Encontrar o “croc” perfeito da crocância de um petisco, o conceito de gostoso, a maciez do prazer, o sabor de uma casquinha e a percepção tátil da textura ao toque é fundamental e nada desprezível para a indústria do alimento. Dá para imaginar gamers com dedos sujos de óleo, farinha, ou outros “farelos”? Segundo a PGB 2024, 73,9% da população brasileira afirma jogar algum tipo de jogo digital. No mundo todo, dados da DFP Gamers apontam 3,7 bilhões de jogadores. A resposta à pergunta acima é não. Ou seja, colocar alimentos na mesa vai além de proteínas e vitaminas em sua composição.
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“Com o Mc Donald’s do Brasil temos duas vezes por ano o Innovation Day. A gente propõe a eles o portfólio de inovação para o cardápio dos anos seguintes e trabalhamos juntos”, diz Marcel Sacco, vice-presidente de marketing e novos negócios da BRF, uma das maiores agroindústrias do país, dona de marcas icônicas como Sadia e Perdigão, e que elabora 5 milhões de toneladas de alimentos anualmente a partir da produção de 10 mil produtores rurais integrados, a maioria de frangos e suínos, além de perus.
“Eles (Mc Donald’s) desenvolvem algumas ideias, chamam os times da rede para discutir e olhamos para a frente”, afirma Sacco. No Brasil, a Arcos Dourados, que responde pelo Mc Donald’s no país, em 2023 faturou US$ 4,3 bilhões (R$ 22,6 bilhões na cotação atual), valor 18,9% acima do ano anterior, e 17% da receita global da marca (US$ 25 bilhões).
Pelo terceiro ano consecutivo, a BRF também patrocina eventos como o Lollapalooza, festival de música que reuniu neste ano 240 mil pessoas e que tem repercussão nacional; e a National Basketball Association (NBA Brasil), temporada de jogos de basquete vistos por plataformas de streaming. Somente as 31 lojas NBA Brasil receberam a visita de 2,2 milhões de fãs na temporada 2023/24, segundo a MKTEsportivo, 28% acima da temporada anterior.
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Por isso, olhar para clientes dessa natureza – e claro, para o mercado varejista de alimentos que no ano passado foi de R$ 1,2 trilhão no Brasil – é tarefa de uma equipe reforçada de inovação, lotada em um edifício amplo nos arredores de Jundiaí, município a cerca de 60 km da capital paulista.
O BRF Innovation Center (BIC), uma estrutura de 14 mil metros quadrados, com 250 pessoas dedicadas e divididas em nove plataformas, completou 10 anos e já consumiu R$ 58 milhões em busca de respostas para a cadeia verticalizada de aves e suínos que sustenta uma empresa com receita líquida de R$ 14,43 bilhões em 2023. Em tempo, traduzir a ciência do “croc” é tarefa da equipe de consumer science.
Colocar o BIC no centro das políticas da BRF tem um sentido preciso: saber o que quer as novas gerações de consumidores, os chamados Millennials, Z e Alfa, os nascidos lá pelos anos 1990 e também os que ainda nascerão. Sem trocadilhos, a BRF quer saber onde estão, o que comem e o que essas gerações vão oferecer de comer às próximas. Porque os empanados é uma pequena fração de um portfólio onde também estão carnes e marinados, pratos prontos, margarinas, sobremesas, e produtos fracionados e fatiados, como presuntos e copa, entre outros.
A ciência por trás desse movimento de tradução de aromas e de sabores em algo palpável também faz parte da estrutura de nomes da agroindústria, como Cargill, Mondelez, Nestlé, JBS, entre outros. No caso da BRF, traduzir a subjetividade das sensações da experimentação e transformá-las em um produto, está entre as principais tarefas do BIC.
Corrida da BRF por saudabilidade
Fábio Bagnara, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da empresa, diz que há um esforço contínuo em busca da saudabilidade que, literalmente, significa “qualidade do que é saudável”. Por exemplo, o uso de ingredientes naturais para temperar a carne dos nuggets, um alimento adorado por jovens.
Como a cebola, ervas e o açafrão, ou as várias farinhas, como a de trigo e de mandioca. “A gente tem trabalhado muito na evolução dos processos adotados na indústria, mas sempre pelo lado da segurança do alimento”, diz Bagnara, se referindo à extensão do Brasil e quanto de logística é necessária para abastecer gôndolas e food service. Questionado se a indústria vai se engajar cada vez mais em uma busca por alimento o mais natural possível, o executivo diz sim.
“Há uma evolução nisso e a gente vai por esse caminho”, diz Bagnara. “Por exemplo, a indústria tem trabalhado produtos fermentados na linha do vinagre, que é uma fermentação acética para substituir outros tipos de conservantes hoje usados. O vinagre pode substituir, por exemplo, o propionato, que é um ingrediente também fermentado, também da biotecnologia, mas é diferente para o consumidor”, afirma Bagnara. Ele se refere ao fato de que quando um consumidor lê a palavra vinagre ele sabe exatamente o que é.
Para dar conta das demandas, o BIC tem algumas rotas traçadas. Além da própria equipe de técnicos e pesquisadores, há uma forte relação com startups, por meio da plataforma Open Innovation. Marcel Sacco afirma que todos os anos a empresa passa pelo processo de selecionar quais são os grandes desafios estratégicos da BRF naquele momento. “Nossa relação, hoje, passa de 600 startups. É um trabalho que começou há quatro anos e que vem crescendo”, diz ele. “E também com a criação de um hub definimos dentro de casa quais são as prioridades estratégicas.”
Ele dá como exemplo a Agrotools, de São José dos Campos (SP), uma plataforma de inteligência de mercado que passou pelos pit days da BRF. A empresa nasceu há quase duas décadas. Lá atrás, a AgroTools desenvolveu uma ferramenta junto com a BRF que permite rastrear todas as propriedades onde a BRF compra os grãos. Por ela, há a garantia de que todos os produtores de grãos – milho e soja, principalmente – da ração de aves e suínos vem de propriedades que não desmatam e que abominam práticas não sustentáveis.
“Hoje, por ela, temos um mapeamento do país todo”, diz Sacco. “A Agrotools, hoje, já trabalha com vários outros clientes, inclusive com concorrentes nossos. Eles cresceram e começaram esse projeto junto com a gente. Isso é um exemplo do que a gente faz.” A Agrotools, segundo ela, monitora atualmente 200 milhões de hectares e a gestão de 15 bilhões em operações de compra de matéria-prima.
Há cerca de dois meses, a BRF também passou a integrar o Cubo Itaú, que faz a curadoria de startups em fase de tração e com alto potencial de escalabilidade, onde estão cerca de 500 delas em 25 diferentes segmentos. “São parcerias que a gente chama de antenas e que sempre nos perguntamos: ‘como é que a gente também recolhe ideias desses caras’?”