A indústria de carnes da região Sul, principal consumidora de milho para ração no Brasil, está elevando as compras externas do cereal vindo do Paraguai como uma alternativa para driblar os altos custos de produção, e já encontra no país vizinho o grão a preços mais competitivos, conforme membros do setor e analistas ouvidos pela Reuters.
De um lado, os preços locais do milho foram impulsionados pela guerra na Ucrânia e expectativas de maior exportação do Brasil, principalmente caso se confirme um recorde de produção na segunda safra. Do outro, os paraguaios também iniciam em junho uma colheita de safra cheia e contam com localização estratégica para entregas no Sul, embora uma operação de fiscais agropecuários brasileiros na fronteira preocupe a cadeia.
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A Cooperativa Central Aurora Alimentos, terceira maior processadora de aves e suínos no Brasil, disse à Reuters que irá comprar milho do Paraguai.
“As principais unidades industriais da Aurora Coop estão localizadas no oeste de Santa Catarina, região próxima do Paraguai, situação que facilita essa operação”, afirmou em nota o vice-presidente de agronegócios da cooperativa, Marcos Antonio Zordan.
Ele disse que o insumo virá por rodovia e entrará no país pelo Porto Seco de Dionísio Cerqueira, região catarinense.
“O volume de compras dependerá da negociação de preços.”
A consultoria paraguaia DasAgro estima as exportações de milho do país entre 3,5 milhões e 3,8 milhões de toneladas, das quais 2 a 2,5 milhões podem vir para o Brasil neste ano comercial, iniciado em maio no Paraguai. Esse volume seria cerca de o dobro do visto no ciclo passado.
“De maio/2021 a abril/2022 as exportações de milho paraguaio somaram 1,3 milhão de toneladas, sendo 99% para o Brasil”, disse à Reuters a sócia diretora da DasAgro, Esther Storch.
Segundo ela, o milho exportado pelo Paraguai está cotado em torno de 230 a 235 dólares por tonelada na fronteira, mais frete de US$ 5, com entrega prevista entre junho e julho.
Isso significa que a tonelada importada custaria cerca de 1.142 reais por tonelada, considerando câmbio futuro com dólar a 4,76 reais.
O analista da S&P Global Gabriel Faleiros calcula que, no mercado interno, o milho esteja cotado em Cascavel (PR) a R$ 1.475 por tonelada, e mesmo com a entrada da colheita nacional, em junho/julho, este valor ficaria próximo da paridade de exportação para o período, por volta de R$ 1.400, já que o país está entrando na temporada de exportações.
“Se a gente pegar a fronteira do Paraguai em Salto del Guairá, é bem próximo de Cascavel, ou até mesmo Foz do Iguaçu (PR), o frete é pequeno… Então, de fato, o custo dessa importação do Paraguai é mais barato que o nosso e faz sentido essa comparação”, disse ele.
“Também estimamos exportações fortes este ano e isso contribui. A gente imagina que, com volumes muito expressivos de milho saindo do Brasil, isso contribui para termos volumes entrando neste ano, principalmente nos últimos meses.”
Boa parte da exportação de milho do Brasil sai pelo porto de Santos, onde o produto chega em grande medida por meio de ferrovia, trazido do Centro-Oeste. Já o Sul do Brasil não tem uma logística tão favorável para receber o cereal de Mato Grosso, por exemplo.
Neste cenário, o presidente da Associação Catarinense de Criadores de Suínos (ACCS), Losivanio Luiz de Lorenzi, afirmou que o Estado perdeu muita produção com seca no ano passado, e agora terá que importar 4,5 milhões de toneladas “não só do Paraguai, mas ele (país) com certeza será um grande fornecedor”.
O vice-presidente do sindicato de aves do Paraná Sindiavipar, José Antônio Ribas Júnior, destacou que as indústrias “têm buscado mais grãos do Paraguai, pois é um grão de excelente qualidade tal qual o do Brasil”.
“No Brasil enxergamos uma safra boa, mas precisamos trabalhar para não ficarmos tão expostos (aos custos)”, comentou, citando que o setor tem utilizado as importações e cereais de inverno como alternativas para reduzir as despesas com alimentação animal.
Vizinho
A diretora da DasAgro disse que a produção do cereal que começará a ser colhido em junho está estimada em 5,5 milhões de toneladas, contra 3,135 milhões no ciclo anterior.
Isso porque a área de plantio da “safrinha” paraguaia atingiu 910 mil hectares, número 20% maior que o do ano anterior e 33% acima da média histórica dos últimos cinco anos.
“Os preços do milho foram um disparador para o aumento no plantio, mas também a colheita de soja que se antecipou muito devido à seca, e às perdas da safra de soja verão”, disse ela, descrevendo um cenário semelhante ao ocorrido na safra brasileira da região Sul.
“Então parte do motivo para uma produção maior foi aproveitar a janela de plantio de milho e antecipar em quase 30 dias este ano o plantio”, acrescentou. A janela ideal para semeadura do cereal no país vizinho é o mês de fevereiro.
Ela ressaltou, porém, que tem sido difícil manter embarques fluídos ao Brasil, principalmente pela fronteira Ciudad Del Este/Foz do Iguaçu, que representa 50% das exportações de milho aos brasileiros, devido à operação padrão dos fiscais agropecuários que elevou o tempo médio de transporte na região de 3 para 10 dias.
“Se não se resolver esta situação de fronteira, permitindo um fluxo contínuo dos embarques, provavelmente as exportações de milho do Paraguai serão mais massivas através da Hidrovia Paraguai/Paraná, que demora de 15 a 20 dias.”