Um caso atípico da doença “mal da vaca louca” no Pará, que foi confirmado por autoridades sanitárias brasileiras, travou o mercado do boi gordo e deixou frigoríficos no Brasil em compasso de espera ontem (22), com abates suspensos em diversas regiões do país.
Analistas ouvidos pela Reuters disseram que as indústrias já estavam deixando de comprar gado desde segunda-feira, quando o caso começou a ser investigado, considerando a hipótese de paralisação das exportação de carne para a China – que, de fato, se confirmou.
O Ministério da Agricultura informou na noite de ontem que as exportações de carne bovina do Brasil para a China estarão suspensas temporariamente a partir de hoje (23), seguindo um protocolo sanitário oficial devido à confirmação de um caso da doença Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB).
Segundo comunicado da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará), trata-se da forma “atípica” da doença, que surge espontaneamente na natureza em gado mais velho, não causando risco de disseminação ao rebanho e ao ser humano.
O ministério comunicou o caso à Organização Mundial de Saúde Animal (OMAS) e as amostras foram enviadas para o laboratório referência da instituição em Alberta, no Canadá.
“Existe um protocolo entre Brasil e China que faz com que o Brasil aplique um autoembargo para carne bovina aos chineses caso seja confirmada a vaca louca atípica, que surge espontaneamente em animais mais velhos – e é o que está sendo investigado”, disse o head de Agro, Alimentos e Bebidas da XP, Leonardo Alencar.
Ele disse que a indústria estava em compasso de espera, pois enquanto não tinha a confirmação do caso no Pará, já não estava comprando principalmente o ‘boi China’, diante do risco de uma paralisação nas exportações.
Não havia imediatamente informações sobre quais unidades frigoríficas estavam com operações paradas, em um mercado operado por gigantes como JBS, Marfrig e Minerva. As empresas não se manifestaram de imediato.
O ‘boi China’ é um animal com idade inferior a 30 meses no momento do abate e no máximo quatro dentes incisivos permanentes, uma especificação sanitária dos chineses que compram a carne somente vinda deste tipo de gado, cujo preço tem um prêmio em relação ao valor convencional da arroba.
De acordo com analistas, os preços da arroba ainda estão estáveis no mercado físico, com tendência de queda diante da confirmação da doença, mas as cotações futuras já recuaram durante o dia quase 3% na B3.
O diretor da Scot Consultoria, Alcides Torres, disse que os abates que estavam programados não estão sendo realizados nos frigoríficos.
“Abates no país todo estão sendo suspensos desde a suspeita da doença. As boiadas que estavam agendadas saíram da programação. Não estão abatendo boi”, afirmou.
O analista da Safras & Mercado Fernando Iglesias também disse que, nesta quarta-feira, “grande parte das indústrias frigoríficas sequer divulgou preços para a arroba, outras simplesmente suspenderam abates em todo o Brasil”.
Ele destacou que os contratos do boi gordo no mercado futuro, cotados na B3, tiveram uma queda agressiva precificando o problema.
O analista da S&P Global Aedson Pereira afirmou que a partir da suspeita já houve um desconforto para a cadeia como um todo.
“Isso preocupa não só o pecuarista, mas gera uma preocupação da própria indústria pela possibilidade de não conseguir dar vazão à produção de carne… e o mercado interno está se arrastando”, disse ele.
Especificamente no Pará, onde o caso foi encontrado, Pereira acredita que o impacto seria ainda mais negativo, pois as praças pecuárias do Estado contam com os preços da arroba mais baixos do país, atualmente, e diferenças significativas em relação à referência de cotações de São Paulo.
Dados da S&P mostram que em Redenção (PA) o boi gordo está cotado em 226 reais por arroba no mercado à vista e 228 reais a prazo, contra 296 reais a prazo em São Paulo.