Certamente para os chineses é difícil entender o nosso país assim como é difícil para nós entender este gigante asiático que recebeu no mês de novembro, de braços abertos, a delegação de Mato Grosso. Apesar de compartilhar com o resto do mundo a atual preocupação com as mudanças climáticas, é possível sentir que a população chinesa esta mais preocupara com o risco de faltar comida e ainda por um bom tempo escolherá na gôndola um produto mais barato, que aquele com garantias de sustentabilidade.
Enquanto jornalistas brasileiros questionam por que o Brasil não assume o protagonismo global na produção de alimentos sustentáveis, os chineses já têm a clara percepção de que o Brasil, alimentando mais de 800 milhões de pessoas ao redor do mundo com baixas emissões e conservando biodiversidade, já é o protagonista! O Brasil é o único grande produtor de alimentos capaz de garantir segurança alimentar para essa potência asiática em sua jornada inexorável para tornar-se a maior economia do mundo.
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Querem conhecer nossos produtos, contato no WeChat, querem saber como comprar tudo: carne bovina, de porco, pé de galinha, soja, milho, pulses (lentilhas, feijões, grão de bico…) e até sorgo. Mesmo entendendo e valorizando nossas grandes vantagens competitivas, como destinar à conservação 64% do território de Mato Grosso, nossa produção tropical sustentável e baixo carbono e 94% da energia produzida no estado vir de fontes renováveis, acabam priorizando a segurança alimentar.
Estudo recente do insuspeito Goldman Sachs sobre quais serão os países mais prósperos nos próximos 50 anos mostra a ascensão da China, Índia e Indonésia. A China, mesmo desacelerando, irá ultrapassar os Estados Unidos em 2033; a Índia, em 2075. O Brasil estará em 2075 na oitava posição, precisando melhorar muito para não ser ultrapassado por Nigéria, Paquistão e Egito; como prevê a pesquisa. Quem sabe, ao implementarmos definitivamente o Código Florestal, recuperarmos nossos 89 milhões de hectares de áreas severa e moderadamente degradadas, segundo o LAPIG, e ao mesmo tempo consolidarmos uma sólida parceria comercial com a Ásia, África e Oriente Médio, possamos figurar em 2075 algumas posições à frente.
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Parceria essa ancorada em métricas e indicadores que valorizem nossa biodiversidade, nosso clima facilitador de produção baixo carbono, nossos modelos sustentáveis de produção e a rastreabilidade inclusiva (sem esquecer dos pequenos produtores) de nossa produção. Nesse futuro não tão distante previsto pelo estudo, haverá uma reconfiguração de poderes globais e não haverão países europeus a frente do Brasil.
Mesmo levando em conta o “efeito Bruxelas” – a capacidade da EU de influenciar a criação de normas e regulamentos que irão influenciar o comércio mundial – observa- se claramente que a China tem um projeto pragmático de parcerias. Dentre eles, o “Belt and Road (BRI)”, uma estratégia de desenvolvimento global de infraestrutura que possibilitará investimentos em cerca de 20 países da América Latina.
Na passagem de nossa delegação pela cidade de Haikou, na província tropical de Hainan, vimos uma ilha antes pobre e tropical (eu desconhecia essa China tropical) sendo transformada à custa de muito investimento em uma espécie de nova Hong Kong; em Shenzhen, cidade mais rica da China, um centro logístico que alimenta 200 milhões de pessoas, população similar a brasileira, tem um plano de aumento da importação de alimentos de todas as partes do mundo (em especial Brasil e Mato Grosso), para atender o Norte da China e exportar outra parte para os países do Sul Asiático.
Em Xangai, participamos da maior feira de importação e exportação do mundo, a CIEE (China International Import Export Expo), onde Mato Grosso teve seu próprio Stand, onde, além de divulgar informações do Estado, facilitar negociações e promover diversas assinaturas de Memorandos de Entendimentos, nosso IMAC, Instituto Mato-grossense da Carne, realizou uma concorrida degustação do novo corte “MT Steak”, eleito em reality show exibido na TV e disponível nos streaming disponíveis em nossas redes sociais e site.
Alguns pensam que deveríamos nos industrializar, outros investir em tecnologia e eu concordo, mas não podemos negar nossa vocação de potência agroecoalimentar! Essa necessidade de industrialização urbana não é antagônica a nossa vocação de alimentar boa parte do mundo, que não detém em seus territórios solos propícios para agricultura e pecuária. Devemos sim passar por um processo de industrialização nas regiões produtoras de alimentos como o Mato Grosso, para que a maior parte do beneficiamento seja feita aqui, gerando empregos e desenvolvimento no nosso pais e agregando o máximo de valor aos nossos produtos alimentícios. Isso tudo, em tempos de COP 28 realizada em Dubai, onde está clara a intenção de pressionar nossos Sistemas Alimentares para abafar qualquer ameaça a continuidade da produção de combustíveis fósseis.
*Caio Penido é pecuarista na região da Serra do Roncador, em Mato Grosso, e presidente do IMAC (Instituto Mato-grossense da Carne). Foi o mentor da Liga do Araguaia, movimento que nasceu em 2015 visando a adoção de práticas sustentáveis e que em 2021 se tornou o Instituto Agroambiental Araguaia.
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