Assumir responsabilidades, poupar os agricultores e colocar de vez o Brasil na liderança das discussões climáticas globais. Estes são alguns dos insights que não saem da pauta do holandês Paul Polman, 67 anos, uma das vozes presentes nos atuais embates sobre os caminhos da humanidade. Polman é sempre aguardado por onde passa, e não é de hoje. Além de CEO da Unilever por uma década, até 2018 – depois de passar pela Nestlé e Procter & Gamble –, ele robusteceu sua carreira em instituições como a Rockefeller Foundation, United Nations Global Compact, World Trade Organization e Universidade de Oxford, entre outros. O extenso currículo deu a ele autoridade no trânsito entre governos e corporações.
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Polman esteve no Brasil nesta semana, entre terça e quarta-feira (1 e 2), como o principal nome do Fórum Ambição 2030, realizado pelo Pacto Global da ONU (Organização das Nações Unidas) — Rede Brasil, em parceria com a AYA Earth Partners, iniciativa dedicada à economia de carbono. Na plateia do luxuoso hotel Rosewood, em São Paulo, passaram 1,2 mil pessoas. E Polman também conversou com a Forbes Brasil.
“É sempre melhor tomar a iniciativa do que ser forçado a mudar. Melhor garantir que adaptamos os sistemas agrícolas”, disse ele. “Porém, mantendo o protagonismo dos agricultores. E garantir que eles não precisam pagar pelas transições, mas também sejam recompensados por proteger o capital natural ”
A conta não é fácil de ser feita e nem pequena. No início de fevereiro, Simon Stiell, secretário-executivo da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, disse que o mundo necessita de US$ 2,4 trilhões em financiamento climático. A demanda do Brasil nessa conta, até 2030 e anualmente, é da ordem de US$ 130 bilhões a US$ 160 bilhões (R$ 655,2 bilhões a R$ 806,4 bilhões, na cotação atual), para adaptar sua economia à meta do Acordo de Paris, que visa limitar o aquecimento global a 1,5°C no período. Esse valor foi o que pediu aos financiadores globais o ministro da Economia, Fernando Haddad, na COP28 (Conferências das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas), no final do ano passado, em Dubai. Não por acaso, Polman foi convidado há cerca de um mês, pelo próprio ministro, para colaborar nos preparativos da COP30, que será realizada em 2025, em Belém (PA).
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No encontro em São Paulo, Polman falou sobre transição climática em uma master class exclusiva para um grupo de empresários e depois, na plateia, falou sobre o Pacto Global da ONU. Mas foi na conversa com a Forbes que ele pontuou o que o agro deve focar, ao referenciar seu papel na economia brasileira e suas cadeias logísticas rumo a à transição para o net zero (zerar as emissões de carbono).
“O negócio agrícola é parte importante da economia brasileira e, ainda mais, para as exportações do Brasil”, diz ele. “É, de fato, o negócio ideal para se pensar um modelo que seja positivo para a natureza, ao clima e também às pessoas.” Para ele, os sistemas agroalimentares, mas a agroindústria e o varejo, devem arcar com cerca de 30% dos investimentos para alcançar as metas climáticas e cabe a esse sistema aliviar a conta para o produtor rural tirando esse ônus de suas costas.
Mas quem de fato vai pagar a conta? “O mercado de carbono é um sistema nascente. Há muita discussão no mundo sobre como fazer esses mercados funcionarem. E o Brasil precisa ser parte disso, porque a integridade desses sistemas é muito importante”, disse Polman. “As empresas estão focadas em diferentes diretrizes e começando a buscar alternativas em função dos padrões de mudança climática. Essas mudanças estão passando pela desintermediação nas cadeias produtivas, para ficarem mais simples e transparentes. Por isso existe uma enorme pressão sobre os agricultores.”
Polman coloca ainda mais um elemento nesta trajetória. Ele salienta que as regras climáticas tendem a deixar os produtos finais tirados do campo mais caros na ponta do consumo. O problema é que, embora 25% das emissões globais já estejam contabilizadas no mercado de carbono, a maioria dos agricultores ainda não vê benefícios nesse mercado. Polman frisa, portanto, a importância do Brasil se integrar às novas diretrizes, como os mecanismos REDD+ (Redução de Emissões provenientes de Desmatamento e Degradação Florestal), em termos produtivos, monetários e fiscais. Isso para evitar, no país, que o peso das mudanças recaia somente sobre os ombros dos agricultores, o que inclusive justifica, em parte, os atuais protestos de produtores rurais que vêm acontecendo ao redor do mundo, sobretudo na Europa, em países como França, Bélgica, Alemanha e Espanha.
Em seu livro “Impacto positivo: Como empresas corajosas prosperam dando mais do que tiram”, de 2022, ele fala sobre inovação nas empresas e como elas desenvolvem relações de confiança ao engajar clientes, ao mesmo tempo que ajudam a criar sociedades mais resilientes e saudáveis. “Paul Polman defende que é lucrativo fazer negócios com o objetivo de tornar o mundo um lugar melhor” escreveu o jornal The New York Times sobre a obra. No caso do Brasil, ele afirma que as oportunidades para a economia brasileira são enormes. E dá como exemplo os biocombustíveis. “O Brasil já tem uma indústria agrícola incrível, baseada em biocombustível (o etanol). Poderia ser líder mundial também em combustível de avião sustentável. E dirigir a convergência em outros países, ditando as regras para agricultura.”
O SAF (biodiesel da aviação, na sigla em inglês) é a aposta do setor para reduzir sua pegada de carbono, e pode ser obtido a partir de culturas, como soja, milho, cana, eucalipto, dendê e óleo de macaúba. A aviação responde por 2% das emissões globais de poluentes. O setor agropecuário, por sua vez, responde por 11% das emissões globais de GEE (gases de efeito estufa, na sigla em inglês). “Nossos sistemas alimentares se tornaram o maior emissor de carbono, ainda mais do que o setor de combustíveis fósseis. Mas, são os sistemas alimentares também que apresentam as maiores soluções”, afirma Polman.
O grande desafio atual, segundo o executivo, é dar celeridade às soluções globais contra as mudanças climáticas. Para ele, o mundo inteiro está atrasado nessa corrida e não apenas o Brasil, embora 159 países tenham se comprometido a transformar seus sistemas alimentares como parte de suas contribuições na última COP, entre muitos outros compromissos que vêm sendo assumidos a cada conferência. “Eu não acho que o Brasil é melhor ou pior do que muitos outros. Mas tem que ser parte integral da estratégia, mais rapidamente.”