A indústria de soja dos Estados Unidos é um exemplo clássico de “safra de commodities”. Os grãos são cultivados para gerar produtos padronizados e amplamente utilizados – farelo de soja, concentrado de proteína de soja e óleo vegetal. A soja é uma parceira na rotação de culturas, muito comum com o milho em todo o Centro-Oeste do país. A área plantada aumentou muito desde o início de 1900 e agora está na faixa de 80 a 90 milhões de acres (32 a 36 milhões de hectares).
A soja tem a vantagem adicional de uma estreita associação com uma bactéria que pode fixar o nitrogênio do ar e, portanto, requer pouco ou nenhum fertilizante de nitrogênio, no caso dos EUA – um insumo que se tornou bastante caro por causa da invasão russa da Ucrânia.
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O foco para o melhoramento e manejo da soja tem sido em rendimentos mais altos por acre, e esses aumentaram cinco vezes no último século. A produtividade aumentou ainda mais rapidamente na “era da biotecnologia”, que começou com a introdução de linhagens geneticamente modificadas em 1996 e que foi ainda mais acelerada pela tecnologia “Marker Assisted Breeding” (Reprodução Assistida por Marcadores Moleculares).
A soja tolerante a herbicida, possibilitada por essa tecnologia, facilitou a adoção em massa de métodos de cultivo amigáveis ao clima, como o plantio direto e o plantio de duas ou mais espécies em faixas alternadas. A soja também se tornou um dos principais contribuintes para a energia renovável, uma vez que seu óleo é amplamente utilizado para biodiesel. Na verdade, o uso de combustível renovável é agora o principal impulsionador da indústria de soja dos EUA e a proteína desempenha um papel secundário em termos de valor geral.
Para a soja commodity, uma cultura muito bem-sucedida e importante, há oportunidades de mercado que podem aumentar sua contribuição para a economia agrícola por meio da diversificação. É nisso que aposta a empresa Benson Hill, do Missouri, EUA, que desenvolveu variedades especiais de soja destinadas a atender a usos finais específicos e, assim, obter um preço maior por hectare colhido, agregando valor ao grão. A empresa optou por fazer isso sem usar métodos de engenharia genética transgênica, ou seja, apostou na “soja convencional”.
Não porque compartilham os medos infundados sobre essa tecnologia, mas é uma estratégia que facilita a aceitação em certos mercados sensíveis à marca e para exportações para lugares como a UE, com suas várias barreiras de “precaução” à tecnologia. A Benson Hill é integrada verticalmente, na medida em que contrata agricultores para cultivar suas variedades específicas de soja e, em seguida, as leva para as fábricas de esmagamento da empresa, em Indiana e Iowa, onde geram os subprodutos de farelo, ricos em óleo e proteína, como flocos brancos, grãos, farinha de soja com alto teor de proteína e muito mais.
Em termos de metas de melhoramento de soja não-commodity, a Benson Hill desenvolveu linhas com alto teor de óleo de ácido oleico/baixo linoleico, que é uma opção para o abastecimento alimentar humano. Eles também desenvolveram linhas com alto teor de proteína (até 20% a mais do que o grão commodity padrão).
A soja normal deve passar por um processo bastante intensivo em energia e água para produzir o “concentrado de proteína de soja” (SPC), que é então usado em muitos alimentos e produtos alimentícios. As linhas de alta proteína da Benson Hill não exigem essa etapa e, portanto, os clientes que usam seu concentrado podem contar com uma redução significativa nas “Emissões de Escopo 3” (pegadas de carbono e água) de seus produtos finais.
A aquicultura é um mercado muito lógico para esses grãos de soja com alto teor de proteína. Esse setor importante e crescente do suprimento global de alimentos para humanos, precisa de uma fonte de proteína alternativa ao suprimento limitado e problemático de “farinha de peixe” pescado nos oceanos.
Parceria na agroindústria da soja
Em março, a Benson Hill anunciou uma parceria com a empresa dinamarquesa de aquicultura BioMar, que é um importante player nas indústrias globais de salmão e truta. A Benson Hill já fabrica rações para aquicultura, especialmente para a indústria de cultivo de trutas nos Estados Unidos, e há um mercado muito grande e crescente para essas rações como alternativa à farinha de peixe pescada no oceano. A Benson Hill já está vendendo no mercado de trutas dos Estados Unidos, mas a parceria com a BioMar pode representar uma grande oportunidade de mercado para os produtores de soja do país.
Essa relação permitiu que as duas empresas fizessem pesquisas conjuntas para otimizar ainda mais a digestibilidade das variedades para as espécies de peixes específicas que a BioMar cria – por exemplo, reduzindo certos oligossacarídeos. Faz sentido que sejam necessários alguns ajustes para transformar uma planta terrestre em um substituto dietético, para uma cadeia alimentar baseada em algas que alimenta os peixes predadores de ponta, como o salmão, que as pessoas adoram comer. Um nutriente essencial que a farinha de peixe fornece para espécies como o salmão são os óleos ômega-3 saudáveis, que são benéficos para os consumidores humanos, mas a BioMar já vem substituindo-os por opções à base de algas.
Essa soja especial é uma excelente opção para os negócios da BioMar e para seu foco em sustentabilidade. Sem o uso da farinha de peixe, suas metas se tornam mais robustas, com menos uso de energia e água na sua fabricação, além da boa digestibilidade da ração. Uma entidade baseada na UE, chamada ProTerra, certifica essas rações como “livres de desmatamento” e como “não transgênicas” (o que é obrigatório para o mercado europeu).
A vantagem para os produtores de soja dos EUA é a opção de permanecer como uma cultura familiar, mas com um contrato de venda antecipada, em vez de simplesmente ter de aceitar o preço variável no mercado de commodities. Tudo isso se encaixa bem com uma meta para a América rural, articulada pelo secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, durante sua apresentação plenária no recente USDA Outlook Forum.
Vilsack descreveu a agricultura e as economias rurais dos EUA como estando em um momento crucial, em que o paradigma precisa mudar da tendência de consolidação agrícola para um sistema que oferece mais oportunidades para pequenos, médios e novos agricultores. O processamento especializado do grão está elevando a cultura da soja a uma categoria proeminente em sua lista de soluções. As inovações da Benson Hills e os aplicativos da BioMar são exemplos de como isso pode funcionar.
* Steven Savage, colunista da Forbes EUA, é biólogo pela Universidade de Stanford e doutor pela Universidade da Califórnia, em Davis.(tradução: V.Ondei)