Quando Monique Evelle contou pela primeira vez em um grupo seleto de pessoas que seria a mais nova investidora, ou Shark, do reality Shark Tank Brasil, foi surpreendida com as reações. “Você vai apresentar o programa?”, “Vai mostrar seu projeto”, “Quer buscar investimento de qual Shark?”.
Parecia impensável ao grupo que uma mulher preta de 28 anos se sentaria ao lado de grandes empresários brasileiros, como João Appolinário, fundador da Polishop, Carol Paiffer, CEO da ATOM, e José Carlos Semenzato, fundador e presidente do conselho da SMZTO, para ouvir pitchs de empreendedores e assinar os cheques. “As pessoas criam hipóteses para tentar justificar e não legitimar a minha posição”, diz ela.
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Monique, de fato, não representa o perfil do investidor-anjo no Brasil, majoritariamente masculino e branco, segundo pesquisa da Anjos do Brasil de 2022. “Comecei a fazer investimento-anjo com cheques de até R$ 500 mil, há quatro anos, mas de forma silenciosa. Agora, pela primeira vez, vai ter um holofote enorme em cima de mim.”
Baiana de Salvador, Monique começou a empreender aos 16 anos, ainda no ensino médio, sem dar nome para isso. “O termo não é empreender, é ‘sevirologia’, a sobrevivência de favela”, diz ela. Em 2011, criou o Desabafo Social, um negócio de impacto nas áreas de comunicação e educação que não toca mais hoje. “Eu só queria mudar o mundo. E depois descobri que dá para mudar o mundo e ganhar dinheiro ao mesmo tempo.”
Em 2017, a jornalista de formação participou do “Profissão Repórter”, da Globo, mas logo voltou aos negócios. No mesmo ano, foi reconhecida como Forbes Under 30 e em agosto de 2020, no auge da pandemia, fundou a Inventivos, uma plataforma de formação, conexão e investimento na nova geração de empreendedores brasileiros, que recebeu investimento do Black Founders Fund, fundo do Google For Startups.
No ano passado, Monique foi jurada do reality Self-Made Brasil e agora é a mais nova shark, e também a mais jovem jurada do programa na América Latina.
Em entrevista à Forbes, ela fala sobre sua trajetória e diz o que podemos esperar da sua participação no Shark Tank Brasil, que já finalizou as gravações e estreia no 2º semestre deste ano.
Forbes: Você conseguiu levar toda a potência de impacto social que é muito marcante na sua trajetória para o Shark Tank? Qual perfil de negócio você estava buscando?
Monique Evelle: Eu tenho minha tese pensando em startups, empresas de base tecnológica e principalmente B2B, mas a gente sabe que o Shark Tank é plural, não dá pra ficar só nisso. Eu já fui sabendo que a minha visão tinha que ser ampliada, então eu não estava fechada em um negócio, até porque podia me surpreender. Sobre impacto social, pensando que são mais de 60 pitches, você tem que ter um filtro pensando que é sobre negócio. Pode ser de impacto, mas não só isso. Eu não invisto em algo que não fatura. Precisei ter esse cuidado no programa, e também que não teria duas, três horas com cada pessoa para ficar explicando, é pouco tempo para saber o máximo possível dos empreendedores. E um terceiro ponto é que eu sou flexível nas porcentagens, não tenho problema de diminuir. Eu fui muito aberta às negociações, aos nãos e sins. E eu sempre investi sozinha, mas também aberta a coinvestir com outros tubarões se fizesse sentido.
F: O universo do investimento-anjo ainda é predominantemente branco e masculino. Como tem sido entrar e estar nesse meio?
ME: Considerando o mundo de startups e investimento, existe um perfil que não se parece comigo. Então o primeiro impacto é assustar: ‘Como a Monique pode ser investidora?’. Aí as pessoas criam hipóteses para tentar justificar e não legitimar a minha posição. Eu estou há 12 anos fazendo esse trabalho, já participei de outro reality, existe uma jornada para hoje eu estar na cadeira de Shark. A pressão externa significa fardo ou responsabilidade? Para mim, é responsabilidade, porque isso é exatamente o que eu estou fazendo e eu quero continuar fazendo. A gente vai desenhando os nossos sonhos de acordo com aquilo que a gente consegue enxergar de possibilidades.
Também tem a questão da idade, comparado ao universo de investimento, as pessoas passaram por multinacionais, têm uma idade média de 40 anos para cima. E aí eu tenho 28 e faço investimento desde os 24. Mas provavelmente, cada vez mais empreendedores que conseguiram resultados nos seus negócios vão se tornar investidores. E a ideia é essa, é um retorno também. Hoje, eu sou a Shark mais nova da América Latina. O mundo está olhando um trabalho que eu fazia nos bastidores e agora tem um holofote enorme em cima de mim. Mas eu espero que isso na verdade me dê mais vontade de continuar em movimento, porque com 28 anos eu estou aqui, mas eu tenho outros sonhos para realizar.
F: Você começou a empreender cedo. Como foi esse caminho? Teve algum tipo de apoio?
ME: Eu comecei aos 16, no ensino médio, então são 12 anos de jornada. E nesse caminho eu entendi que está tudo bem criar um negócio de impacto. Eu não sabia que o que eu estava fazendo era empreender, não tive mentores e mentoras inicialmente, mas quando eu cheguei aos 18, 19 anos, entendi que precisava estar perto de pessoas ou que já estavam fazendo isso há mais tempo ou que poderiam me dar suporte, inclusive emocional. Então eu tive algumas pessoas no caminho, não no sentido de mentoria, mas de acompanhar, porque eu acredito que o aprendizado mais barato é aprender com o erro dos outros. Eu me tornei uma ótima observadora, com as perguntas certas no momento certo, seja em eventos ou numa conversa. E aí fui aprendendo e entendendo que não existe fórmula mágica, mas que era possível seguir um quarteto de pontos para conseguir retorno financeiro com o que eu estava fazendo. O primeiro é ter métodos, depois toda a parte técnica, mas também duas coisas que a gente pode treinar: talento e intuição.
F: Estar sob esse holofote te trouxe algum tipo de insegurança? Como você está lidando com isso?
ME: É menos sobre insegurança e mais ansiedade. Eu tive que entender que quando eu entro no set de gravação, eu vou fazer a mesma coisa que faço quando a pessoa vai fazer um pitch para mim na Inventivos. Foi um exercício para não se importar com a câmera. A síndrome da impostora afeta a maioria das mulheres, se você é uma pessoa preta então. Quando chegou o convite, eu estava no meio de um parque da Disney, na montanha russa do Star Wars. E não consegui processar meu medo do brinquedo com a informação. Talvez a ficha só caia quando o programa for ao ar.
F: Como começou e como funciona hoje o seu trabalho como investidora-anjo?
ME: Eu já ajudava as pessoas a tirar as ideias do papel. E aí quando eu via que o negócio estava formatado de um jeito que faria sentido, comecei a pensar ‘por que eu vou indicar para fundos de investimento sendo que hoje eu consigo fazer investimento semente?’ Também já recebi mensagens de pessoas querendo apresentar um pitch para ver se fazia sentido investir ou fazer pontes. Para mim não é só o dinheiro, eu sou uma pessoa ativa nos negócios que eu invisto. Por exemplo, eu investi na Purple Metrics, uma empresa de branding que mede a elasticidade da marca, no ano passado, mas antes fui cliente. Eu sempre penso se vou conseguir ajudar no dia a dia também, com capital intelectual, contatos, possibilidades e pontes se empresa quiser fazer novas rodadas de investimento. Se for dinheiro pelo dinheiro, eu não faço.
F: Então você deve continuar acompanhando e apoiando os empreendedores para além do dinheiro depois do programa?
ME: 100%. Por um motivo: eu quero que a empresa cresça, estou torcendo pelo negócio que eu disse sim. E também por aqueles que eu disse não naquele momento. Talvez a pessoa não estivesse preparada ali, mas daqui um mês, dois meses, as coisas mudam, o negócio muda. Também tenho uma rede de fundos de investimentos parceiros que podem ajudar as empresas em novas rodadas de investimento, eles não vão hesitar em olhar com atenção. Se eu não conseguir ajudar em nada, por mais incrível que o negócio seja, por mais doloroso que seja dizer não, ainda posso tentar fazer a ponte.