas. A Catalyst4 também investiu na Stellaromics, que cria mapas tridimensionais detalhados da atividade genética em amostras de tecido, para serem usados no desenvolvimento de medicamentos; na Capsida Biotherapeutics, uma empresa de terapia gênica em estágio inicial; e na Octave Bioscience, que trabalha para melhorar o tratamento de doenças neurodegenerativas, começando com a esclerose múltipla.
Uma abordagem adotada pela Catalyst4 com várias de suas empresas investidas é a combinação de financiamento filantrópico — geralmente cerca de 25% do investimento total — com participação acionária, de acordo com uma fonte próxima à estratégia filantrópica de Brin.
A Catalyst4 também detém participações indiretas em startups por meio de vários fundos de investimento. O maior deles é um fundo dedicado dentro da The Column Group, criado em parceria com a Simons Foundation (fundada pelo falecido bilionário dos fundos de hedge Jim Simons e sua esposa Marilyn). Esse fundo tem atualmente cerca de US$ 200 milhões (R$ 1,15 bilhão) em ativos e foca em investimentos iniciais para a descoberta de medicamentos e vacinas, além de startups de terapia gênica e celular, que buscam desenvolver tratamentos para condições neurológicas.
O fundo foi criado levando em consideração a alta tolerância ao risco de Brin, o que o diferencia de outros filantropos e investidores de capital de risco, segundo Robert Tjian, renomado bioquímico, professor da UC Berkeley, conselheiro da The Column Group e um dos idealizadores do fundo. “Trabalhar com o cérebro humano é extremamente difícil porque você não tem acesso direto a ele, certo? Você não pode simplesmente abrir e mexer”, explica Tjian. “Isso significa que o tempo entre o investimento inicial e os primeiros resultados em estudos clínicos geralmente é maior do que a maioria dos investidores de capital de risco está disposta a esperar.”