Há pouco menos de dois meses, a IBM anunciou um movimento importante para acelerar sua estratégia de crescimento no setor de nuvem híbrida para impulsionar a transformação digital de seus clientes. A Big Blue comunicou ao mercado que estava separando a unidade de serviços de infraestrutura gerenciada de sua divisão Global Technology Services em uma nova empresa pública, chamada NewCo.
O spin-off, cuja conclusão está prevista para o fim do próximo ano, tem na mira um mercado de US$ 1 trilhão até 2024, com crescimento anual de dois dígitos segundo previsões da International Data Corporation (IDC). “Este é o momento certo para criar duas empresas líderes de mercado focadas no que fazem de melhor. A IBM se concentrará em sua plataforma de nuvem híbrida aberta e capacidades de IA. A NewCo terá maior agilidade para projetar, gerenciar e modernizar a infraestrutura das organizações mais importantes do mundo. Ambas as empresas estarão em uma trajetória de crescimento aprimorada com maior capacidade de fazer parcerias e capturar novas oportunidades – criando valor para clientes e acionistas”, disse, na época do anúncio, Arvind Krishna, CEO global da gigante de tecnologia.
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À frente da transição de clientes para a nova operação – que já nasce com 4.600 clientes em 115 países – está Ana Paula Assis, até então gerente geral da IBM para América Latina. A Forbes Insider conversou com a executiva para saber como anda seu trabalho no comando da companhia, seus principais objetivos e o papel da diversidade no cenário atual. Veja, a seguir, os melhores momentos da entrevista:
Forbes: Como está sendo essa nova fase e como ela está impactando sua rotina?
Ana Paula Assis: Está sendo uma oportunidade incrível, de aprendizado, porque eu tenho uma missão global, falando agora com clientes no mundo inteiro sobre um momento que é muito estratégico na história da companhia. É muito gratificante poder fazer parte de uma etapa tão transformadora na trajetória da IBM, que é uma companhia que está constantemente evoluindo e se adaptando às novas necessidades de mercado.
A minha rotina foi um pouco afetada pelo fuso horário porque estou trabalhando com gente que está na Austrália, no Japão, na Europa, então eu acabo tendo uma agenda um pouco mais complexa em termos de horários, mas nada que eu já não estivesse um pouco acostumada. Por outro lado, não tem mais a loucura de tantas viagens, como no início do ano, em função da pandemia. Então isso também abriu um pouco mais de espaço na agenda. Claro que é uma posição com muita intensidade, eu estou me dedicando muito, mas, sem dúvida, tenho um pouco mais de espaço para minhas atividades físicas, para ler. Acho que estou equilibrando bem os pratinhos.
F: E qual a sua principal missão na NewCo?
APA: Esse movimento que a IBM está fazendo tem o objetivo de consolidar a companhia como um player de relevância na indústria de computação em nuvem híbrida. Nós realmente acreditamos que as empresas vão ter que adotar arquiteturas flexíveis, no sentido de ter aplicações que serão mantidas dentro de casa, nos datacenters, outras que serão disponibilizadas em plataformas de nuvem pública. Mas é preciso desenvolver tudo isso de um jeito que depois seja possível acessar do ambiente mais adequado ao seu negócio.
Esse é um mercado estimado em US$ 1 trilhão e foi por isso que a IBM comprou a Red Hat há dois anos, numa operação de US$ 34 bilhões. O que estamos fazendo agora é mais um passo nessa jornada de nos posicionarmos como líderes no segmento de plataforma de nuvem híbrida. O meu objetivo nesse processo é conduzir os clientes nessa transformação. Com a separação das divisões, a NewCo já nasce gigante, com receita de US$ 19 bilhões, e o que a gente quer garantir é que os clientes que já têm contratos sejam transacionados para essa nova empresa de uma maneira segura, com a mesma percepção de qualidade de serviço que eles têm hoje, e que possamos construir com esses clientes uma jornada de transformação na qual eles se adaptem totalmente à essa nova realidade de mercado.
Durante a pandemia, os projetos de transformação digital foram muito acelerados e a adoção da nuvem cresceu substancialmente, assim como o uso da inteligência artificial. A demanda pelo Watson, por exemplo, dobrou entre fevereiro e maio deste ano. O mesmo aconteceu com outras APIs nossas. Então, claramente, há uma corrida por essas tecnologias, e nós queremos estar preparados e estruturados, da melhor maneira possível, para ajudar nossos clientes nessa transição.
F: Como tem sido a receptividade dos clientes?
APA: Muito positiva. Todas as empresas com as quais eu já conversei sobre essa transição acharam que esse movimento faz todo o sentido. O mercado bifurcou de fato, a forma como compramos infraestrutura e aplicações mudou. Hoje é tudo muito independente e as empresas precisam poder fazer escolhas por tecnologias distintas. E é exatamente por isso que acreditamos num conceito híbrido, porque a variedade de opções é enorme.
Temos uma estimativa de que, em média, as empresas terão seis ou sete nuvens com as quais terão que interagir. Ter controle sobre esses ambientes vai ser fundamental, principalmente porque as grandes companhias precisam responder por compliance, obedecer às agências reguladoras, garantir a proteção de dados, extrair inteligência do negócio.
F: Qual a importância do Brasil para a NewCo?
APA: O Brasil é um país muito relevante para IBM, sem dúvida está entre os principais, e o mesmo acontece com a NewCo. No ano passado anunciamos o IBM Cloud Multizone Region, o primeiro centro conectado de nuvem da América Latina e o país escolhido foi o Brasil. Isso é uma prova de como o país é relevante. Nós seguimos realmente investindo aqui, acreditando no potencial do Brasil.
F: Como a escolha de uma mulher brasileira para essa função foi encarada em nível global por seus pares?
APA: Super bem. O fato de eu ter passado por várias áreas da IBM que são muito importantes para estruturar esse trabalho que estou fazendo agora ajudou. Eu tenho um forte conhecimento da divisão de software e também de serviços. Por quase cinco anos fui responsável pela divisão de outsourcing de infraestrutura de TI no Brasil. Então a combinação dessas competências com o fato de eu ter liderado um mercado também muito importante pra empesa, que é um mercado interessante porque é muito plural e nos dá perspectivas diferentes, além de eu ter vivido na China e passado pelo headquarter da IBM contribuíram. É um conjunto de experiências, sejam multiculturais, sejam de negócio, que realmente me prepararam para chegar neste ponto. Acho que tudo isso ajudou para uma resposta muito positiva à nomeação.
F: Você já está no mercado de TI há algum tempo. Como enxerga a participação feminina nessa indústria? Melhorou ou piorou?
APA: Eu acho que as empresas, sem dúvida, aumentaram muito a consciência da importância de ter uma maior participação feminina, não só no mercado de tecnologia, mas no mercado como um todo, e principalmente de mais mulheres em posições de liderança. Então eu acho que a gente vive hoje um momento de muita consciência – embora ainda tenhamos um trabalho muito grande para que essa consciência se transforme em resultados efetivos, práticos.
Do nosso lado, temos reforçado cada vez mais iniciativas para capacitar as mulheres em tecnologia. Também temos políticas e ações para promovê-las, para realmente ter mais lideranças femininas. Esse esforço conjunto vai trazer resultados no médio prazo. Mas também acho que precisamos acelerar e direcionar o foco para que essa onda seja mais do que uma onda de boas intenções e para que sejamos mais consistentes em acompanhar essa evolução.
F: Você acha que a pauta do empoderamento feminino perdeu força à medida que outros grupos subrepresentados foram se destacando nos últimos anos?
APA: Não. Eu acho que, no fundo, o importante de tudo isso é a gente ter um debate muito amplo sobre diversidade. No final do dia, se tivermos feito algo para qualquer um desses grupos, estaremos contribuindo com todos. O que temos que trazer para a pauta é a importância de ter um ambiente inclusivo, aberto, que gere oportunidade para as pessoas independentemente de etnia ou gênero. Eu acho que essa consciência é tão importante que acaba ampliando a visão e levando o debate para o que realmente importa. Não queremos criar benefícios para um ou para outro. O que queremos é um mundo mais justo, onde todos tenham chances iguais. A discussão tem que passar menos pelos privilégios e mais pelas oportunidades. Precisamos acertar as distorções, resolver aquilo que gera obstáculos para que todos possam competir em nível de igualdade.
F: Você já viveu a síndrome do impostor? Como lidou com ela?
APA: Já. Teve um momento da minha carreira em que eu senti realmente que estava estagnada. Então eu recorri a um coaching e ela me disse que eu estava me autossabotando. Que eu mesma criava obstáculos para avançar – algo típico da síndrome do impostor. Eu tinha dúvidas sobre a minha capacidade, comecei a questionar se eu realmente merecia todas as oportunidades que a vida me apresentou. Acredito que, em algum momento, as mulheres foram mais afetadas por esse mal, mas hoje eu vejo que o problema é mais comum do que imaginamos. Sempre que eu falo sobre isso eu recomendo fortemente pedir ajuda, falar sobre o problema, porque ele é real.
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