
Falar de como multimilionários administram os seus patrimônios pode até parecer um assunto de pouco interesse do investidor comum — mas a verdade é muito diferente. Muitas tendências que vemos no mercado financeiro de varejo costumam aparecer bem antes no segmento de wealth management.
Não se trata de nenhum tipo de bola de cristal e sim um efeito da grande fatia de riqueza que é administrada por essas instituições. Movimentando trilhões ao ano, os family offices e private banks são um fenômeno em crescimento em todo o mundo — inclusive no Brasil. Na última década, o crescimento global ficou na casa dos 30%
Discretos, reservados e com forte apelo na exclusividade, as engrenagens dos family offices são desconhecidos até mesmo para aqueles que podem ser considerados os seus maiores aliados — gestores de ativos que não conseguem traçar um perfil único e detectar as tendências do setor que gerencia o patrimônio dos mais ricos do país.
Luise Vila, consultora no mercado financeiro e fundadora da plataforma de inteligência de mercado fnmk, decidiu desvendar o mundo do wealth management com a ajuda de inteligência artificial, machine learning e consolidação de dados das áreas de relacionamento com investidores de cerca de 546 empresas que atuam no segmento.
“Os family offices têm um papel muito importante nessa dinâmica de captação [de recursos para outros investimentos e gestoras]. Eles conseguem dar acesso a produtos muito mais sofisticados aos seus clientes, com muito mais liquidez que um fundo de pensão, por exemplo. Estrategicamente, é muito interessante que o contato entre eles e as gestoras seja mais fluído”, explica Vila em entrevista à Forbes Brasil.
Os dados coletados e analisados são referentes ao primeiro trimestre de 2025. As pouco mais de 540 companhias que foram analisadas não representam a totalidade das empresas que atuam com weatlh management, mas sim aquelas que conseguiram ser rastreadas por meio de CNPJs e atividade e presença em redes sociais. Luise explica que a fragmentação e “recato” dos players do setor acabam dificultando uma consolidação completa dos dados. O objetivo da executiva é que com o raio-x, gestoras e family offices melhorem a comunicação e consigam, juntos, melhorar o mercado de capitais local.
O perfil do wealth management brasileiro
Para a fnmk, o mercado de wealth management tem passado por mudanças estruturais importantes, como a profissionalização e expansão dos multi-family offices. “Isso indica que o mercado de gestão patrimonial no Brasil está se sofisticando e se aproximando das melhores práticas internacionais”, aponta o relatório.
O primeiro sinal é a diversificação geográfica. Apesar de São Paulo ainda aparecer como a grande capital do mercado financeiro brasileiro, com mais de 65% das empresas do setor, Curitiba e Belo Horizonte emergem como novos polos ativos, com cerca de 5% das empresas mapeadas.
Há também uma maior diversificação internacional — com 10% das empresas com sede ou uma filial em locais como Miami, Lisboa ou Dubai.
Dentre os diversos tipos de atuação do setor, os multi-family offices representam 44% do segmento, seguido pelos single-family offices, com 29%. Wealth Managers representam 21% das empresas.
A dificuldade e transparência dessas instituições se deve ao baixo enquadramento delas como gestoras de recursos. Apenas 35,9% do total tem obrigação regulatória de exposição pública e abertura de informações. Dentro do universo ultra high, multi-family offices são considerados os mais transparentes.
E, ao contrário do que pensa a maior parte do mercado, apenas 18% das gestoras de fortunas operam fundos exclusivos. Para Luise, a alteração das regras de tributação pode ser uma das razões para a queda de popularidade da medida. Em 2023, o Congresso aprovou uma medida que elevou a taxação de fundos exclusivos de curto prazo para 20%, enquanto os de longo prazo passaram a ser de 15%.
A pesquisa aponta que os Wealth Managers lideram a estruturação de fundos exclusivos, com 33% do total de WMs adotando a prática. Os Multi-Family Offices aparecem em segundo lugar, com 17% da categoria. Os single-family offices são os mais passivos na gestão de ativos, preferindo o uso de fundos de terceiros.
Com relação à alocação de ativos, a executiva aponta que o comportamento não difere muito do que é visto no mercado financeiro como um todo: ações e crédito privado estruturado aparecem como as principais escolhas. Para a consultoria, o dado sugere uma maior busca por liquidez e retorno previsível, com 70% dos family offices citando ações, crédito estruturado ou segmento imobiliário como prioridade.
O setor financeiro é o favorito dos gestores. “O interesse em infraestrutura e agronegócio reforça a busca por investimentos em ativos reais e setores estratégicos da economia brasileira. Tecnologia aparece entre os setores de interesse, mas ainda de forma menos expressiva do que os setores tradicionais”, aponta a consultoria.
Entre os Family Offices que divulgam informações sobre alocação, 70% citam Ações, Crédito Estruturado ou Real Estate como prioridade.