A VitroLabs está em uma missão para criar o chamado couro ecológico a partir de células de bovinos, boi ou vaca. Lançada em 2016, a empresa de Milpitas, na Califórnia, desenvolveu um processo de engenharia de tecidos que coleta algumas células desses animais (potencialmente poderia ser de avestruzes ou crocodilos), as nutre e as transforma em peles com espessura semelhente àquelas de couro bovino.
“Estamos cultivando peles de animais reais em um laboratório e transformando-as em couro”, diz o cofundador Ingvar Helgason. Ele acrescenta que, quando, junto com o cofundador, Dusko Ilic, produziu sua primeira amostra, “parecia ficção científica”.
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Agora, Helgason está cada vez mais perto de tornar sua criação em um produto vendável. Ele acabou de fechar um financiamento de Série A, liderado pela Agonomics, para construir e dimensionar a produção piloto, elevando o valor total arrecadado para US$ 46 milhões (cerca de R$ 233 milhões). Com isso, o projeto está de casa nova, uma instalação de 4.180 metros quadrados, projetada para fabricação e espaço para o laboratório.
A VitroLabs não é a única empresa que busca alternativas ao couro animal, bem como substitutos à base de plástico. Outros concorrentes estão usando tudo, desde cogumelos até colágeno recombinante produzido em levedura para realizar a tarefa.
Como funciona a técnica do couro de laboratório
Depois de realizar uma biópsia em um bovino, os cientistas alimentam as células coletadas em um biorreator rico em nutrientes. As células se autorregeneram, de acordo com a empresa, então a biópsia só precisa ser feita uma vez. Em seguida, as células formam um tecido semelhante ao couro animal. Após a fase de crescimento, que leva de três a quatro semanas, os couros são enviados para o curtimento.
A empresa [tem como propaganda] que o animais são poupados e que pode haver uma redução significativa no impacto sobre o desmatamento e as emissões de carbono. Também há o processo de curtimento, que segundo Helgason, normalmente usa muitos produtos químicos, muita água por ano e exige o transporte de couros por milhares de quilômetros para curtumes. Helgason diz que, trabalhando com parceiros, eles desenvolveram um processo que utiliza 90% menos produtos químicos do que o método convencional. Além disso, diz que as células crescem apenas até a espessura necessária durante o processo de cultivo. Isso simplifica e abrevia o processo de curtimento, com grande redução do impacto ambiental.
Rebelde no colegial
Helgason abandonou o ensino médio em sua cidade natal de Reykjavik, na Islândia, com o objetivo de se tornar um designer de moda. Em 2006, após várias mudanças, se instalou em Londres e fundou uma empresa de moda. Nessa época, algumas casas de leilões de peles o procuraram para ver se ele poderia ajudar a resolver o problema de imagem deles.
Isso fez com que Helgason se interessasse pela luta para encontrar substitutos para peles e couro, motivado em parte por seu fascínio de longa data pela ficção científica. Ele se lançou em um período de intensa pesquisa. “Sem conhecimento da tecnologia, pensei em qual seria o nível de dificuldade nessa transformação?” ele diz.
Então, depois de fechar sua empresa em 2015 – havia problema de fluxo de caixa na empresa – Helgason decidiu se mudar para a Califórnia. Lá, começou suas pesquisas. Quando pesquisou “como cultivar pele em laboratório”, encontrou o trabalho de Dusko Ilic. Na época atuando como professor de ciência de células-tronco no Kings College London, o co-fundador da empresa estava tirando seu ano sabático e fazendo pesquisas na Universidade da Califórnia, em São Francisco.
Quatro ou cinco e-mails depois, Illic respondeu e eles marcaram uma ligação de 20 minutos. Isso se transformou em três horas e, eventualmente, uma parceria e o lançamento do VitroLabs. Illic retornou a Londres em 2018, mas ainda é um conselheiro ativo.
Nos anos seguintes, os parceiros acabaram mudando a tecnologia subjacente algumas vezes, enquanto trabalhavam para construir uma plataforma eficiente com potencial para escalar e produzir um produto que lembrava couro real, diz Helgason. Mas, a nova injeção de dinheiro os ajuda a se aproximar do estágio piloto.
O plano é escalar lentamente, com foco no mercado de luxo, que tem um volume de produção menor do que o mercado de massa. “Qualquer tecnologia que sai de um laboratório começa com volumes menores e aumenta a partir daí”, diz ele, apontando o lançamento do Impossible Burger em 2016 como um exemplo.
* Anne Field é colaboradora da Forbes EUA e escreve sobre empreendimentos sociais com fins lucrativos, bem como empreendedorismo e pequenas empresas em geral.