![Produção de aço](https://forbes.com.br/wp-content/uploads/2025/02/GettyImages-556416343-1-768x512.jpg)
A semana começou com uma nova guinada na política econômica protecionista do presidente dos Estados Unidos Donald Trump — a ameaça de impor tarifas de 25% sobre todo o aço e alumínio importado pelos EUA. Sem distinguir aliados comerciais de rivais.
Se entrar em vigor, a medida será um repeteco turbinado do que já aconteceu no primeiro mandato de Trump. Mas ao contrário das outras tarifas anunciadas até agora, a briga por proteger a indústria nacional de aço não é só do presidente americano. Nos últimos 10 anos (ou mais), o mundo tem vivido uma verdadeira “Guerra do Aço”. E a culpa é da China.
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Os EUA não estão sozinhos na lista de países que estudam ou implementaram medidas para reduzir a oferta chinesa — nações do sul da Ásia, América Latina (incluindo o Brasil) e a União Europeia também foram atrás de medidas para resgatar as suas indústrias siderúrgicas.
China e a ‘Guerra do Aço’
Segundo a World Steel Association, o mundo todo produziu cerca de 1,8 milhões de toneladas de aço em 2024. Desse número, 1,005 bilhão foram produzidos pela China. Com uma forte desaceleração econômica e crise imobiliária desde a pandemia, o mercado doméstico chinês não tem capacidade de consumir todo o aço produzido. Com oferta excedente e preços baixos, o que tem acontecido ao longo das últimas décadas é uma inundação de aço chinês em outros mercados.
Yasmin Riveli, economista e especialista em mineração e siderurgia da Tendências Consultoria, explica que o cenário atual é um reflexo dos pesados investimentos chineses na ampliação de capacidade de produção, que começaram no início dos anos 2000 e se estenderam até a década de 2010. Apesar da desaceleração nos últimos anos, o impacto global segue sendo sentido.
“Inicialmente, esse aço produzido abastecia majoritariamente o mercado interno chinês, especialmente o setor da construção civil, que estava em forte crescimento. A infraestrutura chinesa estava se expandindo muito, e a própria indústria, incluindo a automotiva, absorvia boa parte dessa produção. O declínio dos investimentos e a redução do início de novas obras resultaram em um excesso de oferta de aço”, explica.
Em 2000, a produção anual chinesa era de “apenas” 128,5 milhões de toneladas de aço bruto. De lá para cá, o volume anual teve alta de 700%, com mais de 2 mil fábricas espalhadas pelo país.
A estratégia de exportação chinesa passou a ganhar forçar. O International Trade Administration, do governo americano, aponta que o volume de aço exportado pela China cresceu 39% entre 2022 e 2023, com 226 países aparecendo na lista de compradores.
Enquanto a China investia no setor, a produção siderúrgica nos Estados Unidos e Europa começaram a cair, ampliando a influência chinesa no setor.
Agora, governos tentam correr atrás do prejuízo — da Europa, passando pelo do sul da Ásia até às Américas. No ano passado, a indústria siderúrgica brasileira fez forte campanha para que o país adotasse tarifas mais rígidas ao aço chinês, mas apenas parte dos pedidos foram aceitos, com tarifas e cotas para determinados produtos.
Tarifas são a solução?
O isolamento do mercado americano com a aplicação de tarifas sobre o aço e alumínio do mundo inteiro está longe de ser uma solução. Na verdade, pode criar mais problemas.
Assim como aconteceu em 2018, as primeiras projeções apontam na possiblidade de perdas de milhares de empregos em empresas que produzem derivados do aço e de alumínio. Isso ocorre porque a tendência é que o preço se eleve dentro dos Estados Unidos.
No momento, o país não tem uma indústria siderúrgica capaz de dar conta de toda a demanda necessária para alimentar o mercado interno. Segundo o Instituto Americano de ferro e aço (AISI, na sigla em inglês), os EUA produzem cerca de 74% do total consumido.
“No curto prazo, a imposição de tarifas pode gerar uma pressão inflacionária, pois as fábricas não aumentam sua capacidade produtiva de maneira imediata. Talvez, em um horizonte de cinco anos, a situação seja diferente, mas hoje os EUA ainda dependem de importações”, aponta Riveli, da Tendências. Para que o problema se resolva, será preciso um programa de investimento na indústria siderúrgica que eleve a produção a um nível de completa independência comercial.
A dependência dos Estados Unidos com relação ao aço chinês tem caído. Entre 2023 e 2024, a redução foi de 15%, com o país asiático ocupando apenas a 10ª posição de maiores exportadores do produto. Já o Brasil é o terceiro maior exportador de aço bruto.
Se nos Estados Unidos o principal efeito das tarifas será grande pressão inflacionária, no resto do mundo o que se espera é uma nova etapa da “Guerra do Aço”. É que com as fronteiras americanas fechadas, não será apenas o aço chinês que estará sobrando e pronto para ser vendido mais barato: todos os principais produtores passarão pelo mesmo.