A Orbia, plataforma que reúne marketplace de insumos, programa de fidelidade e trading de produtos do agro, vai iniciar operações no setor de café, além de expandir seus negócios, hoje concentrados no Brasil, para outros três países da América Latina. Nas commodities, o foco atual são a soja e o milho. “Estamos com aproximadamente R$ 750 milhões em transações e a meta é finalizar esse ano por volta de R$ 1,5 bilhão”, afirma Ivan Moreno, CEO da empresa.
Em entrevista exclusiva à Forbes, ele contou os detalhes dessas duas operações em andamento, que devem alavancar os negócios definitivamente para a casa do bilhão, e também falou do futuro do marketplace, um setor que tem crescido na pandemia e o agro não está fora desse salto. No ano passado, de acordo com a consultoria italiana Finaria.it, o mercado global online, utilizado por 3,4 bilhões de compradores (9,5% acima de 2019), movimentou US$ 2,4 trilhões, com previsão de US$ 3,4 trilhões em 2025.
A Orbia nasceu como um programa de fidelidade da multinacional Bayer no Brasil, em 2012, utilizando a tecnologia da Bravium, empresa de e-commerce e programas de fidelização. Em 2019 foi criada uma joint venture entre as duas empresas, estendendo a plataforma dos serviços para além dos clientes da Bayer e ampliando a área de atuação. Hoje, na coalizão há 10 parceiros na plataforma, entre elas a farmacêutica veterinária Boehringer Ingelheim; a Agrifirm e a Compass, ambas da área de nutrição animal; a Mosaic, do setor de fertilizantes, os cartões de crédito do Sicredi e até empresas de fora do agro, como a Fast Shop e a Movida. “O que nos determina como um programa de coalizão setorial é a base de clientes, porque hoje estamos com cerca de 183 mil produtores cadastrados na plataforma. Isso, em área plantada, representa cerca de 70% da área cultivada do país”, afirma Moreno.
A primeira parte da expansão, no caso o serviço de trading para a cafeicultura, está prevista para entrar em atividade entre setembro e outubro. A plataforma está sendo montada em parceria com a multinacional Eisa Interagrícola, uma subsidiária do grupo suíço Ecom, que teve sua origem na Espanha. Atua em 40 países, sendo uma das maiores tradings do mundo em café e algodão. Está no Brasil desde 1935, no mercado do algodão, e desde 1959 no café, nos estados de Minas Gerais, Bahia, Espírito Santo, Goiás, Rondônia e Mato Grosso do Sul. Além da soja e do milho, mais a estreia do café, a meta da Orbia até 2022 é entrar nos mercados de algodão, feijão e cereais de inverno, entre eles o trigo. Moreno não confirmou se as tratativas para o algodão também vêm sendo feitas com a Eisa.
Um exemplo da relação da Orbia com os produtores, tendo na negociação parcerias fechadas com grandes empresas, é o caso da multinacional Bunge para a compra de commodities – lembrando que elas também podem ser compradas por cooperativas e distribuidores de insumos. No caso da Bunge, a parceria ocorre desde novembro do ano passado, com cerca de 2 milhões de sacas de soja já comercializadas. “Do ponto de vista do produtor rural, a gente consegue ficar junto com ele durante todo o período de safra de maneira digital. O produtor pode comprar insumo na plataforma, acumular pontos no programa de fidelidade, trocar por serviços durante a safra e, quando estiver com a lavoura estabelecida, pode comercializar a safra”, diz Moreno. “A plataforma, de fato, é o fio condutor que conecta todas essas partes, porque no fim do dia o que fazemos é colocar estes atores do agronegócio num único ambiente, possibilitando transações entre eles.”
Para o programa de fidelidade os menus são exclusivos, embora o produtor possa encontrar produtos como celular, computador e TV. Nos exclusivos estão disponíveis para resgate produtos agronômicos, como silo bag, disco de plantadeira, etc. “Há um menu amplo de serviços, desde a consultoria de um professor da Esalq, que visita as fazendas, até licenças de softwares de agricultura de precisão, voo de drone e missões técnicas para Israel ou o Vale do Silício”, afirma Moreno. Ou intervenções ainda mais delicadas, como é o caso da sucessão familiar, com consultorias focadas nesse processo. No ano passado, 42 mil resgates foram realizados na plataforma e cerca de 70 mil produtores acumularam pontos.
Rumo à expansão
Com a estrutura azeitada no Brasil, o voo para a América Latina começou a ser estudado em meados do ano passado. “Começamos justamente por acreditar que o modelo de negócio, com pequenos ajustes, seria replicável para boa parte dos países que têm um processo de distribuição de insumos parecido com o processo do Brasil, e que também não contavam com programas de fidelidade dedicados ao produtor rural”, afirma o executivo. Os países eleitos foram Argentina, México e Colômbia, com uma ajuda bem-vinda da Bayer que também tem realizado estudos para expandir sua mecânica de fidelidade a esses países. “Juntamos o desejo de expandir e replicar o nosso modelo com o desejo da Bayer de expandir o programa de fidelidade”, diz Moreno.
As primeiras operações no México e na Colômbia começaram em junho. Na Argentina, elas devem começar no início de agosto. O atual cenário econômico do país, no qual o governo chegou a proibir exportações de proteína visando conter a crise econômica interna, não arrefeceu os planos da Orbia. “A gente vai mesmo assim”, declara Moreno. “Por acreditarmos muito que nosso modelo de negócio não seja oportunista. Os fundamentos do negócio agrícola na América Latina são muito sólidos, pela impossibilidade de expandir grandes áreas agrícolas em outras regiões, como na América do Norte e na Europa.”
No caso da Argentina há um esforço de estruturação em trader de grãos, como ocorreu no Brasil. Outra singularidade entre os dois países é terem um mercado muito dependente de crédito, em se tratando de meios de pagamento. Já o México e Colômbia destoam nesse cenário. “Essa é a beleza do modelo de negócio. Independentemente das culturas que são mais relevantes em cada país, o modelo é adaptável”, diz Moreno. O México, por exemplo, tem uma produção de milho relevante, mas voltada ao mercado local, com 70% dos negócios realizados à vista. Na Colômbia, com exceção do café, ocorre o mesmo. “Por isso demos um peso menor na busca de instituições financeiras, para dar prazo, e um peso maior em meios de pagamento que facilitem a transação à vista.” Com isso, no México e na Colômbia, a primeira etapa de atuação será em fidelidade e venda de insumos, deixando a expansão da trader de commodities para o fim do ano ou início do próximo. Na Argentina, a entrada se dará com os três modelos de negócio da Orbia.
O plano da empresa é que a partir da consolidação da operação nesses países, eles possam funcionar como hubs para as demais geografias. “Muito provavelmente, a Argentina pode ser um hub para Paraguai, Chile e Uruguai. E o México pode ser um hub para a região das ilhas”, acredita Moreno. Não por acaso, o headquarter continua no Brasil em todas as transversais, entre elas finanças e desenvolvimento de produtos, com times nativos para as operações responsáveis pela geração dos negócios de insumo, fidelidade e commodities. Atualmente são 106 colaboradores, ante 35 no início da joint venture, contando profissionais dos times de tecnologias necessárias à transformação digital, e os tradicionais de business e ciências agrárias, como agrônomos, por exemplo.
Mais digitalização no campo
Moreno, formado em TI (Tecnologia da Informação), é um profissional experiente. Ele já passou por grandes companhias do agro, como a própria Bayer, na qual atuou por nove anos, além das multinacionais FMC Agrícola e Syngenta, também permanecendo por grandes períodos. Segundo o executivo, ao contrário do que muita gente acredita, o produtor rural sempre foi um usuário forte de tecnologia. “Houve o período de muita tecnologia embarcada nos produtos”, afirma.
A referência são as colheitadeiras, tratores e implementos para manejo agrícola, mais tecnológicos, introduzidos nas lidas das fazendas nas últimas décadas. “Agora, o produtor está começando a adotar a tecnologia para o que chamamos de fora da porteira. Há uma conjunção de mais soluções – a Orbia é um exemplo –, de acesso à tecnologia e uma mudança geracional no mercado.” A conta é simples, dividida em duas partes: uma é a geração do final da década de 1980, iniciando o embarque de tecnologias; a outra é a atual geração com os desafios da transformação dos negócios e que já é um nativo digital com um nível educacional muito maior. “Esse movimento digital já estava acontecendo e o que a pandemia de Covid fez foi encurtar o tempo”, afirma Moreno. “A gente estava em um processo de evolução que deveria demorar mais dois ou três anos, e a pandemia fez tudo virar em um ano só.”
Moreno relata que logo no início da pandemia já houve um alargamento do universo digital porque o produtor “estava com medo de receber o vendedor na fazenda”. Aumentaram todos os tipos de abordagem à distância: o contato por telefone, a formalização de propostas por meio do marketplace e a aceitação do produtor. “São coisas que ele não conseguia fazer antes, à distância, e ia até o distribuidor, por exemplo.” Hoje, o distribuidor está cada vez mais ativo, dentro da plataforma para atender esse público.
A oferta de produtos digitais ao mercado de agro tende a aumentar de forma consistente, na visão de Moreno. “Vão surgir outras empresas – não sei se com a proposta de valor completa das três partes que atuamos –, mas já temos algumas, como a Agrofy, a Magalu, entre outras”, afirma. E destaca grandes desafios para a atuação no agronegócio, sendo um deles a logística específica para alguns produtos. Como os defensivos agrícolas que não podem dividir espaço com nenhuma carga.
Outro ponto é a legislação específica com produtos que necessitam de prescrição agronômica. “Então, sim, terão outros marketplaces, mas não necessariamente especialistas”, diz Moreno. “Nesse sentido, por termos sido a primeira ferramenta, e termos um senso de pioneirismo, a gente conseguiu conquistar relevância do mercado com a construção da nossa base de dados, o que traz um pouco dessa certeza de que estamos no caminho certo.” Moreno acredita que nos próximos anos haverá espaços para parcerias entre empresas alinhadas à transformação digital e que o surgimento de novos projetos é bem-vindo. “A parcela de soluções digitais no agro ainda é pequena em relação ao tamanho do mercado. Acho que as soluções podem ir para um caminho de colaboração, para aumentar a fatia no mercado e aí sim, quando tiver um tamanho relevante, partir para a concorrência.”
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