Com o desemprego atingindo um pico histórico de 14% no Brasil, a startup Mottu atraiu o interesse de um grupo de investidores globais e bilionários para uma rodada Series A que visa acelerar seu plano de negócios focado em atender às necessidades dos trabalhadores da gig economy.
A Mottu tem como público-alvo pessoas que querem trabalhar no aquecido mercado de e-commerce como entregadores, mas não têm condições de comprar a moto para tal. Com o objetivo de “servir os que não são servidos”, a startup aluga motocicletas por uma média de R$ 35 por dia para desbancarizados e negativados e oferece seguro e manutenção, além de plugar seus clientes a uma rede de marketplaces como o Mercado Livre, aplicativos de delivery e varejistas que procuram para aumentar sua capacidade de logística “last mile”.
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Fechada na última sexta-feira (8), a primeira rodada institucional da empresa foi liderada pelo fundo de venture capital Base Partners com a Crankstart, fundação do bilionário galês, Forbes Midas List e investidor do Vale do Silício, Michael Moritz. Além disso, a Tiger Global Management investiu, com Griffin Schroeder trabalhando no deal. O investidor do Vale do Silício Tom Stafford e David Vélez, fundador do Nubank, também participaram da rodada.
Desde seu lançamento, há pouco mais de um ano, a startup levantou duas rodadas seed, a primeira fechada duas semanas antes da pandemia da Covid-19. Esses primeiros investimentos foram liderados pela Caravela Capital e envolveram nomes como Ariel Lambrecht e Renato Freitas, cofundadores da 99 e da Yellow, além de Vélez, que conectaram a empresa a investidores internacionais. Em sua última rodada em maio de 2020, a empresa levantou US$ 2 milhões em recursos, a um valuation de US$ 17 milhões; o mais recente aporte leva a empresa a um nível significativamente mais alto, em ambos os aspectos.
A Mottu iniciou sua operação com menos de 200 motocicletas e atualmente possui mais de 1 mil unidades; todas estão alugadas e a empresa está inundada com a demanda de entregadores de primeira viagem. De acordo com o fundador da Mottu, Rubens Zanelatto, a empresa espera ter uma frota de 10 mil motos até o final do ano e investir em pessoas, bem como em melhorias para o que define como uma plataforma tecnológica que ajuda entregadores a prosperar.
“A maioria das empresas de tecnologia de sucesso apoiadas por VCs no Brasil tem alguma correlação com o que está sendo feito em outros lugares e são muito mais modernas, mais sexy. Estamos fazendo algo realmente diferente para um público que antes era ignorado: isso é o que mais me motiva”, disse Zanelatto, em entrevista exclusiva à Forbes.
“[Os novos patrocinadores internacionais de Mottu] buscam oportunidades não óbvias, e acho que nossa coragem para executar, bem como nossa mentalidade de hustler se destacou”, acrescentou ele, referindo-se aos fatores que atraíram o pool de investidores globais para a rodada.
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De acordo com o sócio da Base, Fernando Spnola, a empresa adotou uma abordagem inovadora para a questão da logística da última milha, criando uma solução focada no lado da oferta da equação. “Ao colocar o courier no centro [de seu modelo de negócio], a Mottu não está apenas fazendo o bem para eles, mas também construindo uma plataforma para o avanço do comércio online e da logística no Brasil”, observou o investidor, que se tornou parte do conselho da startup.
O crescimento do e-commerce brasileiro que os entregadores da Mottu atendem também salta aos olhos. De acordo com o relatório Webshoppers, da eBit Nielsen, os seis primeiros meses do ano passado somaram R$ 38,8 bilhões em faturamento para as lojas eletrônicas no país, um aumento de 47% em comparação com o primeiro semestre de 2019.
Esse incremento no comércio eletrônico não ficou apenas vinculado ao faturamento, mas também ao número de consumidores. O primeiro semestre de 2020 finalizou com 41 milhões de clientes que realizaram pelo menos duas compras pela internet. O número representa um crescimento de 40% ante os primeiros seis meses de 2019.
Dado o crescimento que a Mottu tem visto em sua curta trajetória e seus ambiciosos planos de crescimento, uma rodada da Série B pode não estar muito longe. “Queremos construir uma das melhores empresas de tecnologia do Brasil. Para fazer isso acontecer, há muito trabalho e investimentos a serem feitos”, disse o empresário de 34 anos. “Considerando o tipo de investidores que atraímos, muitas pessoas vão querer olhar nossa próxima rodada, mas ainda não dá para dizer quando isso deve acontecer.”
Para cumprir sua proposta de negócio que torna o aluguel de uma motocicleta mais acessível aos trabalhadores da gig economy do que comprar uma – uma moto básica nova não custa menos que R$ 8 mil- a Mottu faz uso intensivo de tecnologia. No entanto, isso não se aplica quando se trata de aceitar clientes com histórico de crédito ruim ou inexistente.
“Se a habilitação [do cliente] estiver OK e com menos de 20 pontos, alugaremos uma moto para ele. Essa pode ser a maior inovação: confiar nas pessoas”, argumenta Zanelatto. Por outro lado, uma vez que o cliente adere ao serviço, a empresa faz uso intenso de telemetria para monitorar e construir um score de veículos e usuários, e para combater roubos.
Juntamente com o custo de manutenção e as taxas de inadimplência do cliente, o roubo estava entre as principais preocupações iniciais da equipe da Mottu. Porém, segundo Zanelatto, a operação tem superado as expectativas. “Ficamos positivamente surpresos em relação ao que havíamos previsto”, disse o curitibano, fundador de segunda viagem, que se descreve como um “cara normal fazendo algo grande”, com um perfil que destoa do padrão de fundadores de unicórnios brasileiros com diplomas de universidades de ponta e passagens em bancos de investimento no currículo.
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Segundo o fundador, que se diz movido pelo propósito de ajudar pessoas a terem melhores chances na vida, o trabalho também busca endereçar complexas questões socioeconômicas. Segundo um estudo da empresa de venture capital Flourish com 500 trabalhadores da chamada economia compartilhada no Brasil, 88% dos entrevistados relataram uma queda significativa de renda após o início da pandemia e medidas restritivas em março de 2020. Além disso, 77% disseram ter visto um declínio em sua qualidade de vida por conta da diminuição da receita mensal e dificuldade em pagar contas. Quase 75% dos entrevistados confirmaram que não conseguiriam ficar um mês sem ter a receita proveniente dos aplicativos.
Olhando para o futuro, Zanelatto espera construir uma trajetória de sucesso, que define como a capacidade de criar valor para os investidores, enquanto “muda a vida de pessoas em quem ninguém tinha acreditado antes” no processo. “As pessoas estão desempregadas e sem chance de encontrar trabalho, pois não têm as competências que a nova economia exige – a Mottu existe para permitir que essas pessoas ganhem a vida. Queremos fazer parte do Brasil que dá certo.”
Angelica Mari é jornalista especializada em inovação e comentarista com duas décadas de atuação em redações nacionais e internacionais. Colabora para publicações incluindo a FORBES (Estados Unidos e Brasil), BBC e outros. Escreve para a Forbes Tech às quintas-feiras
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