A demanda da China por soja brasileira está aquém do esperado, o que explica o fato de o país, mesmo com uma safra recorde, não estar batendo máximas mensais de exportação, afirmou o presidente da multinacional no Brasil, Paulo Sousa, à Reuters.
Segundo o presidente da maior exportadora de soja e milho do Brasil, essa situação permite por outro lado que a exportação brasileira de grãos seja mais constante ao longo do ano, reduzindo por ora um estresse no sistema logístico, que vai ser testado pelas safras recordes em 2023.
“A demanda está boa, mas não está aquela maravilha, não está tão aquecida, principalmente a chinesa, eles têm comprado, mas em um ritmo aquém do que o mercado esperava”, disse Sousa, em uma entrevista por conta da divulgação dos resultados do ano passado.
O lucro líquido da Cargill no Brasil caiu para R$ 1,2 bilhão em 2022, informou a empresa nesta quinta-feira (27), ante R$ 1,8 bilhão em 2021, por aumento de custos logísticos e de produção.
Já receita operacional líquida da empresa no país aumentou 22% em 2022 para R$ 125,8 bilhões, com impulso do processamento de soja e do aumento da exportação de milho, explicou Sousa.
O executivo preferiu não comentar as razões de a China, maior importadora global, estar comprando menos do que o esperado em 2023, acrescentando ainda que o “cenário pós-pandemia deixou muitas dúvidas”.
“Por conta da China, apesar de uma safra recorde e de a logística estar funcionando bem, não estamos quebrando recordes de volume de exportação para o mês, porque não tem aquele furor de demanda para bater recorde”, acrescentou ele, destacando que isso é “positivo para o setor”, deixando a “logística mais eficiente também”.
“A expectativa nossa é trabalhar com o sistema (logístico) cheio o ano todo, tanto soja quanto milho.”
Com a menor demanda chinesa, os prêmios da soja brasileira nos portos caíram para mínimas históricas na última semana.
Investimento em alta
A Cargill continuará crescendo suas exportações de grãos e o fornecimento de soja e milho brasileiros no ritmo do avanço da agricultura nacional, disse o CEO, ao ser questionado sobre a expectativa para 2023.
No ano passado, a empresa ganhou fatia na exportação de milho brasileiro, com o cereal sendo um dos destaques da empresa em 2022.
“Mas no geral estamos mantendo nosso ‘share’ (participação), a agricultura brasileira cresce, nós mantemos o nosso ‘share’ deste crescimento. Para manter, já é um desafio e tanto, pois a dinâmica de crescimento do setor é brutal”, frisou.
Por isso a empresa tem mantido fortes investimentos no Brasil. A companhia investiu um recorde de R$ 1,2 bilhão no país em 2022, alta de 18% ante o ano anterior.
Os principais investimentos foram realizados na expansão da maior fábrica de processamento de soja da empresa no Brasil, em Uberlândia (MG), o que elevou sua capacidade para cerca de 4.500 toneladas/dia, ante 3.700 toneladas/dia.
“A capacidade instalada já está lá, operando nesta safra, em ramp-up”, disse o executivo, lembrando que o outro grande investimento foi a conclusão da fábrica de pectina (fibra solúvel obtida com a casca da laranja) em Bebedouro (SP).
Além disso, a empresa investiu na modernização de armazéns e portos.
Sousa comentou que a Cargill no Brasil exportou vários carregamentos de soja brasileira para a Argentina, para atender a demanda do país vizinho cuja safra foi severamente afetada por uma seca. E a tendência é de novas cargas ao longo do ano.
Ele disse ainda que a redução na oferta do vizinho traz mais demanda por farelo e óleo de soja do Brasil, uma vez que a Argentina tradicionalmente é a maior exportadora desses dois produtos.
União Europeia
Uma vez que esteja implantada, uma nova lei da União Europeia contra produtos ligados ao desmatamento efetuado após 2020 pode levar europeus a pagarem mais pelo farelo de soja brasileiro, disse o CEO da Cargill.
Ele lembrou que o detalhamento da lei da União Europeia ainda “não foi aberto”, mas que o Brasil teria “condição de suprir qualquer tipo de demanda sustentável”.
“O que não faz sentido é ter exigência que o Brasil supra um chamado especial a um custo mais baixo, que venda produto específico a preço de commodity, isso não vai acontecer”, afirmou ele.
Sousa explicou que o Brasil tem fluxos com mais riscos e outros com menos riscos. “Estes com menos riscos serão orientados para a Europa, agora, vai ser o produto mais barato? Eventualmente não vai ser.”
A União Europeia é a principal importadora de farelo de soja do Brasil, comprando também bons volumes de grão in natura.
“É muito mais fácil fazer um programa de farelo de soja para ser exportado para a França a partir de cooperativas do Paraná (uma região agrícola mais consolidada) do que pegar soja esmagada no oeste baiano. Mas teoricamente, pelo frete, o farelo do oeste baiano chegaria na Europa mais barato”, disse.