Eu não planejava me tornar uma empreendedora quando entrei no mestrado da Universidade de Stanford. Nos primeiros anos, eu convivia praticamente apenas com pesquisadores e cientistas da Escola de Educação. Mas lá por 2013, eu já era uma das poucas interessadas em inovação e tecnologia – talvez por esse motivo, nos anos seguintes, meu mundo aos poucos se fundiu com o mundo do empreendedorismo.
Ao longo dos últimos dez anos, trabalhei com empreendedores brilhantes e entendi os agentes do ecossistema. E nesse universo tech, conheci a diferença entre os tipos de empreendedores. Hoje trago um olhar rápido sobre dois perfis: o de palco e o raiz. Você reconhece quem é quem?
Leia também:
- Inteligência Artificial: amiga ou inimiga das empresas?
- Fernando de Noronha e a cena Tech
- Três coisas que toda empreendedora de sucesso precisa ter
Também conhecidos como “low-profiles”, os avessos ao palco focam na operação, produto, e/ou tecnologia. Mas o outro tipo é o exato oposto: são energizados pelos holofotes. Esses perfis podem ser chamados de “empreendedor-raiz” e “empreendedor de palco”, respectivamente.
O empreendedor raiz é alguém genuinamente comprometido com a “maratona” empreendedora e com o problema que quer resolver. Geralmente, essas pessoas têm as seguintes características: 1) paixão pelo problema a resolver; 2) compromisso com o crescimento a longo prazo; 3) segurança para tomar riscos e enfrentar os inúmeros desafios pela frente; 4) expertise de seu mercado. Em quase todos os casos, o empreendedor tem a experiência de ter vivido a dor que seu produto está atacando.
Por outro lado, o chamado “empreendedor de palco” é um perfil mais sazonal. Ou seja, é passageiro, está empreendendo por um certo período durante a carreira. Muitos entram no empreendedorismo para um projeto específico, oportunidade ou fase da vida. Eles não são necessariamente comprometidos a longo prazo. E, obviamente, empreendedores de palco brilham em frente ao público. Se energizam com likes nas mídias sociais, palestras e eventos. Todos têm uma grande habilidade de comunicação. Todos são “a cara da empresa”, o principal porta-voz, a referência de liderança no seu mercado.
Eu convivo com ambos os perfis (e também com outros tipos de empreendedores), e me surpreendo positivamente com a pluralidade dos empreendedores-raiz nas aulas em Palo Alto. Nesses encontros, interajo com pessoas de todas as regiões do Brasil, que estão de passagem pelo Vale do Silício em um programa de imersão em inovação.
Em todas as turmas, eles contam sobre a construção das suas empresas, algumas vezes fundadas por seus pais. São histórias de famílias nas quais o empreendedorismo é passado de geração em geração. Percebo que muitos empreendedores-raiz são de um tempo em que empreender não era necessariamente sobre tecnologia. Empreender era sobre inovar diante das circunstâncias da vida trazidas por guerras do século passado ou por não ter outra escolha a não ser criar seu próprio trabalho. Hoje, os líderes dessas empresas querem trazer novas tecnologias para seus negócios.
Já no meu dia-a-dia como CEO de uma empresa de tecnologia, tenho convívio com outros perfis de empreendedores, inclusive com o tipo “empreendedor-de-palco”. No ecossistema atual, as mídias sociais e eventos de todos os tamanhos e formatos são parte de estratégias de branding e de growth e dependem, de certa forma, da capacidade do empreendedor em networking. Nesse mundo, a habilidade de performar e comunicar seu sonho passou a ser cada vez mais necessária. Aqueles que sabem brilhar no palco são na maioria das vezes os mais valorizados, e no final do dia levantam quantias enormes de investimento para suas startups.
O que isso tem de importante? Isso importa porque conseguimos visualizar o empreendedor-raiz tanto quanto ou ainda mais do que os de palco, aqueles que têm mais projeção e visibilidade, e com isso valorizar e apoiar aquele que está na longa maratona de resolver um problema real: o que é importante de verdade para o seu público alvo. Acredito que todo empreendedor busca mudar o mundo com uma boa dose de coragem e determinação, independentemente de como veio parar no empreendedorismo.
Com tantos problemas, ou melhor, tantas oportunidades para novas soluções, todo empreendedor tem seu mérito. Eu não esperava me tornar empreendedora. Demorei muito para me sentir pronta e me autorizar. Tendo vivido a dor que procuro resolver e estar no mercado há mais de uma década, eu me considero uma empreendedora-raiz. Porém, como nasci na era de palcos, consigo transitar no mundo de eventos, me identificando parcialmente com a turma do palco. Posso dizer que quanto mais experiência dentro do seu mercado, mais vivência na dor que quer atacar, e mais habilidade em atrair gente boa para seu time, maior é a chance de sucesso. Assim como eu consegui, acredito que todos que quiserem também podem. Por isso, hoje abro as portas para mais empreendedores corajosos e determinados, sejam eles de todas as naturezas. Saudações a todos.
Iona Szkurnik é fundadora e CEO da Education Journey, plataforma de educação corporativa que usa Inteligência Artificial para uma experiência de aprendizagem personalizada com o maior portfólio de conteúdos do mercado. Com mestrado em Educação e Tecnologia pela Universidade de Stanford, Iona integrou o time de criação da primeira plataforma de educação online da universidade. Como executiva, Iona atuou durante oito anos no mercado de SaaS de edtechs no Vale do Silício, onde mora até hoje. Iona é também cofundadora da Brazil at Silicon Valley, fellow da Fundação Lemann, mentora de mulheres e investidora-anjo.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.