Hoje escrevo sobre uma discussão que aparece a cada quatro anos. Mas não estou falando de eleições. Estou falando da Copa do Mundo que, coincidentemente, acontece no mesmo ano das eleições presidenciais no Brasil. Seu acontecimento gera uma discussão sobre se ela acaba aquecendo o consumo de carne bovina — por conta dos jogos, o pessoal faz mais churrasco — ou se não traz influência. E, caso aqueça, se isso traria uma chance do boi gordo acabar subindo, trazendo consigo o efeito dessa demanda maior de carne.
Para entender se isso traz um efeito prático ou não, a gente trouxe uma análise exclusiva realizada em conjunto com toda a minha equipe para falar sobre a realidade dos fatos e como esse mercado tem se comportado nos anos anteriores de Copa do Mundo.
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Em primeiro lugar, o pessoal costuma associar o ano de eleição e de copa e pergunta “você não acha que pode subir o preço?”, mas existe uma diferença bem grande entre os dois eventos. Eleições sempre fazem com que ocorra a distribuição de dinheiro, um aumento da disponibilização monetária na economia, por conta do fundão eleitoral ou pelos financiamentos de campanha que ocorriam antigamente. Então isso é dinheiro entrando na veia. É um estímulo muito mais forte do que algum feriado em que as pessoas voluntariamente, sem aumento monetário, se encontram para fazer um churrasco. Isso acontece, mas a disponibilização é muito mais efetiva do que o feriado.
Em segundo lugar, vamos analisar de maneira exclusiva e isolada os momentos de Copa do Mundo. Historicamente, elas são realizadas entre junho e julho. Esse ano agora vai começar em novembro. Então nós pegamos os comportamentos entre oferta e demanda e analisamos de maneira separada nos mês de junho e julho dos anos de Copa do Mundo anteriores. Primeiramente, focamos na produção, pois tudo parte dela. E depois dela entendemos o que vai virar oferta e demanda externa e interna. É assim que a gente desconstrói o equilíbrio entre oferta e demanda.
Quando a gente analisa a produção de carne, a gente puxa os dados de um mês antes para ver se existe uma antecipação das indústrias a essa possível maior demanda que existe em junho e julho. E de fato a produção de carne em anos de eleição e Copa do Mundo costuma acelerar em meados de maio. Então, analisando historicamente esse mês, foi possível perceber uma aceleração, mas muito pequena, em torno de 0,25% de produção a mais. Ou seja, não é nada que faz muita diferença.
Já quando olhamos o consumo doméstico, a gente vê o consumo doméstico mais ou menos mais alto entre junho e julho e uma movimentação grande de vendas no varejo ao longo dos meses. Então tem um aquecimento do consumo.
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Quando a gente olha o abate de animais, que tem tudo a ver com a produção, a gente observa que não tem uma grande diferença no volume, a não ser em maio, quando ocorre um aumentozinho. Em junho, esse abate costuma cair, possivelmente por pontos facultativos — o pessoal para ver um pouquinho dos jogos e a gente sabe que a movimentação do Brasil, que é um grande torcedor, acaba tendo algum efeito sobre o volume de abates. E a indústria parece já se preparar melhor para essa demanda um pouquinho maior em junho e a atividade menor em junho.
Olhando as exportações, de todos os indicadores, elas são de fato a única variável que parece mostrar uma reação mais interessante ao longo dos meses de Copa do Mundo. Por que isso? Falando com a indústria, a gente entende que com o bom desempenho do Brasil nos jogos, ou não, mas essa grande torcida global que torce pelo país, um efeito do destaque e das premiações que já recebeu, aquece o branding da carne brasileira lá fora e acaba trazendo um pouco mais de demanda em termos de exportações para esse mês. Normalmente, tem mais reflexo em julho, porque os pedidos acontecem em junho, quando a competição começa, e os embarques são realizados efetivamente entre um mês ou 45 dias depois.
Sob ponto de vista do preço do boi gordo, que é aquilo que mais interessa o pecuarista, o preço do boi não sofre grandes variações. Então a gente não pode esperar grandes altas vindas em decorrência do ano de Copa do Mundo focados nesses meses em que o campeonato é realizado. Mas há um efeito de aproximadamente 1,5% sobre o preço da carne no varejo. Então a gente tem um pouquinho de demanda a mais. As festividades aquecem e empolgam o consumidor que vai comprar no supermercado, mas a indústria normalmente já se antecipou e abasteceu, o que acaba não impactando muito no preço do boi durante os meses de competição.
Lygia Pimentel é médica veterinária, economista e consultora para o mercado de commodities. Atualmente é CEO da AgriFatto. Desde 2007 atua no setor do agronegócio ocupando cargos como analista de mercado na Scot Consultoria, gerente de operação de commodities na XP Investimentos e chefe de análise de mercado de gado de corte na INTL FCStone.
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